Primeiros resultados do Censo Demográfico de 2022: alguns registros

A região Sudeste permanece como a mais populosa do país, totalizando 84,8 milhões de habitantes (41,8% da população), seguida pela Região Nordeste (26,9%), Sul (14,7%), Norte (8,5%) e Centro- Oeste (8,0%).

 

Imagem: Tânia Rêgo – Agência Brasil.

Por José Álvaro Cardoso.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE divulgou, recentemente, os primeiros resultados relativos à população e domicílios do Censo Demográfico de 2022, o 13º na história. A realização do Censo Demográfico é essencial para o país, como fonte primária de dados sociodemográficos e econômicos, tendo vasta aplicação na administração pública e no planejamento social e econômico como um todo. Segundo a legislação brasileira (Lei n. 8.184, de 10.05.1991) os censos demográficos devem ser realizados a cada 10 anos no país. Porém, em função da pandemia de COVID-19 a operação censitária, que deveria ter sido realizado em 2020, foi adiada para 2022. Em 2021 não foi possível a realização da operação, em decorrência do drástico corte orçamentário realizado pelo governo Bolsonaro que, obviamente, não cultivava muito apreço por investimentos em pesquisas. Na operação censitária foram visitados 106,8 milhões de endereços e 90,7 milhões de domicílios, distribuídos em todo o Território Nacional. Os primeiros resultados que foram divulgados, já disponibilizam informações muito relevantes sobre os totais populacionais e de domicílios no país, e indicadores estratégicos derivados dessas informações, além da densidade demográfica e a taxa de crescimento anual da população.As informações do Censo Demográfico são fundamentais para políticas públicas, estratégias empresariais e políticas institucionais. Por exemplo, um plano nacional de retomada do crescimento, ou um plano nacional de educação, que o país eventualmente possa adotar, dispõem no censo, de informações fundamentais, inclusive ao nível municipal. O censo fornece informações como a do acesso de crianças e adolescentes às escolas, distribuição da população pelo território; consequentemente, oferta de força de trabalho na região ou município, e assim por diante. Esse tipo de informação possibilita todo um planejamento econômico, sobre instalações de empresas, mercado consumidor em cada região etc.

Em função da característica continental e da heterogeneidade do território brasileiro, e do fato de que a base político-administrativa muda constantemente – surgem ou desaparecem municípios, povoados, agrupamentos indígenas e de muitos outros elementos espaciais – um recenseamento dessa envergadura requer ampla e contínua atualização dos limites territoriais dos estados e municípios do país. Os primeiros resultados trazem os totais de população dos 5.568 municípios brasileiros criados e instalados até 1º de agosto de 2022, do Distrito Federal e do Distrito Estadual de Fernando de Noronha.

O Censo de 2022 apurou a existência de 90,7 milhões de unidades domiciliares (domicílios particulares e coletivos) no país, representando um crescimento de 34% em relação ao registrado no Censo anterior, em 2010, quando foram recenseadas 67,5 milhões de unidades domiciliares. Pelos dados do Censo de 2022, a população chegou a 203 062 512 habitantes na data de referência, dia 31 de julho de 2022. É importante registrar que a população residente no Brasil tem aumentado sucessivamente, apresentando um crescimento superior a 20 vezes nos últimos 150 anos, desde o primeiro censo realizado em 1872.

Até a década de 1940, vigorava simultaneamente um elevado nível de fecundidade e de mortalidade no país. Porém, com a queda da taxa de mortalidade, a partir de meados dos anos 1940, e, por outro lado, a permanência dos elevados níveis de fecundidade do período, aumentou o ritmo de expansão da população, chegando na década de 1960, quando atingiu o seu pico, a uma taxa média de crescimento populacional de 2,99%. A partir dos anos de 1960 começam a cair os níveis de fecundidade e, na década seguinte, os dados do Censo Demográfico já apontam a redução do crescimento populacional, ou seja, a desaceleração do crescimento da população em termos percentuais. Em 12 anos, na comparação com 2010, a população recenseada brasileira aumentou em 12,3 milhões de almas. A região Sudeste permanece como a mais populosa do país, totalizando 84,8 milhões de habitantes (41,8% da população), seguida pela Região Nordeste (26,9%), Sul (14,7%), Norte (8,5%) e Centro- Oeste (8,0%).

A razão fundamental da queda das taxas de crescimento demográfico no país foi a redução da taxa de fecundidade (definida como a média de número de filhos por mulher em idade de procriar, entre 15 a 49 anos), que vem caindo desde 1960, quando era de 6,3 filhos por mulher. A partir da década de 1960, começa a ocorrer uma desaceleração demográfica contínua, ou seja a diminuição das taxas de natalidade passou a ser superior a das taxas de mortalidade, registrando já em 2000 um crescimento demográfico de 1,6% ao ano e com continuidade no processo de queda. Na Tabela 2, abaixo, temos a população residente e a taxa média de crescimento populacional por região do país.

