Projeto que retrocede com aborto legal avança no Congresso

Com o Estatuto do Nascituro, o aborto em caso de estupro, possibilidade existente desde 1940, passa a ser ilegal. Na foto, ato de mulheres pelo direito ao aborto em São Paulo (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)
Com o Estatuto do Nascituro, o aborto em caso de estupro, possibilidade existente desde 1940, passa a ser ilegal. Na foto, ato de mulheres pelo direito ao aborto em São Paulo (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

Por Tory Oliveira.

Em tramitação desde 2007, PL 478 recebeu parecer favorável do relator, Marcos Rogério (DEM-RO), e pode ir à plenário

Em meio à crise política, a Câmara dos Deputados deu mais um passo na tramitação do Estatuto do Nascituro (PL 478/2007), projeto que privilegia os direitos do feto desde o momento da concepção e que transforma o aborto em crime hediondo.

Em tramitação desde 2007, o Estatuto do Nascituro é um dos pontos de maior inflexão entre os movimentos de mulheres e a bancada religiosa da Câmara. Com 31 artigos, estabelece penas de um a três anos de detenção para quem “causar culposamente a morte de nascituro” e de um a dois anos para quem “induzir mulher grávida a praticar aborto ou oferecer-lhe ocasião para que a pratique”.

Na prática, o processo apresenta um retrocesso com relação ao ordenamento jurídico vigente hoje. Atualmente, uma mulher que sofra violência sexual e engravide pode, legalmente, solicitar a interrupção da gestação. Com a proposta do Estatuto do Nascituro, o aborto em caso de estupro, possibilidade existente desde 1940, passa a ser ilegal.

Para Gabriela Rondon, advogada e pesquisadora do Instituto Anis, trata-se de uma proposta com consequências dramáticas para os direitos da mulher. “É uma proposta cruel para os direitos das mulheres, uma vez que propõe um retrocesso importante com relação às exceções que temos no Código Penal com relação ao aborto”, afirma.

Na quarta-feira(7), o deputado Marcos Rogério (DEM-RO) apresentou seu relatório favorável ao projeto de lei na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados. No texto, ele destaca que o Congresso Nacional é o “local apropriado” para o debate sobre os direitos do nascituro e o aborto e critica a atuação do Judiciário sobre o tema.

Trata-se de uma disputa antiga entre os parlamentares e os juristas, sempre requentada quando há discussões sobre temas sensíveis, mas também é uma alfinetada no Supremo Tribunal Federal (STF), que tem dado manifestações favoráveis à ampliação do direito ao aborto no Brasil.

“Ao ler o projeto de lei, você não vê a presença da mulher, a não ser nos momentos de restrição de direitos. No PL, fica muito claro que uma mulher que tenha sofrido um estupro, uma violência sexual, pode enfrentar uma segunda violência por parte do Estado, que é a ameaça de ser presa caso não tenha condições de seguir com a gestação. Essa é a cena mais grave que podemos imaginar”, explica Rondon.

Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher

Aprovado o relatório pela CCJ, o Estatuto do Nascituro pode ir ao plenário da Câmara. Na quinta-feira (8), porém, o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) apresentou um requerimento de distribuição da matéria para a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher.

A justificativa é que tal comissão não existia permanentemente na época em que a proposição foi despachada para ser analisada pela Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF) e pela CCJ. Além disso, ressalta o requerimento, o cerne do projeto de lei guarda “estreita e inquestionável pertinência temática” com os direitos da mulher.

“Em todo o País, movimentos de mulheres acompanham com preocupação a tramitação do chamado ‘Estatuto do Nascituro’, uma vez que esse projeto de lei, se incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro, produzirá impactos significativos na saúde reprodutiva das mulheres e meninas gestantes, vítimas de violência sexual, bem como no planejamento familiar”, afirma o deputado no requerimento.

“Nada mais razoável por parte da Câmara dos Deputados que ouvir a Comissão da Mulher, antes mesmo da CCJC, sobretudo se considerarmos que este que seria o último colegiado a analisar o projeto de lei é composto de apenas 4,5% de mulheres”, argumenta Braga.

Fonte: Carta Capital.

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