Protestos pró-palestinos nos EUA: um novo Vietnã, um novo macartismo?

A impossibilidade de acessar o campus também impede o acesso a consultas médicas para a retirada de receitas, o que faz com que os alunos que precisam de medicamentos não tenham acesso a eles.

Professor pró-palestino em um comício no campus da Universidade da Califórnia em Los Angeles, em 1º de maio de 2024.
Eric Thayer / Getty Images via AFP

Por Carmen Parejo Rendón.

Confrontar a narrativa com os fatos é uma tarefa fundamental que, além disso, com o desenvolvimento de uma propaganda global bem articulada, tornou-se mais aguda nos últimos anos.

Desde o início da ofensiva israelense em Gaza, a disputa pela narrativa, especialmente para justificar o apoio das potências ocidentais a Israel, tem sido uma constante: como podemos fazer com que pareça preto/branco quando estamos todos assistindo a um genocídio televisionado?

Nos EUA, os protestos em apoio ao povo palestino vêm ocorrendo desde o primeiro minuto. No entanto, a situação se agravou nos últimos dias com o início dos protestos nas universidades e a formação de acampamentos nos campi de todo o país em solidariedade a Gaza.

Leia mais – ONU: Pelo menos 10.000 palestinos estão enterrados sob os escombros em Gaza.

A resposta das autoridades tem sido a repressão direta, que envolveu, entre outras coisas, a prisão de quase 1.000 professores e alunos, mas também a acusação pública e a limpeza profissional.

Esse cenário abre um novo foco de debate que reúne as lutas pela solidariedade com o povo palestino e a rejeição da política externa dos EUA no conflito do Oriente Médio, com a defesa dos direitos civis no país.

Desde 7 de outubro, a perseguição aos diretores de prestigiadas universidades norte-americanas se intensificou sob a justificativa de não estarem fazendo o suficiente para “combater o antissemitismo”. Essas pressões levaram à renúncia da reitora da Universidade da Pensilvânia, Elizabeth Magill, em dezembro de 2023, e de sua colega de Harvard, Claudine Gay, em janeiro deste ano.

Poucos dias após o início da agressão israelense a Gaza, o grupo de pressão conservador Accuracy in Media conduziu por Harvard um caminhão no qual havia sido instalado um quadro digital, exibindo as fotos e os nomes dos signatários de uma carta de solidariedade a Gaza, enquanto, ao mesmo tempo, Maxwell Meyer, formado em Stanford, apresentava em seu site uma lista com os nomes e detalhes pessoais desses signatários, para que, em suas próprias palavras, “eles não fossem contratados sem serem notados”.

Protesto pró-palestino na Universidade da Califórnia em Los Angeles, em 1º de maio de 2024. Etienne Laurent / AFP

Em 26 de abril, na Curbed da New York Magazine, a jornalista Adriane Quinlan relatou que pelo menos 53 dos estudantes que haviam sido detidos, após serem libertados, foram informados de que a universidade havia decidido suspendê-los e despejá-los imediatamente do alojamento no campus da Universidade de Columbia. “Como a moradia é um dos recursos mais limitados e cobiçados da cidade de Nova York, ela é um motivador incrivelmente poderoso para fazer com que os alunos se submetam à sua vontade”, diz o artigo, citando um desses alunos. Além disso, a impossibilidade de acessar o campus também impede o acesso a consultas médicas para a retirada de receitas, o que faz com que os alunos que precisam de medicamentos não tenham acesso a eles.

Esse relato é uma negação das muitas expressões de rejeição ao genocídio em Gaza por parte dos membros da comunidade judaica estadunidense.

Entretanto, entre as dezenas de vídeos que os próprios alunos distribuíram nas redes sociais, vemos como, em várias ocasiões, eles tentam explicar o óbvio: antissemitismo e antissionismo não são a mesma coisa. A rejeição das políticas implementadas por um Estado não pode ser entendida como uma forma de racismo, assim como a rejeição de uma ideologia política, o sionismo, não implica a rejeição do povo judeu.

Além disso, essa narrativa é uma negação das muitas expressões de rejeição do genocídio em Gaza por membros da comunidade judaica estadunidense. No último dia 9 de novembro, sob os slogans “Let Gaza Live” (Deixe Gaza viver) e Not In Our Name” (Não em nosso nome), uma das imagens mais emblemáticas dos protestos dos EUA contra o genocídio em Gaza foi a manifestação na base da Estátua da Liberdade pela organização Jewish Voice for Peace (Voz judaica pela paz). Seria uma forma de antissemitismo silenciar as vozes desses judeus estadunidenses, apenas porque eles são, de fato, judeus?

Genocídio

É muito importante não se deixar enganar. O que está sendo condenado nos EUA e em todo o mundo é o genocídio, e não faz diferença se você é judeu, muçulmano, cristão, ateu, estadunidense, palestino ou sul-africano para ver isso.

No amplo movimento contra o genocídio em Gaza, podemos ver a lembrança dos protestos dos EUA contra a Guerra do Vietnã.

A repressão vai além das imagens horríveis de prisões ou violência policial; ela também transcende os campi universitários. Por um lado, vemos como as listas proibidas estão voltando a Hollywood, como na era dourada do macartismo, com casos como os das atrizes Melissa Barrera e Susan Sarandon. Por outro lado, nesta semana, soubemos da prisão da candidata à presidência pelo Partido Verde, Jill Stein, por participar de uma manifestação em apoio a Gaza.

O Dia do Trabalhador/a foi comemorado em todo o mundo em 1º de maio, exceto nos EUA, embora a origem desse dia de reivindicação esteja justamente na cidade de Chicago e na repressão à greve por oito horas de trabalho que levou à condenação à morte dos chamados “Mártires de Chicago”. Anos de repressão fizeram com que o povo estadunidense apagasse sua própria história, o que levou ao fato de que hoje esse país não possui os direitos trabalhistas exigidos por lei.

No amplo movimento contra o genocídio em Gaza, podemos ver a lembrança dos protestos nos EUA contra a Guerra do Vietnã; infelizmente, também vemos hoje em dia a referência histórica da perseguição política nos EUA que, trocando “comunista” por “antissemita” em sua narrativa de propaganda, mais uma vez prejudica os direitos fundamentais da população estadunidense.

A opinião do/a/s autor/a/s não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.

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