Um médico norueguês diz ter a resposta.
Tradução de Elissandro Santana, para Desacato.info.
Toluca, Estado do México. –Não acredito no destino, porém, há certos momentos na vida que quase me convencem a acreditar que nada é por acaso. Uma dessas ocasiões se deu quando conheci Gernot Ernst.
Nisto vinha pensando havia um tempo: por que as pessoas seguem apoiando a direita, a pesar do fato de que, sob seus governos, sabem que fica pior? Nos Estados Unidos, Donald Trump não perde popularidade. Na Espanha, a população continua votando no Partido Popular. Mauricio Macri atualmente é o presidente da Argentina graças ao voto massivo da população. No México, nos preparamos para o retorno à presidência do Partido Ação Nacional… Por que diabos?! A partir disso, queria escrever este artigo.
Porém, não achava uma razão convincente. A Teoria diz muito, sim, mas não conseguia amarrá-la ao século XXI. Então, fui este fim de semana a Toluca, Estado do México, a uma conferência sobre a crise do capitalismo organizada pelo Partido do Trabalho e conheci o doutor Ernst.
Ernst é um intelectual incrível. Médico anestesista do Vestre Viken Hospital Trust, em Korngbesrg, Noruega. Neurobiólogo e cientista social, ele realizou pesquisas a partir da Teoria da Complexidade associadas à medicina e às Ciências Sociais. Ademais, é conselheiro científico do Partido da Esquerda Socialista da Noruega. Ou seja, o sujeito sabe do que fala.
Em sua apresentação, Ernst disse que o pensamento de direita tem uma explicação neurocientífica. O contexto social atual é o terreno fértil para isso. A internet, literalmente, bombardeia com merda os cérebros das pessoas. O chamado “shitstorm” –termo urbano para descrever coisas que vão aparentemente bem –, porém, quando realizadas, terminam horrendamente mal–, deixam coisas (selfies, memes, chats, fotos e vídeos quaisquer) que desaparecem rápido e deixam frustração. As redes sociais estão lotadas de pseudo-argumentação, geral egoísmo e, com elas, é fácil tirar sarro de assuntos sérios, como uma tragédia humana, um ato de corrupção política e a luta de um grupo de pessoas por seus direitos. Merda, pois. E o mais perigoso de tudo: geram medo e o medo é a matéria-prima da direita.
Ernst explicou que a direita sabe muito bem o que faz, quando falou para o público. Por exemplo, criam inimigos abstratos: migrantes, homossexuais, mulheres e anarquistas; nisso se funda a razão do medo. Então, um candidato ou candidata de direita aparece como uma figura paternal, que é capaz de resolver seus problemas. Provoca –diz o doutor–, patriarcado.
E o pai acredita em tudo, por ser pai e por haver-te colocado em uma posição infantil de indefesa. De fato, uma vez entregando-te a ele, cada informação que ele faça a toma como válida. Não importa se sabe que é mentira; não importa se ele mesmo sabe que é mentira, explica Ernst. Ele criou uma imagem do “nós contra os outros”. Não argumenta. Não te coloca para pensar, não necessita. O único que a direita requer é colocar imagens em tua cabeça mediante palavras e definições: “Os mexicanos são estupradores e traficantes”.
Buscava uma resposta? Ali a tinha. Porém não era suficiente. Queria saber mais e, então, me lancei a conversar com ele.
–Ernst, diga-me: por que a direita tem tanto êxito hoje em dia?
–Os meios de informação mudaram, particularmente, a internet. Porém, também, a forma de educação, de movimento, isto faz com que nossa cabeça mude; que tenhamos dificuldade em nos concentrarmos, em aceitarmos ou entendermos argumentos. Isto é explorado pela direita porque se especializa em utilizar o medo. Sabe o que está fazendo. Está utilizando o medo social.
- Porém, por que funciona tanto?
–O medo, a confusão. É um fato que, quando você está confuso, teu cérebro não consegue argumentar. O cérebro é fácil de convencer com imagens, com palavras simples. Por exemplo, as grandes lojas fazem grandes labirintos onde as pessoas não encontram a saída. É uma estratégia, porque quando você está confuso não encontra forças para resistir ao consumo; é uma técnica; é fácil confundir as pessoas. É a estratégia: aumentar o medo, aumentar a confusão e assim eles sabem que as pessoas vão apontar para a direita. É uma estratégia fascista clássica.
