Polêmica da merenda em SP reacende debate sobre qualidade da alimentação escolar

Por Ingrid Matuoka.

merenda da escola pública  é alvo de um novo escândalo na cidade de São Paulo. Desde a volta das férias escolares, em julho, familiares denunciam que os alunos da rede municipal vêm sendo marcados a caneta com o objetivo de identificar aqueles que já se serviram e evitar a repetição do prato.

Apesar de ter “condenado a prática”, Alexandre Schneider, secretário municipal de Educação de São Paulo, afirmou que a condição está prevista no edital de contratação das empresas que prestam o serviço às escolas municipais.

Schneider afirmou ainda que a restrição se aplicava somente aos alimentos industrializados, como bebida láctea e bolachas, não recomendadas “por questões nutricionais”, mas que persistem no cardápio diário das crianças.

Outro agravante do caso diz respeito à empresa contratada pela gestão João Doria (PSDB) para servir a merenda nas escolas de São Paulo, a Milano. Segundo informações da Agência Brasil, a empresa é investigada pela Operação Ratatouille por suspeita de repasse de propina ao governo do estado do Rio de Janeiro.

Por uma educação alimentar

Para Semíramis Domene, professora de Nutrição da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o procedimento de marcar os alunos que já se serviram é um equívoco que cria constrangimento e expõe negativamente a criança.

“Além de oferecer a comida, o programa de alimentação pública tem a finalidade de promover a educação alimentar e nutricional. O caminho deveria ser construir cardápios em que alimentos ultraprocessados sejam eventuais ou sequer existam. Assim, não seria necessário restringir o acesso. Com educação e orientação, as próprias crianças fariam escolhas saudáveis”, diz.

Atualmente, a rede municipal de São Paulo serve 2 milhões de refeições por dia, envolvendo um orçamento de quase 1 bilhão de reais.

Para muitas crianças e adolescentes matriculados, a escola é o único lugar onde podem realizar a refeição principal. Também por esse motivo é essencial garantir a qualidade dos alimentos oferecidos.

“Quanto mais processados, menor a qualidade dos alimentos, por isso temos que descascar mais e desembalar menos”, defendeu Erika Fischer, ex-diretora do Departamento de Merenda Escolar de São Paulo durante a Conferência Mapa Educação.

“Este é o maior restaurante do mundo, com muita gente envolvida e impactada. E isso significa imensa responsabilidade no combate à pobreza, tanto dos alunos, quanto dos pequenos produtores”, complementou Erika.

Nesta perspectiva, a especialista defendeu a necessidade de investir na compra de alimentos produzidos por pequenos agricultores, nas produções orgânicas e livre de pesticidas, algo previsto pela Lei nº. 11.947/09, conhecida como Lei da Merenda Escolar.

Desde 2015, tal legislação prevê que 25% dos recursos dos municípios e estados para compra de alimentos escolares sejam destinados à agricultura familiar. A meta é alcançar a totalidade de aquisições.

Esta mesma lei estipula ainda “o emprego da alimentação saudável e adequada, compreendendo o uso de alimentos variados, seguros, que respeitem a cultura, as tradições e os hábitos alimentares saudáveis” nas escolas.

“Estamos falando de uma política pública que existe há mais de 60 anos, portanto, ela deve reforçar a educação alimentar e nutricional, com intensa participação social e dos conselhos de alimentação na construção do cardápio escolar”, recomendou Semíramis.

A alimentação como saber

A alimentação escolar de qualidade é condição não só para garantir a aprendizagem dos alunos, mas também para a educação integral das crianças.

“É um momento de aprender sobre hábitos alimentares, de formar o prazer por comidas in natura, de partilhar e socializar, de entender que o amigo pode não gostar de tomate como ele, mas nem por isso eles não podem ficar juntos, e também é possível discutir vários outros conteúdos do currículo por meio da alimentação”, disse Semíramis.

A apresentadora Bela Gil, do programa Bela Infância, que também esteve presente na conferência Mapa Educação, compartilha desta concepção. “A culinária dentro das escolas pode mudar a cultura geral e nos libertar da indústria alimentícia, fazendo com que o prazer em comer o que está em nosso prato não seja fruto de males contra o meio ambiente, do sofrimento de animais e seres humanos”.

Na outra ponta

Enquanto as crianças matriculadas na rede pública precisam, por vezes, se satisfazer com uma caneca de leite achocolatado e bolachas de água e sal – sem poder repetir -, a Câmara Municipal de São Paulo reserva R$ 770 mil por ano só com lanche para os vereadores.

O cardápio inclui sopas de aspargos, palmito, carne bovina, salada de folhas variadas, quatro tipos de acompanhamentos, sanduíche de metro, presunto magro, peito de peru, pão light, sucos, refrigerantes “de 1ª linha” e sobremesa.

Neste valor não está incluso nenhuma parcela do salário de R$ 11.326,00 que os vereadores recebem mensalmente.

Fonte: Educação Integral. 

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