A defesa da senadora e presidenta nacional do PT Gleisi Hoffmann divulgou neste sábado (16), um memorial que desmonta as falsas acusações que sustentam o processo contra ela e seu marido, o ex-ministro Paulo Bernardo.
Trata-se das declarações finais à Justiça a respeito da ação judicial, que será julgada nesta terça (19) pela 2ª Turma do STF. O texto esclarece ponto a ponto as contradições da narrativa construída pela PGR.
Sem conseguir rastrear qualquer movimentação financeira que desse sustentação à sua tese, os procuradores apelaram a delações contraditórias. Os principais delatores mudaram a versão de seus depoimentos conforme eram desmentidos por outros depoentes. Conforme pontuou o portal GGN, “além disso, as delações sem provas materiais foram usadas para provar outras delações”.
A declaração mostram ainda que o inquérito policial foi montado com peças obtidas ilegalmente (quebra de sigilos telefônicos sem autorização judicial, inclusive da senadora, entre outras arbitrariedades) e desmonta cada elemento da falsa narrativa.
Leia a seguir:
O processo contra a senadora Gleisi Hoffmann, seu marido Paulo Bernardo e o empresário Ernesto Kugler tem todas as características de uma farsa, com sinais evidentes de perseguição política por meios judiciais. Tudo se baseia em declarações falsas, contraditórias e conflitantes entre si, por parte de três réus que transacionaram com agentes do Ministério Público Federal em busca de benefícios penais e financeiros, sem apresentar nenhuma prova do que diziam.
O ponto de partida foi uma delação premiada do ex-diretor da Petrobras, contraditada por um depoimento do doleiro Alberto Youssef, vazado para a imprensa em outubro de 2014. Essas delações deram origem a um inquérito ilegal e secreto da Polícia Federal aberto em março de 2015. Ao longo do processo, Youssef e o também réu delator Antonio Pieruccini foram mudando suas versões na medida em que eram desmentidas pelos fatos e por outros depoentes.
Nas alegações finais, a defesa aponta inúmeras contradições entre os fatos e a denúncia da PGR. Além de nunca ter pedido ou recebido, dos delatores mentirosos, dinheiro para sua campanha ao Senado em 2010, Gleisi Hoffmann não poderia jamais ter sido acusada de corrupção passiva, pois não ocupava cargo público na época. Pela mesma razão, é falso dizer que teria praticado “ato de ofício” para supostamente beneficiar Paulo Roberto Costa, a quem sequer conhecia.
Gleisi Hoffmann não pediu nem recebeu dinheiro ilegal para sua campanha ao Senado em 2010; não teve, antes, durante ou depois de ser eleita, qualquer ingerência sobre nomeações ou demissões na Petrobrás; não teve participação em desvios naquela estatal ou em quaisquer outros, e todas a provas produzidas no processo comprovam sua inocência diante das falsas acusações.
A farsa criada pela PF e pela PGR
Nas alegações finais, a defesa de Gleisi Hoffmann mostra que o inquérito policial foi montado com peças obtidas ilegalmente (quebra de sigilos telefônicos sem autorização judicial, inclusive da senadora, entre outras arbitrariedades) e desmonta cada elemento da falsa narrativa dos delatores e da PGR:
1) Delações contraditórias: Em delação premiada, o ex-diretor de Abastecimento, Paulo Roberto Costa, diz ter ouvido do doleiro Alberto Youssef que este fora procurado pelo ex-Ministro Paulo Bernardo, pedindo R$1 milhão para a campanha eleitoral de Gleisi Hoffmann. Alberto Youssef, a seu turno, afirma que Paulo Roberto, e não ele, fora procurado por Paulo Bernardo; e novamente questionado, Paulo Roberto se contradiz e alega, agora, que Alberto Youssef não lhe disse se foi o próprio Paulo Bernardo ou algum interlocutor que o havia procurado.
2) Mudança de versões: Alberto Youssef prestou seis depoimentos e apresentou versões diferentes sobre a suposta entrega do dinheiro. Primeiro disse que entregou pessoalmente R$ 1 milhão a um intermediário em seu escritório em São Paulo. Depois disse que o dinheiro foi entregue “em 2 ou 3” parcelas. Na última versão, já correndo risco de ter sua delação anulada por ter mentido, Youssef apresentou o amigo e sócio Antônio Pieruccini como suposto portador, até Curitiba, de 4 parcelas de R$ 250 mil, que teriam sido entregues ao empresário Ernesto Kluger.
