As Empresas Transnacionais (ETNs) têm um papel central no processo de internacionalização e aplicação de medidas neoliberais em todo o planeta. As 200 ETNs mais importantes acumularam um 31% do PIB mundial em 1995 e suas vendas foram de 6 bilhões de dólares em 1999. As ETNs acumulam riqueza e poder através da acumulação por ‘despossessão’. A maior parte das ETNs se estabeleceram em países onde as pessoas trabalhadoras e a natureza são bastante desprotegidos, apoderando-se dos produtos do trabalho e dos bens comuns. Assim, grande parte de seus benefícios, ou sua totalidade, provem da riqueza espoliada em países do Sul. As ETNs têm atuado em contra os direitos dos povos, já que impedem que as pessoas se organizem de forma individual e coletiva, e possam desfrutar de um trabalho e uma vida digna. Como expressão viva do capitalismo, as ETNs somente veem o ser humano como consumidor, como fator de produção ou como desfeito prescindível. Como demonstraremos à continuação, as ETNs vulneram de forma sistemática os direitos de milhões de pessoas no mundo, sendo responsáveis pelo empobrecimento das mesmas.
No que se refere a Danos contra a vida, as ETNs são responsáveis de crimes contra a integridade física de líderes sociais e comunitários, repressão e criminalização das lutas sociais e resistências. Também atentam contra a saúde publica, por exemplo, ao obstaculizar o acesso aos povos do Brasil, Peru, Colômbia e Equador a fármacos genéricos, ou ao utilizar técnicas que prejudicam a saúde de suas trabalhadoras. As ETN são responsáveis pela contaminação por suas atividades na indústria extrativista e do impacto de grandes megaprojetos nos ecossistemas locais. As ETNs violam o direito de autodeterminação e à consulta dos povos indígenas quando, ao exercer suas atividades em seus territórios, não têm em conta a obrigação de realizar consultas aos povos afetados. Também operam em território roubado por um país ou outro, como no caso da Palestina, ou em ditaduras associadas às mesmas, como na Guiné Equatorial. As ETNs são responsáveis pelas condições econômicas, sociais e ambientais dos povos. Com a intenção de atrair investimentos das ETN, os governos de alguns países modificam as legislações laborais e ambientais existentes, ou criam zonas francas, livres de impostos e legislação. A exigência dos povos para melhorar suas condições laborais até “standards” mínimos comporta a repressão e ameaças por parte das empresas. Quando as ETNs abandonam o país, os impactos gerados permanecem e não são restituídos.
Por que tudo isso acontece com total impunidade? A historia de uma assimetria normativa a serviço das transnacionais, a construção da arquitetura da impunidade
Nos anos 70 se deu uma discussão sobre o acordo de algumas normas internacionais que regulassem as operações das empresas transnacionais. O Conselho Econômico e Social (ECOSOC) das Nações Unidas crio, em 1974, a Comissão de Sociedades Transnacionais que tinham como tarefas prioritárias, entre outras, investigar as atividades das transnacionais e elaborar um Código de Conduta para as mesmas, que nunca viu a luz. O ECOSOC também criou em 1974, o Centro de Sociedades Transnacionais. No ano de 1993-4, ambos organismos foram praticamente desmantelados. A criação do Global Compact, lançado em 1999 por Kofi Annan no Foro de Davos, com o objetivo de tecer uma “aliança criativa entre as Nações Unidas e o setor privado”, foi o respaldo internacional definitivo para dar por boa a filosofia da Responsabilidade Social Corporativa (RSC). Os direitos das ETNs se tutelam por um ordenamento jurídico global baseado em regras de comercio e investimentos cujas características são imperativas, coercitivas – sanções, multas, pressões diplomáticas e militares e executivas, enquanto que suas obrigações se remetem a ordenamentos nacionais submetidos à lógica neoliberal, a um Direito Internacional dos Direitos Humanos manifestamente frágil e à uma RSC voluntária, unilateral e sem exigibilidade jurídica.
