A decisão provocou a indignação das organizações de defesa do meio ambiente e do partido Europa Ecologia, que consideraram o anúncio “inaceitável”.
“O governo pode decidir que não quer proteger mais a água, a terra, a biodiversidade e até mesmo a nossa saúde. Mas nossos agricultores não vão lucrar mais por isso”, reagiu a líder do partido ecologista “Os Verdes”, Marine Tondelier.
Para Marie Toussaint, que encabeça a lista do partido nas eleições europeias, a suspensão do plano Ecophyto “é um retrocesso inaceitável”. Segundo ela, “o governo acaba de dar um presente envenenado para o mundo agrícola e escolheu o caminho da hipocrisia e da ambiguidade. A reformulação do nosso modelo agrícola não é possível se nossa agricultura continuar dependente de substâncias tóxicas”, escreveu na rede X.
O primeiro-ministro francês, Gabriel Attal, anunciou nesta quinta-feira que o plano de redução de agrotóxicos será suspenso até a implementação de um novo indicador para medir o uso das moléculas pelos agricultores. O indicador atual é contestado pelas organizações agrícolas.
Em reação às declarações dos ecologistas, a porta-voz do governo, Prisca Thevenot, disse nesta sexta-feira (2) que os planos para reduzir os pesticidas são “ineficazes” há 15 anos. Ela justificou a “pausa” do plano Ecophyto pelo desejo de “sair da ecologia punitiva”.
De acordo com Thevenot, os planos postos em prática desde 2009, “não ofereceram qualquer solução para apoiar os agricultores“. O governo trabalha no plano Ecophyto 2030, mas precisa de mais tempo para garantir que ele será compreendido, acrescentou.
“Precisamos passar da ecologia punitiva para uma ecologia de soluções”, insistiu a porta-voz do governo, sublinhando que “os primeiros interessados no abandono desses produtos são os próprios agricultores”.
“Precisamos ser capazes de apoiá-los, é também por isso que estamos investindo em soluções alternativas”, continuou, dizendo que o Executivo “continua tendo ambições para a ecologia, mas essa ecologia tem de estar calcada na realidade”, acrescentou. “Sacrificar o meio ambiente e ignorar os problemas reais significa prejudicar ainda mais o setor agrícola”, avalia o eurodeputado David Cormand.
A deputada Sandrine Rousseau, do partido “Os Verdes”, lembrou que o plano Ecophyto visa reduzir os agrotóxicos e a resposta do governo ao problema da renda agrícola “é dramática para a nossa saúde e para a biodiversidade”.
“O apoio aos agricultores não pode ser feito à custa da saúde pública”, acrescentou Julien Bayou, do mesmo partido. A deputada Marie-Charlotte Garina sublinhou ainda que os agricultores são “as primeiras vítimas dos pesticidas”.
Decisões europeias
Para colocar um fim aos bloqueios dos agricultores europeus, a Comissão Europeia prometeu, nesta quinta-feira (1), a adoção de medidas para defender os “legítimos interesses” da categoria na UE, “assegurando condições mais equilibradas” ou reduzindo a “carga administrativa” da Política Agrícola Comum (PAC).
O presidente francês, Emmanuel Macron, que participou de uma reunião da UE em Bruxelas dedicada à ajuda à Ucrânia, pediu a instauração de uma “força europeia de controle sanitário e agrícola” e instou a UE a fazer mais para “proteger” os rendimentos dos agricultores.
Paris também deu garantias ao setor ao reiterar sua oposição à assinatura do polêmico acordo de livre comércio que a Comissão está negociando atualmente com os países sul-americanos do Mercosul, incluindo Brasil e Argentina.
Este tratado não será “concluído às pressas, como alguns ameaçaram fazer”, disse Macron, que também anunciou que a UE introduzirá controles sobre as importações de grãos ucranianos para evitar distorções da concorrência.
Bloqueios isolados continuam
Na noite de quinta-feira, em vários departamentos, os bloqueios dos agricultores diminuíram ou foram suspensos, mas alguns protestos isolados foram mantidos.
Os cerca de 150 tratores que partiram do sudoeste da França para manifestar em frente ao mercado internacional de Rungis, no sul de Paris, voltaram diante da mobilização da polícia, que bloqueou a passagem com veículos blindados.
“Não conseguimos o que queríamos, mas na frente de tanques, não temos opção. Ou os empurramos e vamos para o confronto, e não vamos fazer isso, ou mantemos a calma e voltamos”, disse José Perez, copresidente da Coordenação Rural, um dos sindicatos que participou da manifestação.