3) Provas são contra o delator: Pieruccini disse que buscou o dinheiro em São Paulo, em quatro viagens, mas só apontou a data da suposta última entrega. O inquérito procurou comprovar as viagens e estadias de Pieruccini em São Paulo, nos registros de companhias aéreas e rodoviárias. Não há registros de passagens em seu nome no período investigado. Diante dessas evidências, Pieruccini afirmou, em novo depoimento, que fazia suas viagens de carro, 5 horas para ir e 5 para voltar, sempre no mesmo dia. Não há registros dessas supostas viagens nos pontos de pedágio entre as duas cidades. Disse ainda que telefonou de seu celular 4 vezes para Kluger, para combinar as entregas. O levantamento do sigilo telefônico de ambos mostra que Pieruccini não fez nenhum telefonema para Kluger no período. Disse que recebia os valores das mãos de Rafael Ângulo, também réu e tesoureiro de Youssef. Ângulo negou esta versão em depoimento e afirmou que nunca ouviu falar em pagamentos de Youssef para a campanha da senadora.
4) Delações cruzadas: Pieruccini é réu colaborador da Lava Jato e é orientado pelo mesmo advogado do doleiro Youssef, o notório Figueiredo Basto que tem ligações com Sergio Moro e é o pioneiro da indústria das delações. O depoimento de Pieruccini, pleno de contradições, é o único que sustenta a última versão do doleiro. Trata-se, portanto, da chamada corroboração cruzada, quando um réu sustenta a mentira do outro, em proveito de ambos. Se a palavra de um delator não pode ser tomada como prova, tampouco pode ser validada por outro réu com interesses comuns.
5) Perdão para os delatores mentirosos: Mesmo diante de todas estas inconsistências e mentiras, a PGR pediu abertura de ação penal contra Gleisi, Paulo Bernardo e Kluger, que negaram peremptoriamente em depoimentos todas as acusações. Mas os supostos corruptores e seus agentes (Paulo Roberto Costa, Alberto Youssef e Pieruccini) obtiveram perdão judicial e não foram denunciados pela PGR. Que tipo de denúncia de corrupção é esta, em que só existem supostos corruptos e nenhum corruptor?
6) “Corrupção” sem ter cargo público: Na denúncia ao STF, a PGR acusa Gleisi Hoffmann pelo “recebimento de vantagens indevidas em razão do mandato parlamentar que cumpria” e em “comprovada atuação como parlamentar e líder do Partido dos Trabalhadores”. É evidente a má-fé: em 2010, quando teriam suposta e falsamente ocorrido os fatos investigados, Gleisi Hoffmann não ocupava nenhum cargo público, não tinha mandato parlamentar nem era líder do PT. Não tinha, durante a campanha, e não teve, depois de eleita, qualquer ingerência na indicação ou manutenção de diretores da Petrobrás,
7) “Ato de ofício” sem cargo público: A tese da PGR, sustentada unicamente na palavra de um delator, é de que Paulo Roberto Costa teria entregue (a quem?, pois isso não está descrito o na denúncia) R$ 1 milhão (o que nunca ocorreu) em troca de suposto apoio para manter-se no cargo de Diretor de Abastecimento da Petrobrás (o que nunca esteve na alçada de Gleisi Hoffmann). Num delírio acusatório, a PGR afirma: “No caso em exame, houve a prática efetiva de atos de ofício, consumando-se o abuso de poder de funcionários públicos.” Mais uma vez: que ato de ofício poderia ter sido praticado por alguém sem cargo público em 2010?
8) “Ato de ofício por omissão”: Apelando por fim para o absurdo, a PGR afirma que o suposto e inexistente ato de ofício não teria sido praticado durante a campanha eleitoral de 2010, mas depois, no mandato e no período em que Gleisi foi Ministra-Chefe da Casa Civil. E nesta hipótese de futurologia, segundo a denúncia, a Senadora teria praticado “ato de ofício por omissão”. Ocorre que até mesmo as testemunhas de acusação (o ex-senador Delcídio Amaral e o empresário Ricardo Pessoa) declararam em juízo que Gleisi Hoffmann nunca teve envolvimento nos desvios da Petrobras. O fato é que a senadora sequer conhecia Paulo Roberto Costa, muito menos tinha conhecimento dos desvios, como não tinha a sociedade brasileira, antes que fossem revelados no curso da Operação Lava Jato. E recorde-se que Paulo Roberto perdeu seu cargo em 2012, dois anos antes do início da operação.
9) Denúncia sem provas: Não há nos autos nenhuma prova ou sequer indício da alegada e inexistente movimentação financeira, seja em contas pessoais, de pessoas jurídicas ou de campanha. Nenhum telefonema, gravação, fotografia, documento ou anotação capaz de corroborar minimamente as falsas alegações.
