Para que servem os direitos humanos?

dhPor Viegas Fernandes da Costa.

Para que servem os direitos humanos, afinal? É uma pergunta importante, não duvide. Uma pergunta importantíssima! Há quem ache, por exemplo, que só servem para proteger bandidos. Sei que não é o seu caso, querido leitor, querida leitora, pessoa inteligente que é, pensar uma aberração desta. Mas sabemos, há muitos por aí que consideram os direitos humanos uma invencionice de almofadinhas franceses do século XVIII, cuja única serventia seria atravancar a verdadeira justiça, aquela, guiada pelo ódio nosso de cada dia, pelo desejo de vingança. E não pense o senhor, a senhora, que se trata apenas de gente de pouco estudo, de pouco lustro. Outro dia mesmo vi uma moça de fino trato tentando justificar a barbárie em rede nacional. Consta que a moça é pessoa diplomada. Da mesma forma, chove apresentador de televisão e de rádio vociferando contra os “vagabundos”, banalizando a violência, o dedo direito em riste, a mão esquerda sobre a Bíblia. A população abduzida gritando “sim”. Daí para as foices e fogueiras é um pulo.

Fabiane Maria de Jesus tinha 33 anos. Consta dos relatos bíblicos que esta era, vejam só, a idade doutro Jesus, também crucificado. Porque o linchamento de Fabiane foi, claro que foi, uma crucificação. Lá na Roma antiga, quando o povo só não jogava privadas sobre os gladiadores, porque privadas ainda não existiam, Pilatos lavou as mãos, e deu ao povo o destino daquele homem que se dizia filho de Deus. O povo disse, “mata-o!” E assim se fez, com requintes de crueldade, como no caso de Fabiane, que não foi o primeiro, que não será o último. O Estado lavando as mãos.

O senhor, a senhora, viu as cenas? Se ainda não viu, veja! Veja até passar mal, até sentir náuseas. Ocorre que a mulher era inocente, mãe de dois filhos, o mais novo com um ano de idade. Mas ainda que fosse culpada, nada justifica a brutalidade, o furor, a ignorância da turba de assassinos do Guarujá. Deles e de seus cúmplices, aqueles que pregam ódio e violência, que separam a humanidade entre os do bem e do mal, que propagam informações falsas, espalham boatos, atiram a primeira pedra. Como o senhor, a senhora, como eu, suspeito que Fabiane jamais imaginou que morreria desta forma, que seria confundida com uma sequestradora de crianças ofertadas à magia  negra, criada na imaginação mórbida das pessoas. Hoje foi ela, e amanhã? Qual esposa, marido, filho ou amigo os justiceiros crucificarão?

Ao ver as cenas do linchamento de uma inocente em Guarujá, promovido por cidadãos de bem, tenho certeza: os direitos humanos foram criados para nos salvar de nós mesmos.

* Viegas Fernandes da Costa é historiador e professor do Instituto Federal de Santa Catarina. Este texto foi publicado no Jornal de Santa Catarina em 08/05/2014. Encaminhado por Urda Alice Klueger.

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