Durante a criação da Corte Penal Internacional, a pressão das grandes potências econômicas determinou que se excluísse do Tratado de Roma de 1998, que aprovou o Estatuto para o estabelecimento dessa Corte, as violações aos direitos econômicos, sociais e culturais, os crimes ideológicos e também como sujeitos imputáveis às pessoas jurídicas. Depois de levar uma década assistindo à firma de múltiplos códigos de conduta e acordos voluntários, isso é, de colocar em marcha e desenvolver o paradigma da RSC, a realidade é que não tem parado de produzirem-se numerosas violações dos direitos humanos e impactos socioambientais nos quais, direta ou indiretamente, houvesse a participação das ETN.
Como se constrói a Lex Mercatoria? Ferramentas para a construção da assimetria
As empresas transnacionais detêm um poder econômico que convertem em poder político para a construção desse regime jurídico assimétrico chamado Lex Mercatoria. Dito regime assimétrico se constrói a partir da colocação em pratica de diferentes ferramentas como o Lobby: equipes integradas por advogados/as e expertos/as em diferentes temas, que trabalham ativamente para modelar as políticas estatais e internacionais em função dos interesses das ETN que representam; Revolving doors ouportas giratórias: entrada e saída de altos cargos entre os setores publico e privado, que geram sérios conflitos de interesses entre os objetivos que deve perseguir uma instância pública e democrática e os que persegue uma empresa multinacional cujo objetivo é a maximização de seus lucros; Diplomacia empresarial: todas aquelas ações de um governo através de seus diferentes representantes políticos e diplomáticos para o apoio à suas ETNs na resolução de conflitos com outros Estados; ou outros como Subornos e negócios com ditaduras, Alteração de processos eleitorais e golpes de estado, Criminalização do protesto e dos defensores de DDHH, Manipulação da informação através do poder de decisão do que se investiga nas Universidades.
CONTRAPODERES
Comunidades, movimentos e organizações ao redor do mundo vêm desenvolvendo estratégias e táticas para expulsar as transnacionais de seus territórios e construir o poder popular, algumas com mais êxitos, outras menos, de acordo com o momento e o contexto. Destacamos aqui algumas estratégias:
Tribunal Permanente dos Povos: tem por vocação o compromisso de dar visibilidade e qualificar em termos de direito todas aquelas situações nas quais a violação massiva dos direitos fundamentais da humanidade não encontra reconhecimento nem respostas institucionais, seja no âmbito nacional ou internacional.
Redes contra-hegemônicas: o exemplo de Enlazando Alternativas: a Rede Birregional Europa-América Latina e o Caribe ‘Enlazando Alternativas’ teve inicio em Guadalajara, México, em 2004, como reflexo da necessidade de incrementar as resistências por parte da sociedade civil latino-americana e europeia ao “projeto europeu”, à agenda Lisboa, e as empresas transnacionais com base na União Europeia e às políticas internacionais de “livre” comercio. Desde 2004, as redes, organizações e movimentos sociais e sindicais que participam da Rede Birregional articulam estratégias para paralisar as negociações de Tratados de Livre Comercio entre a União Europeia e America Latina e o Caribe, fortalecer as lutas contra as transnacionais europeias e aprofundar o processo de construção de propostas alternativas para uma integração solidaria, justa, sustentável e complementaria em função dos interesses dos povos.
Estratégias legais: o Direito oficial forma parte da estrutura hegemônica de dominação e somente poderá converter-se em veiculo contra-hegemônico desde sua subordinação até a ação política. Não obstante, a intervenção legal gera espaços de disputa e confrontação que pode permitir vitorias populares na extensa luta contra as classes dominantes e o sistema capitalista. As vitimas desses abusos e os movimentos sociais devem ser os verdadeiros protagonistas desses conflitos.
