A 26 de abril de 1986 deu-se uma das maiores catástrofes nucleares da História numa pequena localidade da Ucrânia, Chernobyl. Da central, dizia-se que era tão segura que poderia ter sido construída no meio da praça vermelha de Moscovo. Há cinco anos atrás aconteceu uma nova catástrofe quando, na sequência de um maremoto, houve uma fuga nos reatores da central nuclear de Fukushima. Com o desastre na central nuclear de Fukushima no Japão, algumas pessoas voltaram a perguntar-se: pode a energia nuclear ser segura? A resposta é não. A energia nuclear nunca poderá ser segura.
Por Karl Grossman.
Isto foi claramente explicado pelo Almirante Hyman Rickover, o “pai” da marinha nuclear dos EUA e responsável pela construção da primeira central nuclear do país, Shippingport na Pensilvânia. Quando se reformou da Marinha, em 1982, advertiu, perante um comité do Congresso, para a letalidade inerente da energia nuclear – e apelou a que se “banissem os reactores nucleares.”
O problema fundamental: a radioactividade.
“Vou ser filosófico,” testemunhou Rickover. “Até há cerca de 2 mil milhões de anos atrás, era impossível haver vida na Terra, isto é, havia tanta radiação na superfície que era impossível haver vida – nada.” Isto é consequência da radiação cósmica natural quando a Terra se encontrava em processo de formação. “Gradualmente,” afirmou Rickover, “há cerca de 2 mil milhões de anos, a quantidade de radiação no planeta… diminuiu e tornou possível o início de alguma forma de vida.”
“Agora, quando voltamos a usar a energia nuclear, estamos a criar algo que a natureza tentou destruir para tornar a vida possível,” disse ele. “Cada vez que produzimos radiação” uma “força horrível” é libertada. Através da cisão do átomo, estamos a recriar os venenos que impediram a existência de vida. “Penso que a raça humana vai arruinar-se,” declarou Rickover.
Este é Rickover, uma figura-chave na história da energia nuclear, e não o Greenpeace.
O problema é a radioactividade libertada quando o átomo é dividido. E não importa se é um reactor de água em ebulição da General Electric, como os que se danificaram em Fukushima, ou de água pressurizada de design Westinghouse, ou de design russo como as centrais de Chernobyl, ou as “novas e melhoradas” centrais patrocinadas pelo Secretário da Energia dos EUA, Steven Chu, um cientista nuclear e um promotor zeloso da tecnologia nuclear. Todas elas produzem radiação e venenos radioactivos como o Césio-137, Iodo-131 e o Estrôncio-90 que foram e continuam a ser cuspidos das centrais de Fukushima.
Ao entrar em contacto com seres vivos, estas toxinas destroem-nos. Assim, desde que são produzidas numa central nuclear até saírem como “lixo nuclear” incrivelmente radioactivo, têm de ser isoladas do mundo vivo – por milhares e até milhões de anos.
Durante o processo nuclear, o urânio ligeiramente radioactivo é tirado do chão e bombardeado por neutrões – e a parte do urânio que se separa, a físsil, Urânio-235, é transformado num gémeo radioactivo de elementos seguros e estáveis na natureza: existem centenas destes “produtos de fissão.” O corpo humano não reconhece a diferença entre estes gémeos letais e os elementos estáveis e seguros. Também são produzidas partículas alfa e beta e raios gama, todos radioactivos.
Adicionalmente, muita da maior parte do urânio, Urânio-238, que não pode ser separado, agarra-se aos neutrões e torna-se Plutónio-239, a substância mais radioactiva que se conhece.
Nesta divisão do átomo, também é produzido calor – que é usado para ferver a água. As centrais nucleares são a forma mais perigosa de ferver água jamais concebida.
Porquê usar este processo tóxico para ferver água e gerar electricidade? Tem menos a ver com ciência do que com política e economia – desde o rescaldo do Projecto Manhattan até hoje. Durante a II Guerra Mundial, cientistas trabalhavam em laboratórios secretamente estabelecidos em todos os EUA para construir armas atómicas. Em 1945, o projecto empregava 600 mil pessoas e milhões de dólares foram gastos. Lançaram-se duas bombas no Japão. E, com o fim da guerra, o Projecto Manhattan tornou-se a Comissão de Energia Atómica dos EUA e mais armas nucleares foram construídas. Que mais poderia ser feito com a tecnologia nuclear para perpetuar o empreendimento nuclear?
Muitos cientistas e funcionários do governo não queriam que os seus empregos acabassem; empresas que tinham parcerias no projecto, como a General Electric e a Westinghouse, não queriam que os contratos cessassem. Como escreve James Kunekta, no seu livro “Cidade de Fogo”, sobre o Laboratório Nacional de Los Alamos, com a guerra acabada surgiram problemas de “colocação de empregos, continuidade do trabalho… mais tempo livre que trabalho… pouco para manter toda a gente ocupada.”
As armas nucleares não servem para derivados comerciais. Que mais poderia ser feito com a tecnologia atómica para manter o establishment nuclear a funcionar? Avançaram-se planos para se usar a energia nuclear como substituta da dinamite para fazer enormes buracos no chão – incluindo colocar uma série de 125 dispositivos atómicos ao longo do istmo do Panamá e criar o “Canal Panatómico,” usando a radioactividade para cozinhar comida para que fosse armazenada durante anos; construir aviões que utilizem energia nuclear (esta ideia não foi longe por causa do peso do chumbo necessário para proteger os pilotos) – e usar o calor gerado para ferver água e produzir electricidade.
Desde sempre, os cientistas nucleares – como Chu – tentaram minimizar, até negar, o perigo mortal da radioactividade e, como a Pinóquios Nucleares, impor a sua tecnologia.
As centrais nucleares – as 443 existentes em todo o planeta – deveriam ser encerradas e mais nenhuma deveria ser construída. Como afirmou Rickover, os reactores nucleares deveriam ser banidos.
Anos atrás, durante a campanha de Bill Clinton, o slogan foi “É a economia, estúpido.” Com as centrais nucleares é “É a radioactividade” – inerente ao processo e moral.
Em vez disto, devemos implementar o uso de tecnologia segura, limpa e renovável como a solar, a eólica (actualmente, a que cresce mais rápido e mais barata que a nuclear) e a geotermal e todas as restantes que, como concluem os grandes estudos, podem fornecer toda a energia de que o mundo precisa – energia sem a radioactividade letal, energia com a qual podemos viver.
Karl Grossman, professor e jornalista na Universidade Estadual de Nova Iorque/Faculdade de Westbury, tem feito reportagens de investigação sobre energia e ambiente desde há 40 anos. É o apresentador do programa de televisão “Enviro Close-Up” e autor de inúmeros livros.
Retirado de Counterpunch
Tradução de Sofia Gomes para o Esquerda.net.
Foto de Clement127/Flickr
Fonte: Esquerda.net