“Periferia Viva”: ação política de solidariedade leva 21 cestas para famílias do interior de SC

    “Queremos mostrar que é possível produzir comida e não apenas commodities. Essa ação pode e deverá ser ampliada com a participação de mais pessoas e organizações. Estamos mostrando que os movimentos e pastorais sociais estão vivos, sempre estiveram e vão dar o sustento político e real na vida dos/as trabalhadores/as da cidade. Precisamos ampliar e fortalecer essas relações até rompermos com esse sistema que é genocida”, Tayson Bedin, PJR/Extremo-oeste catarinense.

    Foto: Letícia Helen/PJMP/SC.

    Por Claudia Weinman, para Desacato. info.

    SÃO MIGUEL DO OESTE/SC- As ações de solidariedade em todo o Brasil por meio de camponeses e camponesas têm feito com que trabalhadores e trabalhadoras das periferias e favelas do país consigam ter acesso a alimentação diversificada e sem veneno nesse período de pandemia mundial. O Brasil possui um registro de mais mil óbitos e já passa de 20 mil o número de infectados pelo novo coronavírus, o convid-19 e por isso, a Organização Mundial da Saúde colocou como prioridade a necessidade de isolamento social para conter a contaminação das pessoas. Um fator preocupante é a perda de R$ 20 bilhões em investimentos para o SUS, ocasionada desde a aprovação da Emenda Constitucional EC 95/2016, que têm provocado falhas gravíssimas na estrutura de saúde e na atualidade, não comportaria a realidade da pandemia se o número de casos confirmados se amplie nos próximos dias.

    Em vários estados brasileiros os/as trabalhadores informais aguardam pelo auxílio emergencial de R$ 600,00 ou R$ 1200,00, conforme a realidade das famílias. Mas, enquanto isso não acontece, o alimento que chega até as casas por meio das ações dos movimentos e pastorais sociais, por exemplo, têm possibilitado que essas pessoas consigam minimamente se alimentar. Em São Miguel do Oeste, interior de Santa Catarina, aconteceu na sexta-feira, dia 10 de abril, a entrega de 21 cestas contendo: Batata doce, mandioca, feijão, milho verde, açúcar mascavo, ovos: galinha e codorna, abóbora / abobrinha, pipoca, vinagre, sabão caseiro, chás, pão, bolachas caseiras, limões, abacates, laranjas doce e lima, chuchu e maracujá.

    A Ação foi conduzida pela Pastoral da Juventude Rural (PJR), Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP), Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) e Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e integra o ritmo de campanhas nacionais, como por exemplo, o projeto “Periferia Viva”, possibilitando o acesso aos alimentos a quem vive nas periferias e favelas de São Miguel do Oeste/SC.

    Foto: Letícia Helen/PJMP/SC.

    A característica desse programa é construir uma rede de apoio entre o campo e a cidade para fortalecer a organização popular e enfrentar as contradições que o sistema capitalista evidencia. “Vivemos em uma região que não é grande metrópole e mesmo sendo interior do estado as nossas cidades possuem favelas, periferias, pessoas com dificuldade no acesso ao alimento, inclusive no meio rural isso se apresenta. Em qualquer espaço que a gente esteja, a contradição do capital exige uma organização popular para enfrentar, para não deixar que se percam pessoas pela fome, por doenças, ou que estas se obriguem a se expor ao trabalho insalubre e não essencial para conseguir recursos mínimos de sobrevivência”, explicou o membro da Pastoral da Juventude Rural, Tayson Bedin.

    Bedin explica que a aliança vinculada ao programa “Periferia Viva” foi pensada a partir das experiências de autoproteção e organização das periferias urbanas a respeito de como se alimentar diante de uma pandemia mundial quando o Estado não chega às periferias. Além disso, ele reforça que, por meio destas ações, está se ampliando a ideia de criação de mercados diretos. “Lideranças da Frente Brasil Popular e Povo Sem Medo, que são grupos organizados em uma perspectiva de enfrentamento ao golpe em curso no Brasil se articularam para garantir especialmente comida e produtos de limpeza para o povo mais pobre urbano, considerando que essa é também uma necessidade dos povos camponeses de construir mercados diretos sem intervenção empresarial”.

