Pobre Brasil. Fadado a ser eternamente um bobo gigante

peso da herança colonial na América Latina é um fardo que até hoje os países desta região ainda carregam, por conta das estruturas específicas que estão na origem de suas formações. Mas, no Brasil, esse legado é ainda mais paralisante, por conta das especificidades de nossa história.

Aqui, ao contrário dos nossos vizinhos, não houve grandes rupturas, frutos de embates entre o colonizador e os já identificados com os interesses da colônia. Nossa transição para a Independência, apesar de não ter sido tão pacífica quanto dizem os livros de história, foi feito com arranjos dos altos escalões. Manteve-se a monarquia e, com o passar do tempo, um projeto de país foi perdendo espaço porque nossas elites aprenderam a tirar proveito pessoal do imperialista mundial da vez. Primeiro, Portugal e seus laços de dependência ainda recentes; depois a abertura de portos para “nações amigas” — leia-se, vender matérias-primas para a já industrial Inglaterra — e, depois de flertar com as etiquetas de costumes dos franceses, se colocaram à disposição do vencedor ocidental da II Grande Guerra: os Estados Unidos. E assim tem sido desde então.

Outros países do mundo também passaram por processos de colonização e independência, mas muitos deles conseguiram romper os laços de subordinação em nome de um projeto nacionalista, de desenvolvimento e prioridade dos próprios interesses. Também um dia a China, a Coreia (do Sul), a Austrália, a Índia, o Japão e tantos outros países foram pobres, tinham um contingente enorme de analfabetos e uma economia nacional subdesenvolvida. No entanto, seja através de revoluções ou de um grande projeto nacional que incluía a proteção das suas indústrias nacionais, a massificação da educação pública de qualidade e o investimento em pesquisa e desenvolvimento (a verdadeira chave da libertação da dependência tecnológica dos países em desenvolvimento) conseguiram dar um salto adiante e se tornarem destaques no cenário internacional.

O Brasil… Bem, o Brasil, o “país do futuro”, parecia que tinha finalmente conseguido dar seus primeiros passos nessa direção, há pouco menos de 10 anos. O país crescia em plena crise internacional, abria diversas escolas técnicas e universidades federais, tirava milhões da linha de pobreza para a faixa de consumo, e como bônus, a descoberta do pré-sal garantiria para as próximas décadas os investimentos necessários para manter esse ciclo virtuoso: financiamentos em saúde e educação.

Além disso, um importante fator para que o país se consolidasse de vez entre os BRICS e deixasse para trás sua herança de país-fazenda era o investimento federal no projeto Ciência Sem Fronteiras.

Não acreditem, amigos, naqueles que dizem que a luta de classes é uma teoria que já não cabe mais no presente. Ela está aí, a olhos vistos. Seu principal exemplo é o golpe parlamentar que tirou não um partido político do poder, mas aquilo que ele representava: uma tentativa, embora tímida, de subverter nossa herança de atraso e dependência. Dessa forma, assumiram o poder, com o apoio de uma mídia parcial comprometida com os ideais do mercado, aqueles que são os descendentes da Casa Grande, dos ricos e dos privilegiados, que se sentiram ameaçados com as pequenas reformas propostas, os filhos e netos daqueles que também deram o Golpe de 64, quando João Goulart defendia as Reformas de Base.

Primeiro atacaram a partilha do pré-sal, abrindo a possibilidade de que empresas estrangeiras pudessem tirar proveito do nosso petróleo. No fim das contas isso representa o fim do financiamento da saúde e educação; depois acabaram com o que restava do incipiente Estado de Bem Estar social no Brasil, ao implementar uma política econômica neoliberal que representa um ataque à indústria nacional, sem falar no fim da proteção social e das aposentadorias, que é o que de fato significam as mudanças em curso. Mas o golpe fatal no nosso futuro foi dado recentemente com o corte do Ciência Sem Fronteiras para alunos da graduação.

O Ciência sem Fronteiras foi um projeto criado em 2011 para promover bolsas de estudo a brasileiros nas melhores Universidades do mundo. Atendendo a um quesito da Constituição que afirma ser dever do Estado a promoção da pesquisa, da ciência, da tecnologia e da inovação, o projeto visava formar jovens cientistas qualificados para ajudar o Brasil a se livrar da dependência tecnológica, que nos obriga a pagar royalties sobre patentes de produtos estrangeiros. Muitos países investiram em pesquisa e desenvolvimento (P&D) e hoje lideram a economia mundial, saindo de um atraso tão grande quanto o do Brasil. Mas como dissemos, esses países tinham um projeto de nação…

Aqui, prevalece o atraso, a superstição religiosa, a ideia do Brasil como uma grande fazenda fornecedora de matérias-primas, porque assim é que nossas elites aprenderam que deveria ser. São eles que se privilegiam desse modelo, enquanto o país chafurda e patina parado no tempo.

Estamos condenados a ser uma eterna colônia, um país gigante, cheio de potencial, mas com uma classe dominante que padece de baixa auto-estima e nenhum senso de patriotismo. Pra eles, a bandeira do Brasil só serve para representar manifestações contra governos que tentam vencer os privilégios que aquela mesma bandeira oculta sob a ideia de “brasilidade”. Um mito construído para ocultar que não somos todos iguais. Que existem brasileiros e brasileiros. Que alguns destes não tem nada em comum com os outros. Nem sequer empatia.

Fonte: Panorâmica Social. 

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