Pesquisa revela que mais de mil indígenas estavam presos no Brasil em 2020

O levantamento, realizado no decorrer do ano de 2020, apontou para um total de 1229 indígenas presos no Brasil

Em todo ano de 2020 até janeiro de 2021, foram identificados 1299 indígenas presos no Brasil.

Por Claudia Weinman e Julia Saggioratto, para Desacato. info.

O infográfico sobre: prisões e povos originários no Brasil “é um mapeamento de dados sobre pessoas indígenas presas via plataformas de acesso à informação nos estados brasileiros durante o ano de 2020. Ele é elaborado pelo Programa de Assessoramento, Defesa e Garantia de Direitos do Instituto das Irmãs da Santa Cruz e sua pesquisa é realizada em parceria com o Conselho Indigenista Missionário, com objetivo de apresentar dados públicos sobre a prisão de pessoas indígenas no Brasil e destacar a importância do uso  de medidas desencarceradoras para as pessoas pertencentes aos povos originários, especialmente em vista do cenário decorrente da covid-19” e da antipolítica que vive o Brasil.

Assista o vídeo completo desta matéria, acessando nosso canal no Youtube:

Sobre esse trabalho, conversamos com Viviane Balbuglio -consultora jurídica do Instituto das irmãs da Santa Cruz no programa assessoramento, defesa e garantia de direitos, também com a Dr. Michael Mary Nolan, assessoria jurídica do CIMI e Caroline Dias Hilgert- assessora jurídica do CIMI.

Apesar de ser uma lei nacional, cada estado tem um funcionamento próprio, então a nossa estratégia foi sempre consolidar uma série de perguntas iguais para cada região. O desafio é conseguir receber todas as respostas dos estados em um momento em que vários sistemas estão fora do ar. Mas a gente buscou usar as ferramentas de acesso à informação, que já deveriam ser públicas. Compreender como cada gestão prisional vai identificar uma pessoa indígena é importante, pois precisamos saber se estão cumprindo com o critério autodeclaratório e sobre isso, sabemos que quem está lá no dia a dia é que está definindo se essa pessoa é indígena ou não é. A nossa intenção é mostrar um mínimo de subnotificação e sabemos que ela é gritante“, explicou Viviane.

O infográfico é um mapeamento de dados sobre pessoas indígenas presas via plataformas de acesso à informação nos estados brasileiros durante o ano de 2020.

“O indígena não deve ser encarcerado. A última coisa que se faz é encarcerar”

O relatório divulgado aponta que, “com a aprovação da Resolução nº 287 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no ano de 2019, que passou a estabelecer procedimentos para o tratamento das pessoas indígenas em conflito com a lei, tornou-se ainda mais urgente o debate sobre as condições de criminalização e aprisionamento dos povos originários no Brasil”.

O reconhecimento da pessoa como indígena ainda deve incluir informações acerca da sua etnia e a língua por ela falada. A resolução reconhece a diversidade dos povos e o fato de que, em uma mesma comarca, é possível encontrar indígenas pertencentes a diferentes etnias e diferentes povos, sendo que cada um pode ter uma forma diferente de ver o que é considerado como crime para o estado. É fundamental que exista o respeito à língua materna. O indígena tem o direito de falar na sua língua materna e todos os testemunhos que são indígenas, tem o direito de falar na sua língua materna também“, reforçou Michael Mary Nolan, da assessoria jurídica do CIMI.

Além disso, Michael apontou que os indígenas possuem direitos específicos na execução da pena, tanto para visitas, alimentação, assistência de saúde, religiosa, trabalho e educação. O Pajé, rezador, a pessoa espiritual do seu povo segundo ela, deve ter o mesmo direito que todas as outras religiões tem.

Pesquisa foi realizada em duas etapas e abrange o ano de 2020 até janeiro de 2021.

Rio Grande do Sul é o estado que mais encarcera indígenas no Brasil

Outro ponto relevante do relatório é a sinalização dos povos mais encarcerados, sendo citados os: Kaiowá, Macuxi e Guarani, no entanto, segundo a pesquisa, existe uma subnotificação de dados e povos que não estão sendo considerados e/ou informados pelos estados.

Caroline Dias Hilgert, assessora jurídica do CIMI, mencionou que alguns estados não trazem a informação sobre a quantidade de indígenas em relação aquele povo encarcerado. “Percebemos que entre as nomenclaturas citadas, não estão os Kaingang, apesar do Rio Grande do Sul ser o estado que mais encarcera indígenas no Brasil. Como o RS não mandou a quantidade de Kaingang encarcerados, não conseguimos colocar na lista esse povo“, explicou.

Outro dado importante é que o levantamento não contempla dados sobre prisões de pessoas indígenas trans ou LGBTQIAP+ como um todo. A dificuldade em conseguir dados específicos é apontada por quem elaborou essa pesquisa e a situação das mulheres indígenas encarceradas também é vista com total preocupação.

Já é precário o alcance das informações gerais de encarceramento em relação a homens e mulheres presos. Quando destacamos a população LGBTQIAP+ na pesquisa foi com a intenção de mostrar que a invisibilidade é muito grande. Tem esforços recentes de implementação de direitos, mas demarcar isso é importante para dizer que sim, nós queremos falar sobre essa população porém, estamos buscando essa profundidade de informações que é dificultada pela falta de dados enviados ou disponíveis nas plataformas de pesquisa“, alertou Viviane.

“A mulher indígena jamais deveria estar atrás das grades, ainda mais gestante” 

As mulheres, segundo Caroline, possuem direitos especiais. “A mulher que é mãe de uma criança até 12 anos, tem o direito de permanecer em prisão domiciliar, seja ela gestante ou não. Sabemos que o impacto de uma pessoa presa em uma comunidade é muito grande e que nenhuma mulher indígena deveria estar atrás das grades, ainda mais gestante“.

Saiba mais sobre o número de pessoas indígenas presas por região.

Todos esses números, além de estarem subnotificados, ainda trazem para reflexão como é feito o reconhecimento da pessoa indígena no sistema prisional e o histórico de repressão. “O sistema penal serviu para criminalizar a identidade indígena“, disse Caroline.

São quase 400 mil mortos no país por covid-19 e pela antipolítica. Mais de mil vidas indígenas ceifadas e o sistema prisional se apresenta como um complexo de ampliação do genocídio dos povos indígenas. Intensificar a divulgação dos direitos dos povos indígenas é imprescindível para a garantia de medidas de proteção à vida.

Uma cartilha lançada no mês de março, com linguagem simples e ilustrada em quadrinhos, denominada: “Os Direitos das Pessoas Indígenas em Conflito com a Lei” está disponível ao público na versão em português desde o ano passado e agora ganhou a versão em Kaingang. A tradução da HQ para a língua Kaingang foi realizada pelo programa Intérpretes indígenas: pluralidade linguística e acesso à justiça da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

A HQ em Kaingang pode ser acessada clicando aqui.

Assista o JTT Indigenista, que vai ao ar toda quarta-feira, 18h. Nesta edição, falamos sobre o lançamento da QH na língua Kaingang:

Assista o lançamento da cartilha em HQ sobre povos indígenas em conflito com a lei na língua Kaingang: 

 

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