Os netos de Emiliano Zapata revoltavam-se contra as imposições do Estado mexicano à realidade própria dos indígenas, rejeitavam a submissão económica aos vizinhos do norte e exigiam uma democracia participativa. Caminhavam em sentido contrário àqueles que do outro lado do Atlântico pouca ou nenhuma oposição levantavam à construção de uma Europa submetida ao directório político e económico das grandes potências. Estes estavam contaminados por Malinche.
A canção eternizada por Amparo Ochoa, Maldición de Malinche, fala dos que em pleno século XX humilham o nativo e abrem os braços ao estrangeiro.
A esquerda europeísta
Em nome de um suposto internacionalismo, há quem na blogosfera cuspa que os que lutam contra a União Europeia e o euro não estão mais do que contaminados pela deriva nacionalista e que servem – ainda que não o saibam – um futuro nacional-socialismo. Estes, que se atrevem a pôr em causa a luta anti-imperialista de outros povos, como por exemplo, o papel de Hugo Chávez na construção de uma alternativa política na América Latina, não fazem mais do que reforçar o projeto das grandes potências capitalistas. Defender a União Europeia a toda o custo é defender um instrumento que não teve e não tem outro objectivo que o de garantir e reforçar o poder político e económico das potências do norte da Europa.Não se trata aqui de defender uma guerra entre o norte e o sul. Trata-se de defender a luta dos trabalhadores do sul pela defesa da sua soberania económica e política. Os destinos dos que trabalham em Portugal devem ser determinados por eles próprios. Não devem ser determinados pela burguesia portuguesa e muito menos pela alemã. Também os destinos dos que trabalham na Alemanha devem ser determinados por eles próprios. Senão for assim continuaremos a ser colonizados por uma estrutura que tem sido o eixo central da desgraça que nos acompanha há três décadas.Há gente que diz: pois, bem, então, que se juntem os povos e que tomem o poder na União Europeia. Esta é a perspectiva clássica dos que acham que enquanto não estivermos todos em condições de fazer a revolução e de conquistar o socialismo devemos esperar. Ou seja, devem esperar por um conjunto de condições que muito dificilmente se darão simultâneamente entre tantos povos com características, histórias, condições objectivas e subjectivas, em cada momento, distintos.Os sábios europeístas acham que só quando todos marcharmos juntos é que podemos partir para a revolução, mesmo que alguns já as venham a ter antes de outros e mesmo que esses acabem por perder a oportunidade de pôr fim à miséria porque outros não o puderam fazer.
Estes são os que idolatram tudo o que vem de fora. Rejeitam soluções nacionais em nome de um continente sem fronteiras ao mesmo tempo que submetem cada povo a uma lógica supranacional de luta que parte do topo para a base. É esta a maldição de Malinche de um género que se diz de esquerda e que se sente superior em relação aos trabalhadores e aos povos. Que pertence às ideias mais em voga na esquerda moderna europeia – tão velhas como o eurocomunismo – e que esquece que está colonizado por correntes políticas que são alimentadas e toleradas pela ideologia dominante. A ingenuidade tem limites e da mesma forma que as fronteiras da União Europeia não foram derrubadas para beneficiar os trabalhadores também a luta pela libertação económica e política de cada povo não serve os interesses do capital.
Durante a longa noite fascista, havia quem entendesse que Portugal só se libertaria do jugo salazarista depois da queda do franquismo. Ficava nas mãos dos povos oprimidos por Franco o destino do povo português. Não foi assim.
Também agora, devemos criar as condições para que os trabalhadores assumam nas suas mãos as rédeas do futuro. Independentemente da fundamental solidariedade entre quem trabalha em diferentes países, a batalha, em cada sítio, pela derrota do projeto capitalista europeu é a melhor forma de ajudar a luta de outros povos. Os trabalhadores alemães terão tudo a ganhar com a vitória dos trabalhadores portugueses. Os trabalhadores franceses terão tudo a ganhar com a vitória dos trabalhadores gregos.