Deputados, prefeitos e vereadores de Santa Catarina articulam para o mês de julho um encontro com o presidente Jair Bolsonaro para cobrar a transformação do Parque Nacional da Serra do Itajaí em uma unidade de conservação de uso sustentável. A mudança de categoria diminuiria o status atual de proteção da área.
O encontro está sendo articulado pelo deputado estadual Osmar Vicentini (União), criador do movimento “Acorda Brasil”, que se opôs à criação da unidade desde sua formalização, em 2004. Segundo Vicentini, o encontro com Bolsonaro já estaria “pré-agendado, com data e horário ainda a serem confirmados”.
“Entendo que temos de rever a situação, tenho um documento com apoio de todos os 40 deputados estaduais [catarinenses], defendendo a alteração da categoria do parque”, disse o parlamentar, durante uma audiência pública realizada pela Assembleia Legislativa de Santa Catarina (ALESC) para debater o tema.
A audiência pública foi proposta pelo deputado Ivan Naatz (PL), presidente da Comissão de Turismo e Meio Ambiente da ALESC, e aconteceu no dia 29 de junho, no Clube Social de Caça e Tiro Garcia Jordão, em Blumenau. Nela, estiveram presentes cerca de 100 pessoas, entre lideranças políticas e agricultores que residem nos nove municípios onde está situada a unidade.
Segundo Naatz, os moradores foram prejudicados com a criação do parque nacional. “A Polícia Ambiental e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) fazem avanços constantes nas propriedades, não permitindo reformas, ampliações, construir lagoa ou uma cerca, não podem plantar uma árvore, as pessoas estão sendo expropriadas de suas terras sem a devida indenização financeira. O que não pode fazer, aplicar a lei sem indenizar as pessoas. É um grave problema de Santa Catarina”, disse o parlamentar, durante o evento.
Os políticos presentes no encontro em Blumenau manifestaram apoio ao projeto de lei do deputado federal Darci de Matos (PSD) que propõe a mudança de categoria da unidade para Floresta Nacional, que permite múltiplos usos. Pela legislação atualmente em vigor, a extinção, redução ou recategorização de uma área protegida só pode ser feita por meio de lei aprovada em plenário.
O PL, que na Câmara recebeu o número 1791/2022, foi apresentado por Matos no dia 28 de junho, um dia antes da audiência pública. Na última quarta-feira (6), a proposta foi distribuída para análise das Comissões de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e Constituição e Justiça da Câmara, e segue em tramitação conclusiva nas comissões. Isto é, se não houver parecer discordante entre elas, a proposta vai direto à sanção presidencial, sem passar pela análise dos demais deputados.
Em sua justificativa, Matos, que é vice-líder do governo Jair Bolsonaro, disse que a mudança de Parque para Floresta Nacional é “uma oportunidade ímpar para findar com os conflitos na área”.
O parlamentar deixa claro em sua proposta que a mudança já conta com “o apoiamento e a participação dos Poderes Executivos Federal, Estadual e Municipais e pela Associação de Moradores dos municípios integrantes da Serra do Itajaí”.
Segundo as lideranças políticas presentes na audiência pública realizada em Blumenau, cerca de 150 famílias que moram dentro dos limites do parque ainda aguardam indenização e, desde que foi criado, há 18 anos, somente dez propriedades foram indenizadas pelo governo.
Durante o encontro, os participantes também propuseram a mudança na chefia da unidade e a anistia às multas ambientais já lavradas dentro do parque.
Parque Nacional da Serra do Itajaí
O Parque Nacional da Serra do Itajaí é uma unidade de conservação de proteção integral em área contínua de Mata Atlântica. Seu território de 57 mil hectares está distribuído por nove municípios da chamada região do Vale Europeu: Blumenau, Ascurra, Apiúna, Botuverá, Gaspar, Guabiruba, Indaial, Presidente Nereu e Vidal Ramos.
Segundo a Associação Catarinense de Preservação da Natureza (Acaprena), uma das organizações ambientalistas mais antigas do país, o número de moradores informado durante a audiência não corresponde à realidade.
De acordo com o Plano de Manejo da Área, diz a Acaprena, foram identificadas 334 propriedades no parque. Destas, no entanto, apenas 69 estariam totalmente dentro da unidade e apenas 3 seriam de residentes ainda não indenizados que dependem da área.
“As demais propriedades estão inativas, inacessíveis ou são usadas como fazendas ou para lazer em finais de semanas e férias”, diz a organização, que criou um abaixo-assinado contra a mudança de categoria da unidade. Em dois dias, a petição já conta com mais de 1.200 assinaturas.
De acordo com Lauro Eduardo Bacca, mestre em Ecologia e presidente da Acaprena, mudar a categoria da unidade é um equívoco que só serve a interesses políticos imediatos. Isso porque na categoria de Floresta Nacional, como propõem os deputados, a área continua sendo de posse e domínio públicos, e as propriedades particulares incluídas em seus limites ainda devem ser desapropriadas.
“A coisa foi feita de forma tão açodada, para agradar o eleitorado, que nem se percebeu que Floresta Nacional, apesar de ser uma unidade de conservação de uso sustentável, implica na desapropriação. Então não resolve absolutamente nada, simplesmente revela que houve um interesse em fazer um ‘carinho’ no cidadão, para não se resolver nada”, disse Bacca, em entrevista a ((o))eco.
Para a Acaprena, é de extrema importância que o Parque continue mantendo seu objetivo principal, de proteção de mananciais e da biodiversidade local, pois a área já sofre com inúmeras pressões, como a caça e a extração ilegal de palmito.
“Temos que demonstrar para os políticos que é mais vantajoso que os esforços sejam direcionados para a indenização das áreas e não para a troca de categoria/grupo. Parque Nacional, incontestavelmente, é a categoria mais adequada para esta Unidade de Conservação”, diz a entidade no texto que acompanha o abaixo-assinado.
Além disso, Lauro Bacca destaca seu forte atrativo turístico, potencial que tem sido negligenciado pelo governo e políticos catarinenses.
“Dada sua posição geográfica, bem perto ao litoral catarinense, com a BR-101 duplicada, próximo a Brusque, Blumenau, Rio do Sul, com a BR-460 em duplicação, próximo a aeroportos, o parque tem o potencial de ser um dos mais visitados do Brasil. Isso é o que temos que mostrar aos deputados”, finaliza Bacca.