Proposta de emenda à Constituição Federal coloca o Brasil em perigo

Por Fábio Roland e Rafael M. Almeida

A revista científica Science publicou na edição semanal de 15 de julho uma carta (*) alertando para os efeitos da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 65/2012. A PEC, em tramitação no Senado federal, coloca em risco a biodiversidade brasileira. A Amazônia brasileira, por exemplo, estará em perigo. O texto da PEC 65/2012 acaba com a necessidade do licenciamento ambiental de projetos de infraestrutura no Brasil. Isso significa que qualquer empreendimento poderá ser construído sem qualquer tipo de mitigação ou compensação e, a licença, uma vez concedida, não poderá ser suspensa ou cancelada. Na prática, os órgãos responsáveis pelos licenciamentos pouco ou nada poderão fazer para que tragédias ambientais e sociais não se multipliquem, ainda mais, Brasil afora. Com a aprovação da PEC 65/2012, tragédias socioambientais como a ocorrida na região de Mariana (MG) serão fatos recorrentes.

Mais de 300 hidrelétricas já foram inventariadas ou estão planejadas na Amazônia, sendo metade na Amazônia brasileira. Além disso, uma área duas vezes maior do que Minas Gerais já foi registrada como de potencial interesse para atividades de mineração na Amazônia brasileira. No entanto, há várias restrições ambientais para a construção desses projetos, pois muitos deles estão dentro de unidades de conservação e territórios indígenas. A aprovação da PEC abrirá o caminho para ignorar esses fatos.

De acordo com o mais recente Plano Decenal de Expansão de Energia, 12 usinas hidrelétricas de grande porte devem ser construídas na Amazônia nos próximos 10 anos, representando mais de 90% da expansão da capacidade instalada de hidrelétricas prevista para o período. Aprovar a PEC 65/2012 significa construir todas essas hidrelétricas – algumas delas tão ou mais polêmicas do que Belo Monte, por exemplo – sem qualquer cuidado com os impactos ambientais decorrentes dessas obras de engenharia. Os projetos de infraestrutura associados, como rodovias e linhas de transmissão, também serão construídos desconsiderando todas as consequências ecológicas que regem o funcionamento da maior floresta tropical do planeta. Há de destacar: os efeitos locais contribuem para alterações regionais e globais; ou seja, uma mudança ambiental sem critério pode gerar mudanças globais, por exemplo, em padrões climáticos, de alta relevância.

A PEC 65/2012 foi proposta em 2012 pelo senador Acir Gurgacz (PDT-RO). Em abril desse ano, a PEC foi aprovada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. Em maio, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) entrou com um requerimento no Senado solicitando que a PEC voltasse à CCJ, com o objetivo de promover o aprofundamento devido no debate técnico e legal. Seu requerimento foi aceito e ele se tornou o relator da PEC. Em seu relatório, o senador Randolfe Rodrigues classificou a PEC como inconstitucional, além de considerá-la o mais grave retrocesso ambiental das últimas décadas. Caso seu parecer seja aprovado na CCJ, e se não houver recursos contrários de senadores, a PEC será arquivada.

No e-Cidadania – portal eletrônico onde qualquer cidadão pode opinar sobre as proposições em trâmite no Senado, de um total de 30.153 pessoas que se manifestaram em relação à PEC 65/2012, 29.848 são contrárias a sua aprovação. Apenas 305 pessoas opinaram a favor de sua aprovação. Ainda que incipiente, esses números sugerem que a população brasileira se opõe à aprovação da proposta em tela. O conteúdo preceituado na PEC atende interesses individuais em detrimento dos bens da nação. Em entrevista à BBC Brasil, o autor da proposta reconheceu que a aprovação da PEC 65/2012 beneficiará os negócios de sua família (http://www.bbc.com/portuguese/brasil/2016/05/160509_gurgacz_emenda_rs). Os impactos da PEC sobre o rico, diverso e complexo mosaico ambiental brasileiro precisa ser disseminado por todo o tecido social brasileiro. A PEC 65/2012 precisa ser arquivada definitivamente. Só este fato permitirá o Brasil honrar as suas posições em acordos e instrumentos ambientais internacionais. As discussões no Senado, quando da votação do parecer do senador Randolfe Rodrigues, devem estar absolutamente envoltas por manifestações técnico-científicas das mais diferentes origens.

(*) a carta foi assinada também pelo eminente biólogo norte-americano Thomas Lovejoy, que estuda a Amazônia desde os anos 60, quem consagrou o termo “biodiversidade”. O texto original, em inglês, pode ser acessado no link: http://science.sciencemag.org/content/353/6296/228.2

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Fonte: SRZD

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