Por Caroline Oliveira.
No Brasil, acredita-se que a cada 100 pessoas presas, 18% são provenientes de outro país, quando o dado oficial é de apenas 0,4%. Assim como acredita-se que o percentual de garotas entre 15 e 19 anos que dão à luz anualmente é de 48%, mas na realidade é de 6,7%.
As comparações são da pesquisa “Os Perigos da Percepção”, divulgada nesta quarta-feira, 6 de dezembro, e realizada pelo Instituto Ipsos Mori, que mede do Índice de Percepção Equivocada. Dentre 38 nações, os brasileiros são a segunda maior população com uma percepção do contexto da sociedade diferente da realidade do País.
Segundo Danilo Cersosimo, diretor da Ipsos Public Affairs, o deslocamento da realidade a partir da percepção está relacionado à desigualdade no acesso à formação educacional e cultural. “Quando observamos os itens da pesquisa, como população carcerária, imigração e gravidez entre jovens, vemos que a população não se apropria desses temas”, afirma Cersosimo, cuja análise também aponta a falta de acesso à informação como um dos pontos estruturantes deste quadro.
“Existe uma questão crônica de falta de debate, que deveria começar na escola para formar pessoas com mais senso crítico. Qual modelo de sociedade estamos formando? Quais ferramentas o Brasil está provendo para seus cidadãos?”, questiona.
Para realizar a pesquisa, entre setembro e outubro de 2017, mais de 29 mil pessoas ao redor do mundo responderam a perguntas sobre dados da realidade, posteriormente comparados aos números oficiais. Ainda que as perguntas fossem diferentes em 2016, naquele ano o Brasil alcançou a posição do sexto lugar.
“A mudança de perguntas é uma maneira de tornar a pesquisa dinâmica de um ano para o outro. Mas a lógica é a mesma: testar a percepção em relação à realidade, até porque nem todos os dados mudam anualmente. Existem informações do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas) que serão atualizadas daqui a dez anos”.
Cersosimo explica que o perigo maior da percepção equivocada é o “tornar-se um cidadão vulnerável a qualquer tipo de discurso e informação que não necessariamente seja correta”, ainda mais em um contexto de novas tecnologias.
“Os Perigos da Percepção”
Segundo a pesquisa, no Brasil acredita-se que num universo de 100 pessoas do sexo feminino, entre 15 e 24 anos, 24% cometeram suicídio. O dado oficial é 4,3%. Quando analisadas pessoas do sexo masculino, a percepção sobe para 25% e o número real desce para 3,3%.
Quando do assunto é acesso a itens eletrônicos. Os brasileiros têm a percepção de que, num universo de 100 pessoas, 47% possuem smartphones. Quando na realidade, o dado oficial cai para 38%.
Quanto a homicídios, 76% dos entrevistados acreditam que atualmente a taxa é maior do que no ano 2000. No entanto, o percentual é igual ao daquele ano.
“Em todos os 38 países analisados, cada população erra muito em sua percepção. Temos percepção mais equivocada em relação ao que é amplamente discutido pela mídia, como mortes por terrorismo, taxas de homicídios, imigração e gravidez de adolescentes”, afirmou Bobby Duffy, diretor de pesquisas do instituto, em entrevista à Folha de S. Paulo.
Na mesma esteira de percepção da realidade, uma pesquisa realizada pela Oxfam e o Instituto DataFolha mostra que para 46% dos brasileiros é necessário ter uma renda de pelo menos 20 mil reais para fazer parte dos 10% mais ricos do País. Quando o valor oficial é de apenas três salários mínimos, 2.811 reais.
Perfil
A pesquisa foi realizada online, o que limita o alcance do estudo à percepção da população com acesso à Internet no País. De acordo com a Pnad do IBGE (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), o Brasil alcançou 102,1 milhões de pessoas na Internet. Essa amostragem tende a ser urbana, estar mais presente em capitais e regiões metropolitanas. No entanto, “isso não significa que não tenham sido contempladas cidades do interior”, afirma Cersosimo.
Os números representam “o público conectado, ou seja, da classe A e B majoritariamente. É uma população, digamos, com um perfil de mais acesso à informação, o que é contraditório se olharmos para a posição do Brasil no ranking”.
Fonte: CartaCapital