´Se eu conseguisse juntar dinheiro, eu estudaria’, afirma Nhum, de 13 anos; Os pequenos trabalham como ajudantes, cumprindo os encargos como descer água e utensílios de trabalho para dentro do poço
Por: Carlos Hernández
Parece um jogo, mas é algo muito diferente disso. Nhun e Bu não tiram de seus rostos os sorrisos de criança enquanto a terra os engole. Os dois irmãos, de 13 e 10 anos de idade, desaparecem no interior de um estreito poço, escavado no solo avermelhado e úmido da província cambojana de Ratanakiri. O buraco tem apenas 70 centímetros de diâmetro. Apoiando as costas na parede e os pés na superfície oposta, Bu, o irmão mais novo, leva apenas 10 segundos para atingir o fundo, doze metros abaixo. Nhun precisou parar muito antes, suspenso sobre o vazio, pois sua velha lanterna não funciona. Após bater nela com força várias vezes, a lâmpada passa a emitir uma luz tênue e hesitante. Para ele, é mais do que o suficiente, e por isso não hesita em retomar a descida, seguindo seu irmão.
Eles são apenas dois dos garotos que trabalham na mina artesanal de pedras preciosas localizada em uma plantação de seringueiras, próxima à cidade de Andong Meas, a 550 quilômetros da capital Phnom Penh. A paisagem criada na região é surreal. As árvores, perfeitamente alinhadas, projetam um mar de sombras densas sobre um terreno que parece ter sido destruído por um exército de toupeiras gigantes.
“O dono comprou o terreno e plantou as árvores para produzir borracha. Foi só mais tarde que ficou sabendo que poderia ter pedras preciosas sob o solo”. Quem fala é Keo, um dos mineiros adultos que ganha a vida neste trabalho duro e perigoso. Com o rosto, as mãos e toda a roupa cobertos de barro, explica os motivos que o levam a arriscar a vida todos os dias: “Trabalho no campo, mas com o que ganho só dá mesmo para alimentar minha família. Por isso venho aqui sempre que posso. Já estou fazendo isso há dois anos, mas ainda não tive sorte. A maior pedra preciosa que encontrei valia menos de cem dólares”.
Keo e o restante de seus companheiros são obrigados a vender todas as pedras que encontrem ao dono da plantação. É uma espécie de contrato informal. O proprietário das terras permite que os trabalhadores a escavem e, em contrapartida, obtém grandes lucros revendendo as pedras a três vezes o valor pago aos mineiros. “Muitas vezes não encontro nada”, complementa Keo. “Em outros dias, acho algumas pequenas gemas pelas quais consigo quatro ou cinco dólares”.
Mina de pedras preciosas em Andong Neas, no interior do Camboja: Carlos Hernández
Um trabalho extenuante e perigoso
Para chegar até os depósitos, os mineiros cavam os buracos armados apenas de pás de ferro. À medida que vão perfurando o terreno, um companheiro extrai a areia munido de um cesto e uma polia. O objetivo é alcançar os doze metros de profundidade, onde se encontram as gemas. Chega então o momento mais delicado e perigoso: escavar túneis de um metro de largura ao redor do fundo do poço, em busca do precioso tesouro. O terreno argiloso está sempre úmido devido às frequentes chuvas, que o tornam ainda mais instável. “Não tenho medo. É verdade que, de vez em quando, algum companheiro acaba morrendo soterrado. Eu sei que o risco existe, mas há outros trabalhos que também são perigosos”.
Faz 24 horas que não chove e, por isso, a atividade é frenética na mina. Entre os mineiros, encontramos vietnamitas, membros da etnia khmers e integrantes da minoria étnica taupon. Em apenas um dia, se não surgirem problemas, cada homem cava seu próprio poço e finaliza a busca. O pior começa a partir dos cinco metros de profundiade; nesta altura, o ar começa a ficar viciado, o que, junto ao calor, dificulta ainda mais o enorme esforço físico que a obra requer. O único método de ventilação consiste em jogar um punhado de areia dentro do buraco, o que, segundo dizem, arrasta um pouco de oxigênio para dentro da zona de trabalho. As dificuldades respiratórias, em todo caso, não estão entre as principais preocupações dos mineiros. Frequentemente, uma espessa fumaça branca surge de dentro de algum dos poços. Ninguém se inquieta, não é nada grave; alguém decidiu simplesmente descansar um pouco e fumar um cigarro a doze metros de profundidade.
Um dos poços, com apenas 70 centímetros de diâmetro: Carlos Hernández
Neste reduto de homens rústicos, os garotos desempenham um papel especial: “Nosso trabalho consiste em retirar raízes e areia dos buracos”, afirma Nhun. Os pequenos trabalham como ajudantes, cumprindo os encargos que os mineiros lhes atribuem: descer água e utensílios de trabalho para dentro do poço, limpar as zonas mais estreitas onde os adultos não conseguem se movimentar bem… No entanto, o que mais agrada os dois irmãos é inspecionar, por sua própria conta, os poços abandonados, verificando se não encontram entre a areia alguma gema perdida. “Comecei a trabalhar com isso faz três anos, quando tinha acabado de completar dez. Ninguém me ensinou como fazer as coisas. Eu simplesmente comecei a vir com meu pai e aprendi vendo o que os outros faziam”, afirma Nhun diante do olhar atento e risonho de seu irmão.
Ao entardecer, Keo, Nhun e Bu dão por terminado o trabalho de hoje. Foi um dia ruim, não encontraram absolutamente nada. Amanhã talvez tenham mais sorte e possam ganhar alguns dólares. “O que vocês fariam se conseguissem muito dinheiro?”, pergunto-lhes. Keo, com sua mentalidade de adulto, medita por alguns instantes e responde: “Não sei, mas acho que algum dia encontrarei uma gema de mil dólares e serei feliz”. Nhun, contudo, não demora nem um segundo para responder: “Estudaria. Se conseguisse juntar dinheiro, eu estudaria”.
Veja a destreza de Bu para entrar no poço:
Texto publicado originalmente pelo site El Diário
*Tradução: Henrique Mendes
Fonte: Opera Mundi