–Trump e seus seguidores sabem exatamente o que estão fazendo. Trump, psicologicamente, é um homem idoso que teme a morte. É uma estrutura típica da direita. Eles temem mais a morte do que os da esquerda. E quando você teme a morte, quando tem medo, teu método para sobreviver é a agressividade. Esses instintos são provocados. Nos comícios de Trump, dos que estão ali, a maioria é homem idoso e também homem ou mulher com uma alimentação que não é boa, por isso, suas funções cerebrais não funcionam eficazmente. Esta é uma estratégia que se construiu e seus especialistas trabalham nisso.
E que diabos fazer? Segundo o doutor Gernot Ernst, a esquerda (eu prefiro me considerar um anarquista clássico, mas o mesmo se aplica) tem em suas mãos a mais velha de suas armas: a organização social; que, dadas as circunstâncias, continua sendo a mais efetiva. “Porque a organização social diminui o medo”.
Na esquerda, aponta, não há um caminho tão fácil como na direita. “A esquerda argumenta. Porém, temos esquecido a organização e, para isso, necessitamos de mais tempo. Perdemos os trabalhadores onde não temos sindicatos, e ai devem existir companheiros que sofram e lutem com eles. Esta é a nossa força. Quando os ajudarmos em pequenas coisas, escutarão e se lembrarão do que é mais importante e lutarão também.”
Depois disso, Ernst oferece o seguinte, que, nomeei: “Conselhos do doutor Gernot Ernst para evitar que as pessoas apoiem a direita, mas apoiem a esquerda:
- APRESENTA EXEMPLOS SIMPLES PARA AS PESSOAS. Explica os problemas e argumenta com base na experiência das pessoas simples, com a qual seu público se identifique.
- MENOS DISCURSOS, MAIS PERGUNTAS. Evitar impor suas ideias. Perguntar para que as pessoas descubram a verdade por elas mesmas.
- UTILIZA EXEMPLOS HISTÓRICOS. As pessoas não possuem consciência histórica. Mostre-as o que ocorreu, para que não cometam os mesmos erros e se lembrem das conquistas antigas.
- A DIREITA MANIPULA, A ESQUERDA ORGANIZA. É válido que se utilize alguns métodos da direita, como usar imagens e definições. Porém, não se esqueça do mais importante: a organização social é a chave.
Ernst explica a própria experiência do Partido da Esquerda Socialista da Noruega e a razão de seu êxito, ao ocupar até 10% das preferências eleitorais no país. “Na Noruega temos a mesma luta contra o neoliberalismo e a organização sindical é muito forte, ainda. Em algumas áreas, 90% dos trabalhadores estão organizados e isso é único na Europa. Mas, também, por outro lado, temos um movimento populista de direita que é igualmente forte, quase 20%. É uma luta muito importante. É especial para nós o SV (“Sosialistisk Venstreparti”, nome em norueguês do Partido) a partir de três princípios gerais: a justiça social, o meio ambiente e o feminismo. Isto é muito importante para a nossa luta, porque quando somos capazes de convencer as mulheres, e elas não são simpatizantes dos populistas de direita, e trabalhamos com elas, juntos, é um dos métodos com os quais podemos ganhar”.
Despedimo-nos com um par de fotos e despedida. Eu, com a esperança de encontrá-lo mais uma vez algum dia e aprender mais. Grande sujeito. Sobretudo, para perguntar qual personagem espetacular do Jazz era aquele na camiseta que usava. Nos encontraremos em breve, camarada.
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Fonte: Alberto Buitre.
Óbvio que infiltram o medo. O diabo veste Prada. Pessoas simples veem a TV e dão depoimentos de sucesso. Empreendimentos que rendem muito dinheiro. O sonho de ter sucesso, vestir-se bem, morar bem, alavanca o consumismo. Principalmente as mulheres. Mas são ultra-machistas, xenofóbicos, não gostam dos diferentes, em especial dos pobres. Infiltram o ódio entre as pessoas. querem o povo humilde e de cabeça baixa. Não sei ser humilde, nesse sentido. Anulado… vou compartilhar para os sites de esquerda.
Olá, companheiros do Desacato! Achei o texto muito lúcido e necessário para tudo que estamos vivendo agora em diferentes contextos, porém, ainda que pareçam diferentes, estamos vivendo mesma doença direitista. Moro no México, e como bem foi delineado no texto, existe essa pressão em direção ao direitismo, entretanto também existem muitas iniciativas alternas que merecem ser ressaltadas, que contrastam e que estão sim rechaçando os sistemas hierárquicos e capitalistas. Participo, como colaboradora, de um coletivo que se chama Comité Salvabosques, é um grupo diverso, várias idades e perspectivas que está cuidado de um bosque (Nixticuil), por mais de 12 anos. Penso que há outras saídas, outros caminhos, outras ideias, outras alternativas; e esses espaços precisam de visibilidade. Saludos desde Guadalajara!