Por Helga do Nascimento de Almeida.
O golpe dado por Michel Temer é uma realidade agonizante e que vem trazendo diversos desdobramentos perversos para o Brasil. Os resultados dessa empreitada de diminuição feroz do Estado brasileiro, além de estarem produzindo cicatrizes profundas na economia e desenvolvimento social do país, também têm gerado marcas na relação entre as elites políticas brasileiras e os eleitores.
Se a desconfiança em relação aos representantes políticos no Brasil já era baixa – segundo dados da FGV a confiança da população na figura do presidente da República em 2015 era de 14% e no Congresso era de 12% – hoje, diante de um presidente que apresenta uma taxa de aprovação de 4% (segundo pesquisa VoxPopuli/CUT de 2 de Agosto de 2017), há, de fato, um perceptível desânimo nacional em relação aos políticos brasileiros.
Se estamos vivendo uma realidade tão adversa, o que se pode fazer? Como dar mais transparência para às ações políticas? Como aproximar políticos e cidadãos para que esses últimos consigam ter uma maior margem de influência sobre os mandatos de seus representantes? Como fortalecer o relacionamento entre representante e representados no momento entre eleições?
Segundo Castells (2004), a internet não tem mais um papel puramente instrumental, mas, ao contrário, hoje há uma transformação das regras do jogo sociopolítico no ciberespaço, o que faz com que a internet esteja afetando o próprio jogo. Se a internet vem se tornando central na política, pode-se ver que os parlamentares em todo o globo não só notaram a mudança de paradigma tecnológico como já têm absorvido e se instrumentalizado para usufruírem das possibilidades dessa nova realidade.
Bom, se antes a percepção era de que a as elites políticas, em especial o Poder Legislativo, se abrigavam em uma caixa preta, agora a percepção é de que as elites políticas, na Era da Visibilidade, isso não é mais possível.
O encontro entre cidadãos e parlamentares no ambiente digital tem acontecido tanto pelo crescimento do uso pelos cidadãos, quanto por parlamentares. A pesquisa TICs Domicílios 2015 (2016) demonstrou que 58% das(os) brasileiras(os) se declaram usuárias(os) de internet (em 2014 eram 55%). Destes que usam a internet, 85% usam a rede para mandarem mensagens instantâneas por Whatsapp, Skype ou chat do Facebook, além disso, 77% usam redes sociais como Facebook, Instagram ou Snapchat.
Esse novo panorama torna indispensável que parlamentares estejam na internet e principalmente nas redes sociais, já que, como apontaram Pereira e Sátyro (2016), os políticos têm que ir onde o povo está e, nesse momento, a presença nas redes tornou-se fundamental se se quiser um relacionamento com alguma proximidade com o eleitorado.
No Brasil já se vive uma realidade de ampla adesão de parlamentares às redes sociais. De acordo com dados dispostos em minha tese de doutorado (Almeida, 2017) e focando o olhar para o uso da rede social mais usada por brasileiros, o Facebook [1], 63,16% dos deputados federais tinham páginas no Facebook em 2013, já em 2017 vimos que 97,90% dos deputados federais brasileiros têm páginas no Facebook, ou seja, em apenas quatro anos houve um crescimento de 34,76%.
O que se percebe através dos dados é que há universalização no uso do Facebook pelas(os) parlamentares da Câmara dos Deputados. Ou seja, o que diferencia parlamentares não é mais sua presença ou ausência na rede. Todas(os) estão no Facebook.
Então o que as(os) diferenciarão? A qualidade de uso das redes sociais. Parece que há parlamentares que ainda permanecem em um estágio de web 1.0, em que as relações se pautavam por um modelo one-wayconversation e assim constroem suas figuras digitais em páginas que só difundem mensagens e consideram suas(seus) seguidoras(es) apenas como receptoras(es).
No entanto, ao mesmo tempo já se pode ver parlamentares que têm conseguido mergulhar na era da web 2.0 e instituem um modelo de feedback e uma conversa em duas vias, em que o debate é central nos espaços abertos por sua página e as(os) seguidores(as) são considerados agentes informacionais e fiscalizadores fundamentais.
Dessa forma, ao analisar-se melhor a diferença de uso e engajamento gerado pelas páginas de diferentes categorias de parlamentares, começa-se a entender que há deputados federais que já têm conseguido construir uma dinâmica interativa dentro de seus facebooks, o que pode contribuir com a tentativa de uma reaproximação entre representantes e representados.
Se se olha para categorias específicas e o número das comunidades de seguidoras(es) das páginas de deputadas(os) de ideologias diferentes, por exemplo, é possível sublinhar que deputadas(os) de centro têm uma mediana de seguidores um pouco maior que deputadas(os) de esquerda, e por último estão os deputados de direita.
Por fim, entendendo melhor o engajamento das(os) seguidores(as) percebido nas páginas na semana amostral de 2016, se vê que, mais uma vez, deputadas(os) de esquerda se sobressaem, o que pode indicar que essas(esses) têm seguidoras(es) mais participativos. Já na categoria ideologia, em primeiro lugar estão deputadas(os) de esquerda.
A conclusão que se chega é que a internet já tem sido encarada como um espaço de encontro entre parlamentares e cidadãos brasileiros. Para alguns parlamentares isso ocorre em menor escala, para outros em maior escala. Obviamente não se ignoram os problemas das fraturas digitais e as bolhas no Facebook, no entanto, pode-se afirmar que tem ocorrido uma abertura de comunicação não mediana para que representantes e representados possam interagir e debater.
Parece ainda ser esse um pequeno passo em direção a possibilidades mais consistentes de construção de um relacionamento entre eleitor e eleito no extenso período entre eleições.
É bom que lembremos que a representação democrática deve ser encarada como um relacionamento (YOUNG, 2006) e que mecanismos de comunicação devem ser estabelecidos exatamente para manter a interlocução entre representantes e representados (PITKIN, 1983).
Esclarecimento:
[1] De acordo com o portal “The Statistics Portal” a taxa de penetração do Facebook na população brasileira de 53,9% (dados de Abril de 2017)
Fonte: Pragmatismo Político