‘Panama Papers’: 7 respostas para entender o que é uma offshore e por que ela prejudica a economia

Por Luís Eduardo Gomes.

Neste domingo (3) começou a ser revelado um dos maiores casos de vazamentos de dados sigilosos da história, que joga luz sobre uma as questões mais obscuras do sistema financeiro mundial, a criação de empresas offshore por detentores de grandes fortunas para que possam pagar menos impostos e/ou praticar o crime de lavagem de dinheiro.

O Panama Papers consiste no vazamento de 11,5 milhões de documentos da empresa Mossack Fonseca por uma fonte anônima para o jornal alemão Süffeutsche Zeitung, que compartilhou com o International Consortium of Investigative Journalists (ICIJ). Esta organização, por sua vez, distribuiu os dados entre uma rede de parceiros internacionais, que inclui jornalistas brasileiros do Estado de S. Paulo, Uol, RedeTV, entre outros.

Este vazamento é de grande importância porque a Mossack Fonseca é considerada a quarta maior provedora de serviços de offshore e tem negócios com mais de 300 mil empresas. Entre os nomes envolvidos estão líderes de Estado, como o presidente russo, Vladimir Putin, e o presidente argentino, Mauricio Macri. Segundo o jornal espanhol El País, no vazamento, há 57 brasileiros envolvidos com lavagem de dinheiro, entre eles o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o ex-deputado federal João Lyra (PTB-AL) e o ex-ministro de Minas e Energia Edison Lobão (PMDB-MA).

Confira a seguir sete perguntas e respostas para entender o caso.

1) O que é uma offshore?

Segundo o economista André Scherer, que atua na Fundação de Economia e Estatística (FEE-RS) e no Ministério do Planejamento, a offshore é uma empresa aberta fora do domicílio fiscal do proprietário. “Qualquer empresa aberta em outro lugar a gente pode chamar de offshore“, afirma.

2) Por que abrir uma offshore?

Scherer afirma que há dois motivos principais para se abrir uma offshore. O primeiro é obter vantagens financeiras e tributárias. “Em geral, uma empresa que tem fins produtivos abriria uma filial para atuar no exterior. A offshore é uma empresa que tem fins financeiros e tributários. O fim dessa empresa é realizar operações financeiras onde exista menor tributação”, explica.

O segundo é o sigilo que os países considerados paraísos fiscais impõe sobre a propriedade das offshores. “Em realidade, o que se busca é esconder recursos, mais do que qualquer coisa. Se fosse feito um pedido ao governo do Panamá sobre os proprietários dessas empresas, obviamente ele não responderia. Há dificuldade de se acessar os dados, por isso o vazamento é importante”, diz o economista. “Então, tu faz uma teia de empresas para iludir o fisco ou esconder atividades ilegais, como é o caso de corrupção, por exemplo.

3) Quando ela é legal?

Apesar de facilitar a evasão fiscal, abrir uma offshore não é considerado ilegal, nem no Brasil. “Quando ela é legal? é legal quando a pessoa (ou a empresa) que tem essa offshore declara isso em seu imposto de renda, as movimentações dessa offshore. O que é bastante raro”, pondera Scherer.

No entanto, o fato de ser legal não significa que o objetivo não seja usar de um estratagema tributário para pagar menos imposto com a anuência do poder público. “Existem buracos no sistema tributário nos países”, afirma Scherer. “Esses buracos são mais ou menos intencionais, porque são funcionais ao sistema financeiro, à dominação financeira que caracteriza o sistema mundial”.

Segundo Scherer, a prática de abrir offshores é muito utilizado por grandes empresas para facilitar movimentações financeiras. “As empresa muitas vezes agem legalmente, colocam tudo isso dentro das suas movimentações, de alguma forma. Todas as grandes empresas têm muitas offshores. Empresas como a Nike têm de 4 mil a 5 mil offshores. A maioria são simplesmente caixas postais. São empresas ocas. Elas só existem legalmente no sentido de facilitar essas transações para não pagar imposto”, afirma.

4) Quando é ilegal?

Toda a vez que uma pessoa ou uma empresa abre uma offshore e não declara ao fisco local. “Não tendo declarado no imposto de renda e sendo beneficiário da movimentação desses recursos, é sonegação de impostos. São rendas que são auferidas e que não foram objeto de declaração”, afirma Scherer.

No entanto, além da sonegação de impostos, offshores também são utilizadas ilegalmente para esconder dinheiro oriundo de fontes ilícitas. “Nos paraísos fiscais, tu mistura o dinheiro legal com o dinheiro ilegal, do tráfico de drogas, corrupção, venda de armas, etc”, afirma.

Um grande problema decorrente da utilização dos paraísos fiscais é que o dinheiro depositado lá muitas vezes retorna para o país de origem dos proprietários “lavados” por bancos. “Os bancos não querem saber a origem. No caso da Mossack, tem até dinheiro de tráfico sexual. É tudo misturado”, diz Scherer.

5) O que é um paraíso fiscal?

Paraísos fiscais são países que oferecem vantagens financeiras para “hospedar” o dinheiro oriundo de outros países. Em geral, refere-se a países como o próprio Panamá, ilhas caribenhas, mas também incluem países como a Suíça e até o Uruguai. Além disso, há casos em que países são paraísos fiscais para determinados segmentos da atividade econômica.

“Um caso muito conhecido é um esquema holandês, onde a empresa não paga por propriedade intelectual. Tudo que é auferido por propriedade intelectual é isento de imposto. Então, as empresas europeias transferem recurso a título de propriedade intelectual para a Holanda e de lá esses recursos vão para paraísos fiscais”, afirma o economista. “Por exemplo, eu tive um lucro de 1 bilhão com a minha atividade na Inglaterra, eu transfiro metade disso a titulo de propriedade intelectual para a Holanda, onde não tem nenhuma tributação. Eu paguei para a Holanda 500 milhões que não vão ser tributados, diminuo meu lucro na Inglaterra e, quando eu vou pagar o imposto sobre o lucro, é só sobre o que restou”.

O resultado disso é a queda de arrecadação nos países de origem. “Quem se prejudica: o estado inglês, o estado alemão, é um esquema que vai enfraquecendo o país”.

6) Como se combate os paraísos fiscais?

Apesar de ser um problema que está intimamente ligado ao sistema financeiro mundial, Scherer acredita que seria possível combater a existência de paraísos fiscais, mas seria necessário uma “concertação internacional”, o que ele acredita que começa a dar sinais de que está ocorrendo. “Por exemplo, há uma concertação dos países desenvolvidos de que vai dar um prazo para trazer dinheiro de volta – porque ninguém fica com dinheiro lá para não trazer de volta nunca – e quem tiver dinheiro nos paraísos fiscais, tem dois, três meses para trazer e vai pagar 30%, 40%, 50% de imposto”, afirma. “A pergunta é: isso interessa aos grandes bancos e às grandes empresas?”.

7) Por que é importante combatê-los?

Scherer explica que a principal vantagem de se acabar com os paraísos fiscais seria, além de aumentar a arrecadação dos países, acabar com a opção dos detentores de grandes fortunas de manter sua riqueza em outros países e no sistema financeiro em vez de investir em produção, em atividades que, por exemplo, geram empregos.

“Essa questão dos paraísos fiscais é uma questão que faz parte do processo de dominação financeira sobre a atividade produtiva. Se tu tirar os paraísos fiscais, o financeiro perde muito em relação à vantagem que ele tem sobre a questão do investimento produtivo. É um jeito de tu ajudar a economia e os investimentos a se voltarem mais para o produtivo”, aponta.

Fonte: Sul21

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