O país conta com um total de 5.568 municípios, além do Distrito Estadual de Fernando de Noronha e o Distrito Federal. Porém, com o objetivo de simplificação, a análise do censo foi realizada para os 5.570 entes federativos municipais. Chama a atenção, nos dados, o fato de que a redução da população é mais destacada entre os maiores muncípios do país. Entre os 319 maiores, que possuem mais de 100 mil habitantes, 39 municípios apresentaram redução populacional na comparação com o Censo de 2010. Em 2010, na comparação com o Censo anterior, realizado em 2000, somente 4 municípios do grupo dos maiores de 100 mil habitantes, apresentaram diminuição. Esse grupo de 39 municípios com
redução da populaçâo inclui algumas capitais de estado, fato inédito nos censos demográficos.

No conjunto dos 20 municípios de mais de 100 mil habitantes que tiveram maior crescimento populacional no período, Boa Vista (RR) é a única capital de estado e único município que supera os 300 mil habitantes nesse grupo, crescimento que foi influenciado pela presença de imigrantes venezuelanos. Entre os municípios com maior crescimento populacional no país, destaque para o grande número de municípios existentes no entorno das capitais. Os dados do Censo 2022, corroboraram a constatação de que a dinâmica econômica dos aglomerados urbanos extrapola os limites administrativos formais dos municípios. O exemplo, talvez, mais acabado seja o da Região Metropolitana de São Paulo, que é constituída de 39 municípios, e que mantêm entre si relações econômicas que extrapolam as separações administrativas formais de cada um dos municípios. A circulação de capital e de força de trabalho na região obedece à lógica de funcionamento da economia, em todas as suas complexas interações. O fato reforça a a hipótese de que a dinâmica da população deve ser compreendida no contexto do aglomerado urbano, e não necessariamente no município, visto de forma isolada.

De acordo com os últimos três censos (2000, 2010 e 2022), o Brasil vive em um período de desaceleração do crescimento populacional, mas j apresenta algumas características da fase de estabilização demográfica, com a redução do número de nascimentos e o envelhecimento da população, decorrente do aumento da expectativa de vida. Segundo os demógrafos, o Brasil vive ainda na fase de bônus demográfico, cujo ápice teria sido atingido em 2020, e entre 2030 e 2040, a população deverá começar a reduzir em termos absolutos.

A queda da taxa de crescimento populacional não é novidade no Brasil e segue uma lógica de transição semelhante à verificada nos países imperialistas. O fenômeno vem ocorrendo desde a década de 1960, após ter atingido o ápice de seu crescimento nessa década. Porém, o que surpreendeu os especialistas foi a velocidade da queda: o crescimento no último Censo foi menor do que a metade daquele verificado no Censo Demográfico de 2010, de 1,17%. Dentre as explicações para o fato de que o total da população divulgada pelo Censo, ter destoado das estimativas do próprio Instituto, a principal é a ausência de atualização de dados antes da coleta feita para o Censo 2022/2023. Em dezembro de 2022, o IBGE estimou que o Brasil tinha 207,8 milhões de habitantes e, em 2021, a estimativa foi de 213,3 milhões. O Censo de 2022/2023, como assinalado, mostrou que a população brasileira atual é de 203 milhões, 62 mil e 512 pessoas, tendo data de referência, 31 de julho de 2022.

É importante considerar que o que aconteceu no censo de 2022 foi uma queda da taxa de crescimento demográfico, não uma redução no número absoluto de habitantes. Na realidade, entre 2010 e 2022, segundo os dados do Censo, houve um aumento populacional em 12 milhões, 306 mil e 713 pessoas, um crescimento de 6,5%, em relação à população apurada em 2010, de 190 milhões, 755 mil e 799. Ou seja, mesmo com a desaceleração do crescimento, o país aumentou sua população em número equivalente a 24% da população da Colômbia, segunda nação mais populosa da América do Sul.

A contagem da população, que deveria ter sido realizada em 2015, no meio da década, não ocorreu porque o governo não liberou os recursos para a operação. Além disso, a Covid-19 atrasou em dois anos a realização do censo, que deve ser realizado a cada década. No caso da última edição do censo, portanto, além da ausência da contagem populacional intermediária, no meio da década, a pesquisa foi atrasada em dois anos. Esses fatores levaram a uma grande desatualização do cadastro do IBGE, o que explicaria, essencialmente, a diferença entre estimativas e resultados.

A base de um determinado levantamento censitário são os dados do censo realizado anteriormente. É a partir destes dados que se afere crescimento populacional e seus fatores, como migração, fecundação, mortalidade, distribuição etária etc. Mas a metodologia utilizada pelo IBGE, como explicado, pressupõe a contagem no meio da década, entre um censo e outro, o que não ocorreu. A atualização é necessária porque, em uma década podem acontecer muitas coisas em um país, especialmente quando se trata de um que possui dimensões continentais e que figura entre os seis mais populosos do mundo.

O período entre 2010 e 2022 no Brasil foi também extremamente dinâmico do ponto de vista econômico, social e político. Por exemplo, houve um golpe de Estado no período, que, dentre outras consequências, causou uma brutal recessão em 2015 e 2016, provocando um
empobrecimento significativo de boa parte da população. É bastante aceitável supor que tais acontecimentos influenciaram o crescimento demográfico do país. Por exemplo, nas famílias de trabalhadores, possivelmente a principal variável do planejamento familiar são as condições econômicas, ou seja, a renda da família, como um todo. Portanto, a piora dos indicadores sociais e o aumento do desemprego, são elementos fundamentais no número de filhos que as famílias decidem ter.

José Álvaro Cardoso é economista e Coordenador do DIEESE/SC.

 

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