Um público formado, em sua ampla maioria, por dirigentes sindicais de Jaraguá do Sul e Região ouviu atentamente, na manhã de sábado (23), aos esclarecimentos e advertências feitos pelo advogado Matusalém dos Santos a respeito da Reforma da Previdência (PEC 06/2019), encaminhada pelo governo Bolsonaro ao Congresso Nacional. A proposta deverá passar pela Comissão de Constituição e Justiça (ainda não está definido o relator) e por uma Comissão Especial, antes de seguir para o plenário da Câmara dos Deputados. A Plenária “Os Trabalhadores e a Reforma da Previdência” aconteceu no auditório do STIVestuário e contou com as presenças do deputado federal Carlos Chiodini (MDB), dos vereadores Arlindo Rincos, de Jaraguá do Sul, e Charles Longhi, de Guaramirim, além de advogados e trabalhadores das mais diversas categorias. Durante o encontro foi lançado o livro “Crise da economia mundial e política de guerra contra a população no Brasil”, de autoria do economista José Álvaro Cardoso, supervisor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) em Santa Catarina.
Especialista em Direito Previdenciário, Matusalém dos Santos destacou os impactos da Reforma da Previdência na economia e na sociedade brasileira como um todo, se aprovada. “A reforma proposta é mais do que previdenciária, mexe também com a Assistência Social e com a legislação trabalhista, já que prevê o fim do pagamento do FGTS para trabalhadores em vias de aposentadoria e aposentados que continuarem na ativa, entre outras alterações”. Em síntese, a Reforma acaba com a aposentadoria por tempo de contribuição e impõe a idade mínima de 65 anos (homens) e 62 anos (mulheres) com o mínimo de 20 anos de contribuição ao INSS (atualmente são 15 anos). No caso dos professores, são 60 anos de idade e 30 anos de efetivo Magistério. Para o trabalhador rural, são 60 anos de idade (homens e mulheres), 20 anos de contribuição com o pagamento mínimo de R$ 600,00 anuais ao INSS. O palestrante ainda explicou as regras para a aposentadoria especial (55 anos de idade e 15 anos de exposição, 58 anos e exposição de 20 anos e 60 anos com exposição de 25 anos na atividade insalubre), estabelecendo ainda o fim do enquadramento pela periculosidade. Já para deficientes, são 35 de contribuição para grau leve, 25 de contribuição para grau moderado e 20 de contribuição para o grau grave.
Para estabelecer o cálculo do valor do benefício, Matusalém baseou-se no exemplo de um trabalhador que contribua mensalmente por 32 anos sobre quatro Salários Mínimos e que, pelas regras atuais, receberia uma média de R$ 3.035,61 calculados sobre 80% das maiores contribuições a partir de julho de 1994. Pela PEC de Bolsonaro, a média cairia para R$ 2.840,46, porque calculada sobre 100% das suas contribuições. “A perda do trabalhador pode chegar a 60% do valor do benefício”, advertiu, “acrescendo mais 2% para cada ano que passar de 20 anos de contribuição, até chegar a 100% da média, com 40 anos de contribuição”. A proposta também altera as regras para pensão por morte, que seriam de 50% do valor da aposentadoria, mais 10% por dependente. As únicas exceções se dão nos casos de invalidez por acidente do trabalho ou doença do trabalho ou profissional, que são de 100%: aposentadoria especial, aos 15 anos de exposição; e deficiente, que é de 100%.
A farsa do déficit na Previdência
O palestrante desmontou a tese de que existe déficit na Previdência, apregoada pelo governo, que não inclui no cálculo a Seguridade Social como um todo, mas apenas refere-se às contribuições sobre a folha de pagamento. Ele reconheceu que o regime solidário existente hoje é de dois trabalhadores na ativa para cada aposentado – “a proporção já foi 7 x 1”, disse -, porém, lembrou dos outros impostos que incidem na arrecadação, como todos os produtos que consumimos, e da necessidade de se cobrar dos devedores da Previdência (em sonegação e renúncia fiscal superam os R$ 450 bilhões). Matusalém dos Santos contestou a propaganda de que a Reforma vai acabar com privilégios que seriam, em tese, dos servidores públicos: “Dos 210 milhões de habitantes, apenas 11,5 milhões são servidores públicos (5,47% da população) e a maioria não recebe altos salários. É possível dizer que quase 100% da economia de R$ 1 trilhão, prevista pelo governo, virá dos não privilegiados, assalariados, BPC e dos servidores que ganham pouco”. Através de gráfico fornecido pelo próprio Ministério da Economia, Matusalém mostrou que “66,5% dos beneficiários recebem salário mínimo e que 83,4% recebem menos de 2 salários mínimos”.
O palestrante advertiu para a crueldade prevista na Reforma contra pessoas de baixa renda (com deficiência e idosos com mais de 65 anos), que recebem hoje o BPC (Benefício de Prestação Continuada), pago pelo INSS, no valor de um Salário Mínimo. Pela proposta, a idade para ter direito ao benefício reduz para 60 anos, mas o valor inicia com R$ 400,00 e só passa para um Salário Mínimo após os 70 anos, incluindo-se aí o critério patrimonial, que tem que ser inferior a R$ 98 mil: “Se tiver um terreno ou casa própria, quase que certamente acima desse valor, não teria direito ao BPC”. Por fim, Matusalém dos Santos resumiu: “Com a Reforma, todos terão que trabalhar muito mais tempo; muitos nunca conseguirão se aposentar; haverá um empobrecimento dos segurados, aumento de casos de doenças e acidentes pelo estresse, cansaço, desilusão, etc (devido ao aumento no tempo de trabalho e pela falta de perspectiva); vai aumentar o desemprego, desaquecer a economia; será o fim da garantia de reajuste do benefício pela inflação e aumentará o caos previdenciário”.
