Por Rafael Tatemoto.
O relatório do Projeto de Lei (PL) nº 6299 de 2002 – apelidado pelos seus críticos de ‘Pacote do Veneno’ – será votado na Comissão Especial da Câmara nesta terça-feira (7). O texto do PL, de autoria do então senador Blairo Maggi (PP-MT), atual Ministro da Agricultura, pretende flexibilizar o processo de liberação de novos agrotóxicos no Brasil ou de seu uso em novos tipos de plantio.
A primeira das mudanças trazidas pelo Projeto é em relação à própria palavra agrotóxico – expressão consagrada na Constituição Federal. A alteração seria para “produto fitosanitário”. Para Carla Bueno, engenheira agrônoma e integrante da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e em Defesa da Vida, a mudança busca suavizar os efeitos políticos e simbólicos da palavra, já que há uma convicção cada vez mais ampla na sociedade contra esse tipo de substância.
Em relação ao processo de liberação, há três importantes mudanças no bojo do PL. A primeira delas é a criação da distinção entre riscos aceitáveis e inaceitáveis. Ou seja, as substâncias que apresentem o primeiro tipo de risco em poderão ser liberadas. Bueno, entretanto, contesta essa divisão, principalmente por conta do aumento do número de casos de doenças cancerígenas no Brasil.
“Quem vai dizer o que é aceitável ou inaceitável dentro do nosso organismo em relação a substâncias cancerígenas? Isso é muito grave. Os dados dizem que 80% dos casos de câncer tem como causa principal a forma de vida, e a questão do alimento está inserida nisso. Isso sem considerar outros tipos de doença”, diz.
Decisões
A segunda alteração é justamente quem irá determinar as novas liberações. Atualmente, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) são parte do processo e podem vetar certas substâncias, considerando questões relativas ao ambiente e à saúde humana, respectivamente. Caso o PL seja aprovado, esse percurso muda. O ex-presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara, o deputado federal Nilto Tatto (PT-SP), crítica esta alteração.
“Nesse novo projeto só vai haver o processo de consulta a esses dois órgãos, deixando tudo centralizado no Ministério da Agricultura. E todos sabem que, historicamente, o Ministério é dominado pela bancada ruralista. Eles querem criar uma ambiente de aprovação rápida para a utilização de novos agrotóxicos”, afirma.
Em outra frente, o PL também retira a competência legislativa de estados e municípios sobre o tema. Hoje, um agrotóxico liberado nacionalmente pode ser vetado localmente nessas instâncias. Os critérios de avaliação também poderão ser alterados, ou, como coloca Tatto, praticamente invertidos.
“Hoje, há o critério de que se há países onde está proibido determinado agrotóxico, automaticamente, aqui passa por um crivo mais sério. Eles estão mudando isso para estipular que se determinado agrotóxico é utilizado em pelos menos três países no âmbito da OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico], automaticamente ele pode ser liberado”, pontua.
Ao PL nº 6299 foram apensados, ou seja, juntados diversos outros projetos sobre o mesmo tema. Seus defensores, majoritariamente da bancada ruralista, conseguiram criar uma Comissão Especial para sua discussão. Isso significa um rito para aprovação diferenciado, não sendo necessária a apreciação por comissões como a de Constituição e Justiça ou de Meio Ambiente. Caso o relatório do PL, a cargo do deputado federal Luiz Nishimori (PP-PR), seja aprovado, a matéria irá, portanto, automaticamente para o Plenário da Câmara.
A reportagem tentou contato com Blairo Maggi, mas não teve sucesso. O Brasil de Fato também enviou questionamentos a Nishimori, que não retornou a mensagem.