“Primeira medida de Lira como presidente é um golpe”, afirma líder do PSOL

Eleito com 302 votos, candidato de Bolsonaro invalida bloco do principal opositor, Baleia Rossi; oposição vai ao STF

Arthur Lira (PP-AL), um dos líderes do centrão e candidato de Bolsonaro, durante discurso de posse como novo presidente da Câmara dos Deputados – Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Por Cristiane Sampaio.

O mandato do novo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), começou em tom de controvérsia: em seu primeiro ato ao assumir o cargo, no final da noite de segunda-feira (1º), o candidato favorito do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) invalidou o bloco da chapa de Baleia Rossi (MDB-SP).

Rossi era seu principal adversário na corrida e candidato do agora ex-presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ). O emedebista era também o candidato apoiado pela maioria dos partidos de oposição. A chapa havia sido validada por Maia e reunia oficialmente PT, MDB, PSB, PSDB, PDT, Solidariedade, PCdoB, Cidadania, PV e Rede.

Mas Lira argumentou que a chapa teria sido registrada fora do prazo-limite. Ele cancelou ainda a formação do bloco de Rossi e também determinou que fosse feita outra eleição para a escolha dos demais nomes que compõem a Mesa Diretora da Câmara.

“A primeira medida de Arthur Lira na cadeira de presidente é um golpe contra o bloco opositor. É apenas a demonstração do que será essa presidência. Precisamos redobrar nossa luta”, reagiu a líder do Psol, Sâmia Bomfim (SP), em manifestação pelo Twitter.

Também pelo Twitter, a deputada federal e presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann (PR), disse que a atitude foi uma “violência contra a democracia” e que Lira “mostrou que será um ditador a serviço de Bolsonaro”.

A iniciativa do parlamentar alagoano surpreendeu e despertou comparações imediatas com o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ), que atualmente cumpre prisão domiciliar e teve uma gestão (2015-2016) conhecida pelos desmandos diante dos opositores.

A ação do pepista tende a gerar disputa no âmbito do Poder Judiciário, o que já está sendo anunciado por parlamentares de oposição. A líder da bancada do PCdoB, Perpétua Almeida (AC), por exemplo, está entre os que deram essa sinalização ainda na madrugada, logo após a confusão gerada pelo ato de Lira.

“A ditadura começou. Cunha, o retorno… Arthur Lira encerrou a sessão sem apurar os demais cargos e não há previsão no regimento para isso. Sequer teve coragem de abrir os microfones para os líderes contestarem. Vamos recorrer”, disse, em uma postagem pelo Twitter.

Em nota conjunta publicada depois das primeiras manifestações, nove dos dez partidos que compunham a chapa de Rossi classificaram a medida como um “ato autoritário, antirregimental e ilegal”.

“A eleição é una: não se pode aceitar só a parte que interessa. Ao assim agir, afrontando as regras mais básicas de uma eleição – não mudar suas regras após a sua realização –, o deputado coloca em sério risco a governabilidade da Casa. A insistir nesse caminho, perderá qualquer condição de presidi-la”, diz o texto, assinado por PT, MDB, PSB, PSDB, PDT, PCdoB, PV, Rede e Cidadania.

“Os procedimentos adotados na eleição pelo ex-presidente Rodrigo Maia tiveram a participação e o concurso deles, do bloco deles. Excluir, autoritariamente, depois de fazer um discurso pedindo diálogo, [é algo que] compromete qualquer processo de funcionamento democrático desta Casa. Não vamos aceitar tamanho absurdo”, disse o líder da minoria, José Guimarães (PT-CE).

Eleição

A decisão de Lira é considerada surpreendente porque rompe o ritual habitual da Casa, que costuma eleger todos os ocupantes de tais cargos no mesmo dia da eleição do presidente.

A mesa tem mais dez cargos além da função de presidente. São eles: dois vice-presidentes, quatro secretários titulares e quatro suplentes. A distribuição dos nomes nessas cadeiras segue critérios de proporcionalidade partidária. Por conta da novidade gerada pelo ato de Lira, a tendência é que haja uma mudança grande no desenho que vinha sendo estruturado para a composição da mesa.

A oposição – que havia conquistado, em tese, posições importantes – tende a ficar mais desprivilegiada no xadrez político. Três deputadas do segmento haviam sido, por exemplo, indicadas e eram candidatas únicas aos cargos da 1ª secretaria, da 2ª secretaria e da 4ª secretaria: Marília Arraes (PT-PE), Rose Modesto (PSDB-MS) e Joenia Wapichana (Rede-RR), respectivamente.

No caso desta última, seria a primeira vez que a Câmara teria um nome indígena na mesa, considerando os quase 200 anos de história da instituição. Originalmente, a vaga era do PSB, mas um acordo fez com que a sigla cedesse o posto para a Rede, para que Joenia, a primeira mulher indígena a conquistar uma cadeira na Casa, pudesse ocupar a vaga.

Mas agora, com a invalidação do bloco de Rossi, a disputa para tais cargos volta à estaca zero.  Segundo o ato formal de Lira, eles terão os novos nomes escolhidos somente nesta terça (2), a partir das 16 horas. Antes disso, as lideranças partidárias devem se reunir para fazer um novo fatiamento dos cargos.

Bolsonaro X Maia

Em termos de simbologia, o resultado da eleição para presidente da Câmara representa uma vitória política para Jair Bolsonaro (sem partido), que se envolveu diretamente nas articulações para levar Lira ao posto e é acusado de distribuir cargos e emendas em troca de votos.

O placar da disputa também simboliza uma derrota para Rodrigo Maia (DEM-RJ). Ele foi o responsável por alinhavar o apoio oficial das legendas que compunham o grupo de Rossi, o deputado que polarizava a disputa com Lira e terminou em segundo lugar. O emedebista encerrou a corrida com apenas 145 votos – uma demonstração de que diferentes parlamentares do seu próprio bloco traíram o grupo e depositaram voto em Lira, conforme vinham sinalizando algumas projeções de bastidor.

Placar

Em termos de cardápio, o pleito foi marcado pela pulverização. Nos últimos instantes antes da votação, Alexandre Frota (PSDB-SP) retirou o próprio nome da disputa, reduzindo o número de candidatos de nove para oito postulantes.

O placar final dos concorrentes ficou da seguinte forma: Fábio Ramalho (MDBV-MG) na terceira posição, com 21 votos; Luiza Erundina (Psol-SP), com 16; Marcel van Hattem (Novo-RS) angariou 13 apoios; André Janones (Avante-MG) teve três eleitores; Kim Kataguiri (DEM-SP) finalizou a corrida com dois votos e General Peternelli (PSL-SP) obteve apenas um. O placar contou ainda com dois votos em branco.

Edição: Rodrigo Durão Coelho.

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