    Outro elemento da ação segundo Bedin, é identificar a entrega de alimentos como um ato político e que vai na contramão de uma ideia de caridade que não problematiza a estrutura econômica do sistema capitalista. “Nós da PJR e PJMP entramos nessa solidariedade a nível nacional com uma ideia emancipatória, de construção de novos meios, com ato localizado junto ao MPA e MMC e doação direta com intenção de mapear possibilidades de doação e comida saudável, sem custos e também fortalecer iniciativas de compra direta. É importante dizer que é possível produzir no interior e construir essa ponte com a cidade”, disse.

    Campo e cidade: uma ponte não elitizada

    Foto: Letícia Helen/PJMP/SC.

    Especialmente os/as trabalhadores/as das favelas e periferias urbanas quando possuem acesso à alimentação é por meio das redes de supermercados. Bedin explica que quando se constrói uma aliança entre campo e cidade torna-se possível trabalhar os conceitos de soberania alimentar, na linha da agroecologia, da alimentação saudável, contra os transgênicos, agrotóxicos, os alimentos ultra processados, que conforme ele não alimentam o povo e fazem mal.

    Foto: Letícia Helen/PJMP/SC.

    “Estamos falando de uma tentativa de prática de emancipação regional e motivação para que os camponeses consigam viver no campo e tenham para quem produzir e vender seus alimentos. Por isso é importante que os/as urbanos/as reconheçam os/as camponeses/as como sujeitos necessários, desmontando a perspectiva do agrário como atrasado que, inclusive, o agronegócio faz isso, traz tecnologia dependente de insumos externos para o campo, endivida, seleciona”.

    Agricultura camponesa X agricultura empresarial

    “Os animais e as plantações passam a ser vistos como objetos e não como seres vivos”, Tayson Bedin (PJR)

    O Governo de Jair Bolsonaro é o “senhor” das políticas de morte do agronegócio brasileiro. Segundo os dados publicados no Diário Oficial da União (DOU) desde o início de 2019 foram autorizados 467 novos produtos, entre agrotóxicos e outros componentes considerados extremamente tóxicos para a vida. Essa forma de atuação é que vêm dando ao longo dos anos, especialmente na linha do pacote verde, sustentação a agricultura empresarial, com destaque para o empobrecimento do campo, êxodo rural, inchaço das periferias, endividamento para aqueles/as que aderem a esse sistema.

    Apenas agora, no mês de abril, em matéria divulgada no site do Psol, o Supremo Tribunal Federal (STF), através do ministro Ricardo Lewandowski, “suspendeu, em caráter liminar, a portaria do Ministério da Agricultura que determina a liberação automática de novos agrotóxicos no país caso o governo demore mais de 60 dias para concluir os estudos sobre o produto. A decisão foi tomada após uma ação do PSOL na corte contra a decisão do governo de liberar agrotóxicos indiscriminadamente no país. O PSOL também tenta derrubar a portaria do governo no Congresso Nacional”.

    “O camponês que se adapta a esse modelo de agricultura é obrigado a trabalhar de sol a sol para honrar as dívidas. Se coloca em uma produção de uso intensivo de soja, milho, trigo, tudo passa a ser produzido em escala. As vacas em larga escala, suínos, galos e galinhas em larga escala, perde-se a identidade desses animais e plantações como sendo seres vivos, transformando tudo em objetos. Poucos são os/as camponeses/as que não têm um valor de financiamento próximo ao valor do capital e que já não conseguem se desvincular disso”, enfatizou Bedin.

    Esses elementos, trazidos nesta matéria e outros ainda que serão mostrados, é que contemplam a ação de doação de 21 cestas de alimentos saudáveis para moradores/as de São Miguel do Oeste/SC. “Queremos mostrar que é possível produzir comida e não apenas commodities. Essa ação pode e deverá ser ampliada com a participação de mais pessoas e organizações. Estamos mostrando que os movimentos e pastorais sociais estão vivos, sempre estiveram e vão dar sustento político e real na vida dos/as trabalhadores/as da cidade. Precisamos ampliar e fortalecer essas relações até rompermos com esse sistema que é genocida”, finalizou.

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