Por Véronique Gaymard, enviada especial da RFI à Kinshasa.
O avião com o pontífice decolou de Roma às 8h28 (4h28 de Brasília) e pousou cerca de seis horas e meia depois no aeroporto de Kinshasa, a capital do maior país católico do continente.
Quando o avião sobrevoava o deserto do Saara, Francisco fez uma “oração por todas as pessoas que buscam um pouco de bem-estar, um pouco de liberdade” ao fugir de seus países, com a esperança de chegar à Europa. “Chegam ao Mediterrâneo depois de terem atravessado o deserto e vão parar em campos onde sofrem”, destacou.
Desde a manhã, uma multidão aguardava o santo padre no aeroporto internacional de Kinshasa. A expectativa é grande no país de 110 milhões de habitantes, onde 40% da população é católica. Apesar deste domínio local do Vaticano, igrejas evangélicas tentam ganhar espaço no país.
A República Democrática do Congo também é uma nação rica em biodiversidade e minerais, especialmente o leste, o que incita disputas de grupos armados, com tensões que se acirraram ainda mais nos últimos dias.
Cenário de riquezas naturais e conflito armado
Em entrevista à RFI, Henri Muhiya, diretor da comissão episcopal para os recursos naturais da Conferência Episcopal Nacional do Congo (Cenco), explicou o cenário que o sumo pontífice encontrará no país. “Ao lado dos recursos naturais, como a floresta, há a questão das energias limpas, que requerem uma certa quantidade de minerais que o país possui. Temos cobalto e cobre, no sudeste, mas também temos lítio que não começou a ser explorado”, diz.
“Quando você vai mais ao norte, onde a guerra está agora, você tem coltan, cassiterita, mas também terras raras, especialmente onde está o grupo armado M23 atualmente. Então as pessoas se perguntam: vamos pedir que a República Democrática do Congo entregue esses recursos no momento em que as populações congolesas estão morrendo nesses conflitos? Essa é a situação que o papa encontra aqui. Esperamos que sua mensagem possa desafiar os governantes do mundo”, reitera o religioso.
Nesta viagem, que estava prevista para ocorrer em julho, o papa deveria ir até Goma, onde o movimento M23 multiplica suas ofensivas. Por razões de segurança, essa etapa da visita foi excluída, o que entristeceu a população local que vive essas violências. No entanto, o sumo pontífice receberá uma delegação de cerca de 60 vítimas deslocadas e deve fazer um apelo em prol do fim do conflito.
A chegada de Francisco ocorre a alguns meses da eleição presidencial, por isso também espera-se que ele rogue por uma boa organização da votação marcada para dezembro. Afinal, o santo padre se envolve intensamente nos direitos sociais e políticos, um comportamento que encontra eco na Cenco.
Mensagem de paz e reconciliação
Os congoleses esperam sobretudo uma mensagem de paz e reconciliação, de acordo com o presidente da Conferência Episcopal do Congo, Marcel Utembi. Segundo ele, o sumo pontífice é extremamente sensível ao que ocorre no país. “Ele lança mensagens de compaixão, solidariedade e sente uma necessidade de denunciar todos esses crimes na região. Pensamos que o papa, como peregrino da paz, terá certamente uma mensagem de interpelação, para denunciar o mal, as violências e convocar as diferentes partes do conflito a se compreenderem”, afirma.
A expectativa também pode ser sentida entre os jovens. Com uma situação econômica precária para a maior parte da população de Kinshasa, a juventude congolesa espera que a mensagem do papa tenha impacto sobre os governantes.
“A vida é difícil, antes não era assim”, resume o comerciante ambulante André. “Agora temos que lutar para sobreviver. Parei de ir para a universidade, espero voltar a estudar no ano que vem. Estou me organizando para poupar dinheiro porque preciso pagar os gastos da universidade, transportes, comida, é preciso calcular tudo. Como o papa vem nos ajudar, nos motivar, falar com os jovens, esperamos que algo mude. Queremos empregos”, desabafa.
A professora Miriam compartilha a mesma ideia e deposita suas esperanças nesta passagem do santo padre pelo país. “Ele vem trazer uma grande mensagem de reconciliação, de paz, de reconforto, porque nada funciona aqui. O papa vem nos apoiar”, diz.
Um dos grandes momentos da visita do religioso à República Democrática do Congo será a missa no aeroporto Ndolo, onde mais de um milhão de pessoas são esperadas: uma demonstração do peso considerável da igreja católica no país.