10) Denúncia sem crime: Entre tantos defeitos, a denúncia do Ministério Público não foi capaz de individualizar qualquer conduta ilegal da senadora Gleisi Hoffmann. Nem mesmo a alegação inicial, da transferência (inexistente) de R$ 1 milhão se refere a ela, mas apenas vagamente à “campanha”. Ninguém pode ser condenado, nem sequer denunciado, sem que se mostre o suposto crime cometido. E Gleisi Hoffmann não cometeu nenhum crime.
As sete versões da mentira
1) Alberto Youssef inicialmente afirmou que teria entregue pessoalmente a quantia de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) para um senhor em shopping em Curitiba
2) em declarações complementares, “corrige” circunstâncias fundamentais dessa “estória” ao afirmar que “não entregou o valor todo de uma vez, mas em três ou quatro operações”;
3) mais à frente, estabelece nova dúvida, ao dizer que “em razão do fluxo de caixa, decidiu que essa entrega ocorreria em duas ou três vezes”;
4) por fim, nova teoria: se contradiz e passa a afirmar que “o declarante não veio pessoalmente fazer essa entrega”, pois quem a teria efetivado seria seu emissário, Rafael Ângulo Lopes. Ouvido pela PGR Rafael Ângulo, também signatário de um acordo de colaboração premiada, negou veementemente ter entregue quaisquer valores à campanha da senadora Gleisi.
5) Quando estava prestes a perder os benefícios do acordo de delação, Youssef apontou Antônio Carlos Fioravante Pieruccini como suposto portador das remessas de dinheiro. Sob orientação do mesmo advogado, Pieruccini intenta dar credibilidade à versão de ex-sócio e amigo. Ele alega 04 (quatro) encontros para operacionalizar as entregas ao empresário Ernesto Kugler, que nega veemente a história.
6) Pieruccini disse que buscava o dinheiro no escritório de Alberto Youssef em São Paulo para transportar até Curitiba e entregar a Kugler. A investigação não encontrou nenhum passagem em nome de Pieruccini nas empresas aéreas ou rodoviárias no alegado período. Tampouco encontrou ligações telefônicas entre Pieruccini e Kueger, exceto uma de 13 segundos sem relação com caso.
7) Diante de mais uma contradição, Pieruccini alegou que fazia as viagens de Curitiba a São Paulo em seu próprio automóvel, indo e voltando no mesmo dia (10 horas no percurso de ida e volta em média). A investigação não encontrou nenhum registro da passagem do automóvel de Pieruccini pelos pedágios entre as duas cidades.
A indignação de Gleisi Hoffmann
Em seu depoimento à Justiça, transcrito nas alegações finais, a senadora Gleisi Hoffmann mostrou sua indignação com as falsas denúncias e com o julgamento midiático a que foi submetida por causa de uma denúncia sem fundamento e sem provas. Eis a transcrição deste trecho do depoimento:
“Então na verdade, eu quero deixar registrado isso, porque como eu lhe disse, eu não tive nenhum outro momento que eu pude falar nesse processo, única vez que eu falei foi no inquérito policial, na Polícia Federal, eu não fui mais ouvida. E tive que ouvir todos, inclusive através da imprensa, com delações vazadas, com depoimentos vazados, com tudo. É verdade que a denúncia foi aceita, num clima eminentemente político, que já mudou muito (…).
Então é óbvio que a gente fica indignado que a gente tem que ficar respondendo uma coisa que é mentirosa. Me desculpa, é mentirosa. Eles não me deram esse dinheiro, eu não peguei esse dinheiro, entendeu? E eu quero saber qual é o meu crime de corrupção passiva. O que eu fiz pra essa gente que justifique eu estar sendo acusada de corrupção passiva. O que eu fiz pro Paulo Roberto Costa? O que eu fiz pros fornecedores da Petrobrás? Onde eu dei vantagem? Mesmo depois, como ministra chefe da Casa Civil. Onde eu dei vantagem? Nenhuma, nem como senadora. Peguem todas as minhas votações que eu tive no Senado, meus projetos de lei, meus posicionamentos e vocês vão ver que não tem uma votação ali que possa ter beneficiado. Muito pelo contrário. Então eu só tenho que ficar extremamente indignada (…).
Então, eu sinceramente, doutor, eu espero, não estou pedindo pra ter nenhum tratamento diferenciado. Muito pelo contrário, eu só quero ter o tratamento dentro da lei, do devido processo legal. Se tiver nexo causal, se vocês provarem que eu pratiquei corrupção passiva e que eu lavei dinheiro, eu vou responder pelos crimes. Mas eu não fiz. E, portanto, tem que ter prova nesse processo. Porque, senão, não dá pra condenar.