Paralimpíada é um troço errado

VoguePor Lucas de Abreu Maia.

Paralimpíada é um troço tão errado, mas tão errado, que eu até hesitei antes de postar sobre o assunto. Mas a capa da Vogue deste mês resume todos os problemas e me dá a oportunidade de explicar porque detesto esse evento. Senta que lá vem problematização (mas é problematização importante, juro).

Em 2007, fui convidado para ser repórter no Parapan. Aceitei porque era um moleque inseguro de 21 anos, louco para ter uma experiência jornalística real. Mas aceitei cheio de receios. Não tava fazendo faculdade de jornalismo para virar repórter sobre deficiência, ou para pessoas com deficiência. Queria ser um repórter com deficiência, ponto. Isso não deveria dizer nada sobre a qualidade ou o foco do meu trabalho. Durante a cobertura, todos os meus receios se confirmaram. Na redação, fui usado como uma espécie de mascote deficiente para um evento de deficientes.

É esse o problema do paraesporte – a ideia de que exista um troço para deficientes. No caso da paralimpíada, cria-se uma competição de segunda classe, com ingressos a preços ridículos, porque ninguém quer pagar caro para assistir um evento de segunda classe. A mensagem é uma só: os atletas são de segunda classe. Enquanto isso, pessoas sem deficiência sentam-se em seus sofás e permitem que os olhos encham-se d’água com as histórias de superação que assistem no Jornal Nacional.

Mascara-se o fato de que pessoas com e sem deficiência podem perfeitamente concorrer em pé de igualdade em vários esportes. Não vejo porque uma pessoa cega bem treinada ficaria prejudicada na natação. ou no judô. Meu amigo Luiz Alberto Carvalho me conta que pessoas cegas sempre competiram perfeitamente na prova de adestramento. Já houve ginasta sem uma perna competindo nas olimpíadas.

O esporte é, por definição, um estímulo às diferenças biológicas entre pessoas. Michael Phelps só é Michael Phelps porque tem pulmões anormalmente grandes. Os maiores maratonistas do mundo têm, invariavelmente, uma proporção maior de hemácias no sangue. Por que diferenças mais visíveis não podem também ser celebradas nas olimpíadas? Claro que vários esportes exigem adaptações para que pessoas com deficiência possam neles competir. Exemplos clássicos são vôlei ou basquete em cadeira-de-rodas. A solução, no entanto, é óbvia: esses esportes devem ser incluídos nos jogos olímpicos como disciplinas específicas, em que pessoas com ou sem deficiência possam competir juntas, conforme vi sugerido pela primeira vez pelo próprio Luiz Alberto.

A paraolimpíada é um evento segregado. Trata pessoas com deficiência como merecedoras de admiração primariamente por conta da deficiência. A capa da Vogue ilustra bem isso. Não importa quem são esses atletas. Só o que importa são suas deficiências, a ponto de que seus corpos podem ser anexados aos rostos de celebridades.

Em 2006, lembro-me de ler sobre os jogos gays em Chicago em sites especializados. Em 2016, a notícia era o número grande de atletas abertamente gays nas Olimpíadas. É um sinal da falta de visibilidade dos deficientes que ainda seja considerado um avanço um evento feito para excluir, em vez de integrar.

Fonte: https://www.facebook.com/labreumaia?hc_ref=NEWSFEED&fref=nf

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