Boicote: as ETNs veem o boicote como um risco que deve evitar-se custe o que custar. As empresas reagem de diferentes formas ante o boicote, em função do calculo do risco sobre sua imagem corporativa: com campanhas de publicidade agressivas, buscando cooptar ao denunciante e em outros casos passam à ação com ameaças de denuncias jurídicas. O boicote nem sempre serve. Deve-se ter em consideração que existem setores como a indústria têxtil, no qual o boicote resultou no desemprego de trabalhadoras, sendo contraproducente para elas, já que longe de melhorar suas condições, as piora. Devemos buscar alternativas que nos permitam superar consequências deste tipo.
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Declaração ante o Conselho de Direitos Humanos em apoio à iniciativa de um grupo de Estados para a instituição de um instrumento legal vinculante sobre corporações transnacionais
Tradução: ADITAL
13 Setembro 2013
A atuação de muitas empresas transnacionais (ETNs) e de outras empresas causa devastação dos meios de vida, dos territórios e do ambiente das comunidades nos lugares onde operam; buscam a mercantilização de serviços essenciais e da própria natureza. Muitas empresas também violam ou são cúmplices de violações aos direitos humanos e trabalhistas; corroem as bases da soberania alimentar; contaminam as águas e a terra; e saqueiam os recursos naturais.
A Confer~encia Viena +20, com 140 participantes, realizou-se em Viena (Áustria), em junho deste ano para comemorar a II Conferência Mundial de Direitos Humanos e discutir os desafios atuais. A Conferência fez um chamado aos Estados para desenvolver e instituir com urgência um sistema vinculante de regulação e normas internacionais para as Empresas Transnacionais. Os Estados têm a obrigação de garantir, através do estabelecimento de um sistema legal forte, o controle de violações de direitos, remédio efetivo e justiça para as pessoas ou comunidades atingidas, incluindo toda a cadeia de provedores. A conferência urgiu aos Estados a responsabilizar esses atores transnacionais, ETNs e outras empresas que violam os direitos humanos. Por ocasião do recente fórum regional da ONU sobre direitos humanos e empresas, em Medellín, mais de 100 organizações da sociedade civil da América Latina e de outras regiões expressaram a mesma preocupação e fizeram um chamado por instrumentos legais vinculantes. Da mesma forma, durante a mesa redonda no Parlamento Europeu, realiza em Bruxelas, no dia 5 de setembro, solicitou-se com urgência aos governos a institucionalização de instrumentos vinculantes que deem conta das obrigações das ETNs e que detenham sua impunidade.
As organizações e movimentos sociais abaixo assinantes, damos as boas vindas e o nosso apoio à iniciativa do Equador e de outros Estados no Conselho de Direitos Humanos da ONU com vistas à instituição de um instrumento internacional legal vinculante, no marco do sistema das Nações Unidas, que ponha em evidência as obrigações das corporações transnacionais em matéria de direitos humanos, crimes econômicos e ecológicos e, em particular, em relação a abusos e violações aos mesmos; e promover o estabelecimento de mecanismos efetivos para remediar às vítimas e possibilitar o acesso das comunidades atingidas à justiça, nos casos em que não se resolvam em jurisidções nacionais.
