Nestas últimas semanas me dediquei a rever, com muitas pausas, os três filmes da trilogia “O Poderoso Chefão”, obra consagrada de Mario Pruzo, magistralmente adaptada ao cinema por Francis Ford Coppola, as origens italianas, o set de grandes atores tornou o filme mitológico, a estória da máfia virou um verdadeiro culto aos Corleones, a voz de Marlon Brando, como Vito Corleone virou ícone. As interpretações dos jovens Robert De Niro e Al Pacino são espetaculares, além de grandes atuações de James Caan, Robert Durval, Talia Shire e de Diane Keaton.
Os dois primeiros filmes já os vira, muito tempo atrás, conhecia bem todo o desenrolar a grandiosidade do tema, mas rever é renovar a admiração pelo filme e personagens, torcer para desenrolar diferente, algo assim, mas realmente nada há a modificar, é muito perfeito e trágico, cruel o mundo retratado, não há meias medidas a poesia é dura e seca, sem oferecer qualquer alternativa fora da violência, quase como se apenas ela conduzisse a vida, às vezes me pergunto, será que não é verdade? Mas viver na paranoia de não se ter certeza de como se viverá, ou se sobreviverá a mais um dia é francamente desolador.
O terceiro filme, por mais que tentasse, não o via, começava, via um trecho, abandonava, não sentia o clima dos dois primeiros, era quase uma não-história dos Corleones, sempre tive esta ideia. Mas, finalmente, resolvi enfrentar e ver integralmente, os dois primeiros, com aquela paixão de sempre, e, sem receios, o terceiro, me surpreendi, achei belíssimo o filme, diferente, mas fundamental. A trama é outra, a sociedade já mudou muito, era importante um novo enfoque, a trama é deslocada para um novo patamar, a lavagem de dinheiro, como legalizar o passado.
No primeiro filme, a máfia, famílias de estruturam e disputam à bala os territórios de Nova York, é o período glorioso das vinganças, que remontam às relações na Itália, como ela se seguiu para o mundo novo, os Estados Unidos. Na segunda parte, a nova geração, já vê a máfia como negócios, que a violência atrapalha seu crescimento, as relações com a política e as novas formas de exploração do submundo do Capital: Cassinos, Drogas, guerra suja, como a ajuda da máfia a CIA no combate à Fidel, em Cuba. O mundo mudava, os EUA mais ainda, a máfia fazia sua transição, mas predominavam as atividades ilícitas, até uma famosa CPI é mostrada.
No final dos anos 70, a máfia busca agir como empresa, a faixada mais legal possível, mas as velhas relações italianas a levam a maior lavanderia, os negócios do Vaticano, ficção ou não, boa parte dos relatos, batem muito do que se sabe sobre as estreitas relações da igreja com atividades ilegais, em particular o Banco Ambrosiano, que tantas dores de cabeça causou, seguidamente aos papas. O roteiro mostra os bastidores das negociatas da máfia com autoridades do Vaticano, as manipulações dos fundos, o rombo causado por banqueiros, em alusão à Roberto Calvi, que era presidente do Banco Ambrosiano e se envolveu em longa trilha de ilegalidade, com empresas fantasmas, financiamento de ditaduras e estreita relações com o Arcebispo Paul Marcinkus, uma eminência parda da Igreja, cuja biografia é cheia de escândalos.
Foi uma grata surpresa rever os outros filmes e ter tido coragem de enfrentar o terceiro, que fechou aquele ciclo dos Corleones, mas deixando em aberto o que seria hoje a máfia, o hiato entre os dois primeiros filmes e este último foi de 16 anos, longo período que se maturou um comportamento da máfia diferente dos anos 40,50 e começo dos 60. No final dos 70 e início de 80, o terceiro filme cobre esta nova realidade, mas agora 22 anos depois, não estaria fora de cogitação um novo poderoso chefão, que elementos entrariam? Carteis de drogas, as novas máfias no mundo, como russa, chinesa, os esquemas de lavagem de dinheiro via online, as novas/velhas facilidades, de parte do Capital, encontrar no crime a sua realização.
Fonte: http://arnobiorocha.com.br/