Por Rute Pina.
No próximo ano, a previsão do orçamento das universidades federais é 15,2% menor que a verba prevista para 2016. A informação foi publicada esta semana no Sistema Integrado de Monitoramento, Execução e Controle (Simec). O orçamento global previsto (LOA) para as Instituições Federais de Ensino Superior (IES) é de R$ 6,7 bilhões. Em 2016, o valor era de R$ 7,9 bilhões.
A estimativa é que haja uma redução de investimentos em 45%. No custeio, que é a quantia destinada para pagar salários e manutenção do ensino superior, a diminuição pode chegar a 20%.
Estes números preocupam a comunidade acadêmica. Para Francisco Jacob, secretário do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN), o corte afetará desde as condições físicas das instituições, como edifícios e laboratórios, até as concessões de bolsas e os projetos de extensão — fundamentais para a realização do trabalho de professores, técnicos e estudantes.
Jacob lembra que, de 2014 para 2015, já houve uma redução drástica de investimentos. Ele aposta que, se forem efetivados mais cortes, haverá paralisações em todo o país. “Independentemente de greves, as universidades vão parar por inanição, por ausência absoluta de condições de trabalho”, garantiu.
Equivalências
De acordo com a assessoria de imprensa da Secretaria de Educação Superior (Sesu) do Ministério da Educação (MEC), a previsão para 2017 equivale à execução orçamentária deste ano após a recuperação de metade dos recursos contingenciados ao longo do período. O governo, no início do ano, congelou cerca de 30% do LOA, o que corresponde a R$ 2,4 bilhões.
Ou seja, a Sesu afirmou que não se pode falar em cortes quando a comparação é feita com base no orçamento executado neste ano, de R$ 5,5 bilhões.
A pasta assegurou que não haverá contingenciamento no próximo ano. “O orçamento de 2017 será real em sua integralidade. Ou seja, os valores aprovados e executados serão cumpridos em sua totalidade”, prometeu em comunicado à imprensa.
Unila
Mesmo com a promessa de gastar todo o valor previsto para 2017, o governo será obrigado a fazer novos contingenciamentos por causa de uma possível queda na arrecadação, o que pode afetar projetos e universidades ainda em implementação, como é o caso da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), localizada em Foz do Iguaçu (PR).
Parte de um projeto de descentralização do ensino superior, a Unila, cujas atividades acadêmicas da universidade se iniciaram em 2010, tem uma proposta diferenciada, que visa a integração latino-americana, o desenvolvimento regional e o intercâmbio cultural, científico e educacional da região, especialmente do Mercosul.
Francieli Rebelatto, professora do curso de Cinema, teme que as implicações sejam drásticas para a universidade, cujo campus ainda está em fase de licitação. Além da infraestrutura, a falta de recursos pode comprometer a contratação do corpo docente, ainda incompleto.
Mas Rebelatto acredita que o principal problema será com o corte de bolsas e auxílios estudantis. “É inviável construir uma universidade popular, integradora, nos moldes do que a gente entende como é o projeto da Unila — do multilinguismo e da interdisciplinaridade — sem a gente ter estudantes de outros países. E sem orçamento para verba estudantil, que eu imagino que será uma das principais afetadas, a gente volta construir uma universidade extremamente elitizada”, refletiu.
Inclusão
Atualmente,há cerca de 700 vagas abertas para estudantes estrangeiros, mas o auxílio estudantil para estes alunos no ano que vem pode ser extinto. Em junho, os estudantes da Unila ocuparam os edifícios da universidade reivindicando estes recursos financeiros, a reativação de uma das moradias estudantis e o restabelecimento do fornecimento de água.
Francieli, hoje presidenta na direção da seção sindical na Unila (SESUNILA), questiona sobre qual será o recorte socioeconômico dos estudantes estrangeiros matriculados na instituição sem a possibilidade da verba. “Vai ser difícil manter a particularidade do projeto inicial da universidade sem que a gente consiga atender a estudantes de outros países que sejam classes sociais menos favorecidas”, disse.
Jacob também avalia que os projetos de inclusão poderão ser prejudicados com os cortes. “O aumento de alunos oriundos das classes populares à universidade, todo o trabalho de extensão que foi duramente realizado com as comunidades, nos bairros, nas zonas rurais… Tudo isso, com certeza, vai ficar comprometido com esses cortes, a precarização do trabalho docente, dos técnicos”, ressaltou o professor.
Outras privações
Também professor da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Jacob conta que a instituição já passa por privações. O Plano Nacional de Formação de Professores (Parfor), que incentiva a segunda licenciatura de professores da rede pública, e o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid), que concede bolsas a alunos que pretendem ser docentes, tiveram redução significativa na universidade.
Além disso, a UFAM apresenta problemas com a obra de construção de moradia estudantil. A construção está paralisada, com risco de deterioração do que já foi erguido, e os estudantes estão recebendo auxílio aluguel.
Para Jacob, a solução passa pela auditoria da dívida pública, na sua visão uma “sangria desatada do dinheiro público”, e pela discussão ampla com a sociedade. “A comunidade acadêmica das federais não tem como, sozinha, enfrentar e reverter tudo isso sozinha. Esta é uma luta da sociedade brasileira, que precisa reconhecer a importância das universidades públicas no processo de desenvolvimento do país”, afirmou o dirigente sindical.
Segundo o IBGE, as instituições federais foram responsáveis por mais de 90% das publicações e pesquisas acadêmicas no Brasil.
Edição: Camila Rodrigues da Silva