ASSINAM:
FIAN International
Transnational Institute
Center of Concern
Friends of the Earth International (FoEI)
World March of Women
World Rainforest Movement – WRM
Food & Water Watch
Third World Network
CADTM International
World Forum for Alternatives
Global Social Justice
ETC Group
Transnational Migrant Platform International Federation for Human Rights (FIDH)
Amigos da Terra America Latina e Caribe (ATALC)
Food & Water Europe
Alianza Social Continental
Focus on the Global South
Comité de Mujeres de la Alianza Social Continental
Alliance of Progressive Labor (APL) – Philippines
Alyansa Tigil Mina (ATM) – Philippines
REDES – Uruguay
Polaris Institute – Canada
Red Mexicana de Acción frente al Libre Comercio
Ecuador Decide
Instituto Equit – Brasil
Justiça Global – Brasil
Hegoa Instituto de Estudios sobre Desarrollo y Cooperación Internacional
Friends of the Landless – Finland
ATTAC – Argentina
groundWork, Friends of the Earth – South Africa
AIDC – South Africa
Trust for Community Outreach and Education – South Africa
Democratic Left Front – South Africa
ATTAC Austria
Philippine Rural Reconstruction Movement
Centro de Documentación en Derechos Humanos “Segundo Montes Mozo S.J.” (CSMM) –
Ecuador
Entrepueblos del Estado Español
Fronteras Comunes de Canada
Ecologistas en Acción
Col·lectiu RETS: Respostes a les Transnacionals
War on Want
Economic Justice Network of FOCCISA (Fellowship of Christian Councils of Southern Africa)
Coordinación por los Derechos de los Pueblos Indígenas (CODPI) del Estado español
SHALIN – Finland
Latinamerikagrupperna (SAL) – Suecia
Attac France
ATTAC VLAANDEREN
Comité du Forum Social Lémanique, Geneva
Consumers Association of Penang, Malaysia
Friends of the Earth Malaysia
ATTAC Portugal
Colectivo Ecologista MadreSelva – Guatemala
Unión Sindical Obrera (USO) – España
Federación Unidad Ecologica Salvadoreña UNES
Amigos da Terra Brasil Council of Canadians
Colectivo Revuelta Verde de México
Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais
MiningWatch Canada/Alerta Minera Canadá
Indonesia for Global Justice (IGJ)
Asociacion Raxch’ och’ Oxlaju Aj (Tierra Verde 13 Aj) – Guatemala
ILSA – Instituto Latinoamericano por una sociedad y un derecho alternativos – Colombia
Campaña de Afectadas por Repsol
Ongd AFRICANDO – España
KASAPI HELLAS – Greece
ATTAC Spain
SOMO, Centre for Research on Multinationals from the Netherlands
Organic Agriculture Association – Albania
Centro Operacional de Vivienda y Poblamiento (Copevi) – México
Les Amis de la Terre France
FOCO – Foro Ciudadano de Participación – Argentina
Alianza Mexicana por la Autodeterminación de los Pueblos (AMAP)
Movimiento Social Nicaraguense Otro Mundo es Posible
Ingeniería Sin Fronteras Asturias
Observatorio de la Deuda en la Globalización (ODG)
Otros Mundos AC/Amigos de la Tierra México
Coordinadora Asturiana de ONGD – Spain
Centro de Documentación e Información Bolivia (CEDIB)
Monitoring Sustainability of Globalisation (MSN)
Ekologistak Martxan (Euskal Herria/Basque Country)
Ecosistemas de Chile
CADTM – AYNA
Both ENDS
KRuHA (People’s Coalition for the Rights to Water)
Kilusang Maralita sa Kanayuna (KILOS KA)
SOLdePaz.Pachakuti
Unión Universal Desarrollo Solidario
Democracy Center
Friends of the Earth – England, Wales and Northern Ireland
Red de Educación Popular entre Mujeres Latinoamerica y Caribe REPEM-LAC
Plataforma Interamericana de Derechos Humanos, Democracia y Desarrollo
Network for Transformative Social Protection in Asia (NTSP)
Red WIDE PLUS (Mujeres y desarrollo en Europa)
Coordinadora Andina de Organizaciones Indígenas – CAOI
Welthaus Diözese Graz-Seckau – Austria
VCÖ – Mobilität mit Zukunft – Austria
Center for Encounter and active Non-Violence – Austria
Centre for Sustainable Development (CENESTA) – Iran
Österreichische Liga für Menschenrechte – Austria Active Unemployed Austria
SÜDWIND – Austria
Housing and Land Rights Network India
Human Rights Foundation New Zealand
Frauensolidarität – Austria
Welthaus Wien – Austria
WIDE – Network for Women´s Rights and Feminist Perspectives in Development – Austria
KULU-Women and Development – Denmark
Sociedad Economica de Amigos del Pais – Cuba
Fresh Eyes – UK
FIAN Austria
ÖBV – La Via Campesina Austria
Global Initiative for Economic, Social and Cultural Rights
DECA Equipo Pueblo – México
Espacio DESC – capitulo mexicano PIDHDD – Mexico
Fonte: Adital.