Por Alexandre Palma.
A verdade sobre os laboratórios farmacêuticos. Angell M. Rio de Janeiro/São Paulo: Editora Record; 2007. 319 p.
A publicação, em língua portuguesa, do livro A Verdade sobre os Laboratórios Farmacêuticos, de Marcia Angell, foi uma afortunada idéia e pode oferecer aos profissionais de saúde e ao público em geral uma compreensão mais aprofundada sobre a ordem vigente na produção, divulgação e prescrição de medicamentos por parte das indústrias.
Marcia Angell, ex-editora-chefe do conceituado periódico científico New England Journal of Medicine e pesquisadora do Departamento de Medicina Social da Harvard Medical School, onde se dedica a temas relacionados à indústria farmacêutica e ao conflito de interesses nas investigações científicas, é, seguramente, uma respeitável autoridade para abordar o assunto.
O livro utiliza uma linguagem simples e se torna acessível às pessoas não iniciadas em ciências farmacêuticas ou em ciências biomédicas. Mesmo assim, não se perde em posições baseadas no senso comum; ao contrário, suas observações são pontuadas com referências que asseveram sua posição.
A pesquisadora faz um rico passeio sobre os meandros da vida dos laboratórios farmacêuticos. Seu mergulho proporciona uma riqueza de análises que permite elucubrar sobre em quem e em que as pessoas têm depositado a vida. Seu plano de trabalho favorece a reflexão sobre alguns pontos relevantes e, passo a passo, desconstrói alguns mitos.
Inicialmente, é possível destacar à idéia hegemônica, mas equivocada, de que a indústria farmacêutica é inovadora. De acordo com a autora, o mercado carece de produtos realmente novos e não de medicamentos, denominados por ela de “imitação”, uma vez que são variações de drogas antigas.
Outro mito que cai por terra é o do elevado custo financeiro da pesquisa científica despendido pelos laboratórios farmacêuticos. Marcia Angell advoga que grande parte das pesquisas tem origem em instituições acadêmicas ou governamentais, que recebem verba pública.
O conflito de interesses é mais um sério problema ético envolvendo os laboratórios e a produção de investigações científicas. A autora explica que, a despeito de uma suposta neutralidade científica, as indústrias farmacêuticas têm patrocinado as pesquisas que tentam comprovar algo que interessa a elas próprias. Os laboratórios, para justificar que uma determinada droga se mostra eficaz, apenas procuram compará-la a um placebo, mas não com drogas já existentes. Sendo assim, o mercado tem recebido medicamentos que são melhores, apenas, do que nada.
Além disso, Angell alerta que não é raro os laboratórios, ao conduzirem um ensaio clínico, viciarem seus dados de modo que possam garantir resultados mais favoráveis de seus próprios fármacos. Vale ressaltar que estão em jogo vultosas somas de recursos financeiros utilizadas para cooptar médicos e instituições e, principalmente, para desenvolver uma forte política de marketing. O estranho convívio entre a indústria farmacêutica e os médicos tem reforçado esta idéia. Willerroider 1 comenta que, na Alemanha, Grã-Bretanha, França e Estados Unidos, existem cerca de sete médicos para cada promotor de vendas, número que parece elevado e representativo do valor que o setor de marketing das empresas vem recebendo, como explica a pesquisadora.
Marcia Angell destaca, também, que os laboratórios têm buscado instituir novos mercados, criando doenças ainda não estabelecidas. Os medicamentos para ansiedade social ou para o “transtorno da disforia pré-menstrual” são alguns exemplos. Moynihan 2, em 2003, debateu assunto semelhante sobre a criação e fabricação do Viagra para o sexo feminino, sem que houvesse uma definição científica do que seja uma disfunção sexual entre mulheres.
Por fim, a autora propõe algumas possíveis soluções para, se não resolver, ao menos enfrentar essas questões. Portanto, considero este um livro fundamental àqueles que desejam se aprofundar nas questões ligadas à indústria de medicamentos e aos conflitos de interesse nas investigações científicas.
Fonte: Educezimbra