Política do extremismo

Soldado israelense reprime manifestação pacífica das sextas-feiras contra a ocupação sionista. Foto: © Reuters/ Mohamad Torokman.
Soldado israelense reprime manifestação pacífica das sextas-feiras contra a ocupação sionista. Foto: © Reuters/ Mohamad Torokman.

Por Thiago Burckhart, Blumenau, para Desacato.info.

No ano de 1994, Eric Hobsbawn publicou seu livro intitulado “Era dos Extremos”, onde relata a história política do século XX, descrevendo-o como uma época marcada por extremismos, guerras, repressão e barbárie. A análise de Eric Hobsbawn, historiador que viveu praticamente ao longo de todo o século XX, ainda é muito realista para os tempos hodiernos, onde os extremismos continuam marcando presença no cenário político, econômico e cultural. Por certo tempo acreditou-se que o terror havia sido superado, mas as evidências mostram que efetivamente não o fora.

O século XXI já nasce com uma tragédia. O atentado às torres gêmeas no dia 11 de setembro de 2001 marca o início de um século e inaugura uma série de barbáries e extremismos em todo o mundo. Essa tragédia foi a justificativa utilizada para o cometimento de inúmeras outras tragédias no Oriente Médio, como a guerra no Iraque, muitas vezes noticiada não como tragédia, mas como uma “conquista” do ocidente. Foi essa última tragédia que alimentou outra, qual seja, o nascimento do Estado Islâmico, e o aprofundamento do fanatismo de grupos religiosos no Oriente Médio e no Norte da África. Uma tragédia leva à outra. Uma tragédia alimenta a outra.

Assim o extremismo vai ganhando nova roupagem. Mudam-se os atores, os corpos e os palcos, mas a lógica permanece a mesma. A política do extremo, que é calcada na eleição de um inimigo comum de determinado grupo e na vontade latente de exterminá-lo, ainda é uma característica do nosso tempo. Podemos questionar juntamente com Theodor Adorno e Max Horckeimer como que chegamos até esse ponto? No livro A dialética do esclarecimento, os autores se questionam como foi possível, diante de tanto avanço científico, a tragédia do holocausto? A resposta a essa pergunta, que ainda permite responder a outros questionamentos emergentes no cenário atual, pode ser o “excesso de racionalidade”, impulsionador do extremismo.

Barbárie cultural

Intelectuais como Alain Touraine e Stuart Hall afirmam que as sociedades contemporâneas vivem numa espécie de dialética entre de um lado a liberalização econômica sem restrições, e de outro o fechamento de comunidades em suas respectivas culturas, que se coloca como uma contraposição à globalização econômica e à imposição dos valores culturais ocidentais sobre outras culturas. A dialética entre o individualismo exacerbado e o comunitarismo cego e acrítico é o combustível para as culturas adotarem posicionamentos extremistas.

Se por um lado vemos a emergência de uma sociedade mais liberal em termos culturais, que abre espaço para o reconhecimento do outro diferente, por outro vemos o recrudescimento cultural de certos setores da sociedade, e sua repulsa à abertura cultural, cerrando-se em uma ideologia. Assim, a tragédia do extremismo não se restringe ao terrorismo, tanto de Estados quanto de grupos religiosos extremistas, mas se coloca com uma prática que está diretamente atrelada ao campo cultural.

Na Europa – e Estados Unidos – cresce um novo conservadorismo marcado pelo discurso xenófobo e pelo fechamento em suas próprias culturas, implicando na literal construção de muros que impedem a entrada de imigrantes do Oriente Médio. Em todo mundo e principalmente nos países mais desiguais, houve um aumento da pobreza e da concentração de renda nas mãos de poucos, aprofundando os problemas sociais, principalmente aqueles ligados à criminalidade e segurança pública. No Brasil, cresce uma espécie de fascismo social, alimentado por um absurdo controle dos meios de comunicação por pequenas famílias e pela falta de um projeto de educação sério para o país, pelo recrudescimento cultural e pelo crescimento do fanatismo religioso cristão.

Essas breves evidências atestam que a política do extremismo não foi restrita ao século XX, mas mostra-se ainda muito presente na atualidade. O extermínio do outro é a sua própria negação enquanto ser humano e sujeito de direitos. É também a negação do humanismo enquanto filosofia político-moral. Como reverter esse quadro? É a pergunta que se põe, sendo de difícil resposta. Cabe a nós pensar e encontrar meios e metodologias de diálogo. Uma tarefa nada fácil.

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