Pautas que a mídia tentou abafar em 2017

Por Cíntia Alves.

Algumas pautas de política em 2017 renderiam um “troféu abafa” para jornais da grande mídia, dado o esforço que fizeram para encobertar ou dar o mínimo de destaque possível a alguns temas que “não vêm ao caso”. Sobrou à imprensa alternativa e àquela com um pézinho na gringa, a missão de explorar ou repercutir os assuntos espinhosos.

Aqui vai uma lista, sem ordem de relevância, com 10 tópicos que deram o que falar no mundo à margem da mídia comercial:

1 – O depoimento de Tacla Duran

Leitores disseram que se Rodrigo Tacla Duran se prestasse a relatar propina aos governos Dilma e Lula na CPI da JBS, a audiência com ele teria sido transmitida ao vivo na Globo News. Mas como as denúncias atingiam em cheio a indústria da delação criada pela República de Curitiba, os jornais trataram de empurrar as falas do advogado para debaixo do tapete. A cobertura foi vergonhosamente protocolar.

A acusação de Duran contra Carlos Zucolotto, amigo pessoal de Sergio Moro que foi acusado de cobrar propina para ajudar na delação, foi ignorada pelos jornais.

Os procuradores que adoram dar pitacos sobre a vida política do País nas redes sociais não foram incomodados nenhuma vez para explicar as denúncias.

O GGN e o DCM fizeram, juntos, uma série especial sobre a indústria da delação que explora as revelações de Duran. O mutirão pode ser acessado aqui.

2 – A Lavanderia Perrela

Tudo bem que Aécio Neves (PSDB) saiu chamuscado da crise envolvendo a mala de dinheiro que seu primo retirou na sede da JBS em São Paulo. Com fotos, vídeos e áudios, nenhum jornal conseguiu esconder a história.

Mas só quem teve a paciência de fuçar nos depoimentos que os envolvidos prestaram à Polícia Federal pôde descobrir que os investigadores suspeitam que empresa da família do senador Zezé Perrela teria sido usada para lavar a “propina” que Joesley Batista afirma ter pago a Aécio. Para complementar os serviços da lavanderia Perrela, um doleiro condenado por tráfico internacional de pedras preciosas teria sido acionado. Nenhum jornal quis mergulhar no assunto. O GGN abordou o caso, com base nos documentos da PF, aqui.

3 – Meirelles e a JBS

Ainda na esteira dos estragos provocados pela delação da JBS temos a blindagem oficial a Henrique Meirelles. Nem imprensa tradicional, nem Procuradoria Geral da República sob Rodrigo Janot ousaram incomodar o ministro da Fazenda, queridinho do mercado, potencial presidenciável em 2018.

Foi como se Joesley Batista jamais tivesse explicitado que um dos motivos para ter ido ao Jaburu conversar com Michel Temer na calada da noite foi justamente pedir autorização para pressionar Meirelles a trabalhar (ou deixar que trabalhassem) em prol dos interesses da JBS.

4 – Denúncias contra FHC

Quando o assunto é FHC, o manual de redação da Reuters de 2015 – aquele do “Podemos tirar, se achar melhor” – parece ainda estar em vigor.

Doação de empreitas ao instituto que leva seu nome, propina na Petrobras na época da crise energética, delação sobre empresa do filho ter sido contratada por indicação política, caixa 2 em campanha eleitoral. Nada parece despertar o interesse das autoridades.

A última blindagem do ano ao governo do tucano – Folha teve a pachorra de criar distinção entre PT e PSDB sob o ângulo de que o primeiro partido foi o que desviou mais recursos da estatal – foi registrado neste post aqui.

5 – Denúncias contra os tucanos paulistas

Na esteira da proteção ao tucanato estão os R$ 23 milhões desviados de obras públicas no governo Serra em São Paulo e os R$ 10 milhões para a campanha de Geraldo Alckmin.

Os casos foram divulgados sem reproduzir o alarde dos casos de corrupção que supostamente envolvem petistas. O tratamento diferenciado, inclusive, não parte apenas da imprensa. Quase não se viu procuradores alimentando os jornais com o vazamento de delações cabeludas e, no Judiciário, os processos tramitam com total discrição e até sigilo. É preciso vasculhar as colunas de política para encontrar notinhas sobre os casos.

