Por Roberto Liebgott, Cimi Sul-Equipe Porto Alegre.
Autoridades, especialmente municipais, questionam, seguidas vezes, a presença de indígenas nos contextos urbanos.
Os tratam como pessoas fora de lugar, ou seja, nos seus imaginários, eles estão entre aqueles que deveriam viver nas matas amazônicas, longe do ambiente “urbanizado”. Tratam as pessoas como estorvos, forasteiros a serem expurgados.
Desconsideram que há direitos individuais e coletivos previstos para os povos indígenas na Constituição Federal de 1988 e que estão expressos nos artigos 231 e 232. Lá são reconhecidos às pessoas, às comunidades e povos como sujeitos de direitos, garantindo o necessário respeito às culturas, crenças, costumes, línguas e tradições.
E há, nas normas constitucionais, a previsão de que as políticas públicas, independente da localização dos indígenas, sejam executas de formas diferenciadas e, mais que isso, que se assegure o direito fundamental à terra.
O arcabouço jurídico dos povos se estende para os direitos à subsistência, à autonomia e ao seu protagonismo em qualquer ambiente onde eles estejam, independentemente se em terras demarcadas ou em comunidades urbanas, ou nas universidades, escolas, avenidas, calçadões.
Entende-se, portanto, que os indígenas, que vivem nos contextos urbanos, têm garantidos seus direitos fundamentais à livre locomoção, de se manifestarem conforme suas formas próprias de ser e viver, bem como aqueles – direitos – que foram sendo consagrados ao longo dos anos, a exemplo da ocupação de lugares nos quais se exercem as atividades culturais, religiosas, políticas, sociais ou econômicas.
Os direitos indigenas estão alicerçados na Constituição Federal, mas também em regras, ofícios, despachos, portarias, decretos ou outros acordos – escritos ou falados – entre gestores públicos, comunidades e suas lideranças, nos momentos em que se previam e destinavam-se espaços nas cidades ou nas praias para que as famílias pudessem comercializar seus produtos culturais, artesanais ou não, mas que compõem as lógicas e as necessidades de manutenção da vida das pessoas.
No caso específico de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, as lutas indígenas dos Kaingang, Mbya Guarani, Charrua e Xokleng são históricas, foram décadas de negociações e acordos com as administrações municipais.
Nos gabinetes, secretarias e fóruns onde ocorriam os debates, os acordos e negociações, se viabilizou e, portanto, se efetivou a possibilidade de que os indígenas pudessem habitar parcelas de áreas que compõem seus territórios originarios, bem como conviver, relacionar-se e comercializar seus produtos nos ambientes das cidades, nos parques e nas feiras.
Essas relações de diálogos, reflexões e reivindicações constituem-se, na atualidade, em conquistas políticas e jurídicas, consolidando o que se pode denominar, no Direito, como garantias perenes, portanto, tornaram-se direitos adquiridos.
Porto Alagre, 29 de março de 2022.