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Chiodini promete debater a Reforma da Previdência,
antes de tomar uma decisão em relação ao seu voto
O deputado federal Carlos Chiodini atendeu ao convite feito pelas entidades sindicais para participar da Plenária “Os Trabalhadores e a Reforma da Previdência”, realizada dia 23, no STIVestuário, e foi bastante indagado para que vote contra a Proposta de Emenda Constitucional 06/2019. Um dos 513 parlamentares da Câmara Federal que votarão a Reforma da Previdência do governo, Chiodini pretende formar uma opinião sobre a matéria. “O Regime Geral vai perder muito, então, estou disposto a debater com todos”, afirmou. O deputado, inclusive, convidou o palestrante a participar dos próximos debates e se dispôs a ir ao Sindicato, “quando tiver convicto do que fazer”. Chiodini citou os quase 13 milhões de desempregados no país – “o mercado cobra a aprovação da Reforma da Previdência, mas os trabalhadores não a querem” – e disse que emendas à proposta “são possíveis”. Na sua avaliação, a tramitação da PEC 06/2019 não será rápida: “Haverá recesso em julho”. Lembrou, ainda, que 80% dos eleitores da nossa região votaram em Bolsonaro.
Indignação e revolta
Os dirigentes sindicais manifestaram indignação e revolta em relação ao texto da Reforma da Previdência. O presidente do STIVestuário, Gildo Alves, lembrou que os trabalhadores em geral não teriam mais como receber o PIS (Programa de Integração Social), porque limitaria o direito ao benefício somente àqueles que ganham um Salário Mínimo mensal (atualmente são dois Salários) e criticou a falácia de que a Reforma geraria emprego, “assim como prometeram com a Reforma Trabalhista que deixa hoje um saldo de quase 13 milhões de desempregados”. Criticou ainda que no texto da Reforma da Previdência, “o aposentado que está na fábrica há 20, 30 anos, atualmente, com direito dos 40% da multa sobre o FGTS, poderá deixar de receber isso”, e também aquele que recebe o PIS: “Em Jaraguá do Sul nenhum trabalhador vai receber o PIS, porque passaria de dois Salários Mínimos, para um Salário”.
Para o economista José Álvaro Cardoso, a “contrarreforma” retira do povo e dá aos banqueiros. “Querem tirar do miserável, que ganha R$ 1.000,00 de BPC (Benefício de Prestação Continuada), para sobrar mais dinheiro para os banqueiros internacionais”. Reforçou ainda que a Emenda Constitucional 95 – “chamada emenda da morte” – impede a expansão dos gastos primários com o povo, menos um gasto, que é o da dívida pública, ficando evidente que a intenção é encher ainda mais os bolsos dos banqueiros”. Para José Álvaro, a Proposta é feita sobre mentiras e a maior delas é que a Previdência é deficitária: “A Previdência tem oito fontes de receita. Se compararmos somente a receita advinda da folha de pagamento com os gastos, isso é cálculo dos banqueiros e não o cálculo constitucional”. E finalizou: “Posso lhe garantir, dentro dos meus 35 anos de economista, que todos os argumentos econômicos do ministro Paulo Guedes são mentirosos”, afirmou.
Já o coordenador do Sinte Regional, professor Francisco de Assis Rocha, disse que as professoras (60% dos 60 mil professores estaduais) estão “apavoradas”, porque são as que mais terão impacto na sua vida com o que chamou de “deforma” da Previdência. “Imagine, senhor deputado, uma professora com 65 anos de idade numa classe que tenha 35, 40 alunos… é humanamente impossível trabalhar em sala de aula até os 65 anos”, e advertiu: “Vamos fazer uma força violenta contra essa deforma e exigir um posicionamento muito sério de todos os deputados catarinenses. No momento, fazemos um apelo ao diálogo porque, se for preciso, vamos para as ruas porque não aceitaremos essa deforma”.
O mesmo exemplo foi citado pelo diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Saúde, Almir Alexandre, lembrando que 80% dos profissionais que trabalham em hospitais são mulheres, enfermeiras, técnicos, atendentes: “Com 60 anos, como esses profissionais de enfermagem estarão lá para se tratar, não para cuidar de alguém”, advertiu. Trouxe também outra informação ao deputado: “A maior fonte de renda dos 3.875 municípios brasileiros vem do Fundo de Participação dos Municípios e, em muitos casos, o valor dos benefícios previdenciários supera os 82% da arrecadação. Esses municípios pequenos vão encolher, deixar de existir, porque não haverá dinheiro”. Almir citou também o fim do PIS para quem ganha até dois Salários Mínimos: “O governo diz que vai economizar até R$ 17,3 bilhões por ano, mas isso vai levar à quebradeira do Comércio. Qual é o impacto disso na região de Jaraguá do Sul?”, questionou.
A ex-presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção e Mobiliário, atualmente aposentada, Helenice Vieira dos Santos, lembrou ao deputado que as mulheres são as primeiras a serem demitidas, ganham menos e que muitas são obrigadas a ficar em casa, sem trabalhar, para cuidar dos filhos: “As mulheres são maioria nos grupos de idosos, porque vivem mais. Mas, de que adianta viver mais, para pagar os pecados?”, perguntou. “Somos mães, mais da metade da população brasileira, dos eleitores brasileiros e somos mães da outra metade. Pelas mulheres, vote não”, apelou Helenice. Já o professor da rede municipal de ensino, Luiz Eduardo Petry, reforçou que não há déficit na Previdência: “A CPI da Previdência mostra que não há déficit, existe má administração. As maiores empresas do Brasil sonegam a Previdência há anos, por isso, é necessário estudar a fundo e não prejudicar a grande massa de trabalhadores”.