6 – A farsa do aluguel de Lula

Longe de conseguir provar que Lula recebeu vantagem indevida da Odebrecht a partir de dinheiro desviado da Petrobras, envolvendo 8 contratos entre as partes, os procuradores de Curitiba lançaram mão da parceria que têm com a grande mídia para transformar a segunda ação penal contra o ex-presidente em Curitiba numa guerra de narrativas. Lula pagou ou não pagou o aluguel de um apartamento que pertence a Glaucos da Costamarques, primo de José Carlos Bumlai?

Como a Lava Jato sustenta que Glaucos recebeu indiretamente recursos da Odebrecht para gastar no apartamento (só faltou combinar uma cronologia lógica para os supostos fatos), é importante que a tese de que Lula não pagou o aluguel seja considerada verdadeira. Afinal, se não pagou, recebeu vantagem indevida.

O problema é que Glaucos muda a versão sobre o pagamento do aluguel ao sabor da conveniência.

E foi preciso encontrar em um documento da Receita Federal um motivo para a instabilidade nos depoimentos de Glaucos: sua família pode ter sofrido ameaças e, por isso, ele teria resolvido colaborar com a Lava Jato na condição de réu delator informal. O GGN foi o primeiro portal a levantar a hipótese, a partir da análise dos documentos da Lava Jato.

7 – A delação da JBS contra Dilma e Lula

O blog também foi o primeiro a questionar algumas lacunas na delação da JBS contra Lula e Dilma, e publicou um texto explicando porque as acusações de Joesley Batista e outros executivos contra os ex-presidente petistas não pareciam tão substanciais como os eventos colhidos contra Michel Temer e sua turma.

Meses depois, a jornalista Mônica Bergamo foi a única a enfatizar em sua coluna na Folha que as suspeitas sobre a fragilidade da delação eram reais e a história de que Lula e Dilma tinham uma conta no exterior com centenas de milhões de dólares começou a ruir.

Na hora de apresentar provas da delação, Joesley deixou transparecer que ele era a única pessoa com acesso às contas e, além disso, usou os recursos que lá existiam para comprar um apartamento em Nova York, bancar sua festa de casamento e custear outras despesas luxuosas.

8 – A delação de depoimento de Delcídio

Usada para empurrar o governo Dilma ladeira abaixo, a delação de Delcídio do Amaral contra a presidente deposta e o ex-presidente Lula também se provou uma farsa. Desde meados de 2016, este blog também vinha mostrando os sinais de que o senador cassado parecia ter criado uma fantasia para se livrar da cadeia.

Em setembro de 2017, o procurador Ivan Cláudio Marx, responsável pela ação penal contra Lula derivada da delação de Delcídio, teve de reconhecer que não existem provas de nada do que foi dito sobre a suposta participação do petista na compra do silêncio de Cerveró. A revelação passou longe de ser discutida sob os holofotes da grande mídia.

9 – Propina da Globo

Por motivos óbvios, o escândalo conhecido como Fifa Gate não é a pauta preferida do Jornal Nacional e demais produtos Globo. Alguns blogs esportivos de veículos concorrentes produziram informações sobre as acusações de Alejandro Buzarco contra a emissora, por pagamento de propina na compra dos direitos de transmissão de torneios esportivos.

O GGN cobriu o caso e até comprovou que um ex-diretor da Globo, Marcelo Campos Pinto, peça fundamental na investigação, tentou esconder que era uma espécie da agente duplo com cargo na FIFA. O episódio é mais um a revelar obstáculos não apenas da mídia brasileira, mas também no Judiciário.

10 – Tráfico internacional de crianças pela Igreja Universal 

Da mesma forma, a investigação internacional sobre o suposto tráfico internacional de crianças criado a partir de Lisboa pela cúpula da Igreja Universal – envolvendo diretamente a família de Edir Macedo, dono da Record – só chegou em terras tupiniquins por meio de poucos portais que repercutiram a reportagem especial de uma TV portuguesa.

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