Odebrecht: caixa 1 ou caixa 2 ou é tudo propina?

Por Felipe Recondo.

A delação da empreiteira Odebrecht, cujos detalhes começaram a ser conhecidos, tem potencial para misturar o entendimento sobre o que é caixa 1 e caixa 2 de campanha eleitoral. O conteúdo da primeira das delações, vazada no final da semana passada para a imprensa, mostra como o financiamento de campanhas se confundia com pagamento de propina, fossem doações “por dentro”, fossem “por fora”, fossem como adiantamento por serviços que seriam prestados, fossem como retribuição por ajudas nada republicanas já entregues.

Cláudio Melo Filho deixou isso claro ao tratar de contribuições para o PMDB, que eram acertadas com o atual líder do governo, o senador Romero Jucá. O repasse de dinheiro era uma via de mão dupla, conforme ele descreve. A doação seria uma retribuição aos políticos pela defesa de seus interesses ou era um apoio em troca de apoio aos pleitos futuros da empresa.

A forma de pagamento, neste caso, parecia mero detalhe: caixa um ou caixa dois, a entrega de dinheiro estava mais para pagamento de propina do que para financiamento de campanha. Esta percepção vinha sendo partilhada por procuradores e advogados que atuam na delação da Odebrecht.

Em outra passagem, Cláudio Melo declara que a Odebrecht pagou R$ 7 milhões a parlamentares com projeção no Senado e na Câmara para aprovar uma medida provisória de interesse da construtora. Dentre os beneficiários estariam Romero Jucá (PMDB-RR), Renan Calheiros (PMDB-AL), Eunício Oliveira (PMDB-CE), Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) e Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Durante a tramitação de outra medida provisória, também acompanhada pela Odebrecht, Renan Calheiros pediu apoio da companhia para a candidatura de seu filho ao governo de Alagoas. A conversa se deu na residência oficial da Presidência do Senado, como relata Cláudio Melo:

“Em determinado momento da conversa, ele me disse que seu filho seria candidato ao governo de Alagoas e me pediu expressamente, que eu verificasse se a empresa poderia contribuir. Acredito que o pedido de pagamento de campanha a seu filho ao governo do Estado de Alagoas, justamente no momento em que se apresentavam os aspectos técnicos relevantes, era uma contrapartida para o forte apoio dado à renovação dos contratos de energia, inclusive publicamente, e que culminou na edição da MP n. 677/15”.

Esta relação feita por delatores da Odebrecht entre doação de campanha e pagamento de vantagens em troca de apoio enfraquece o argumento padrão dos políticos, também sacado pelo presidente Michel Temer, de que “as doações feitas pela Construtora Odebrecht ao PMDB foram todas por transferência bancária e declaradas ao TSE”.

Também reforça o argumento majoritário de ministros do Supremo sobre a inconstitucionalidade do financiamento privado de campanhas. Perguntava o ministro Luís Roberto Barroso durante o julgamento da ADI 4.650, ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB): “Que ideologia é essa em que você apoia um lado e apoia o outro? Você quase neutraliza o tipo de colaboração que está dando. Na verdade, faz-se isso ou por medo, ou por interesse”.

Lembrava ainda o ministro Gilmar Mendes, contrário ao fim do financiamento privado, que a Operação Lava Jato teria revelado uma nova forma de lavar dinheiro proveniente de corrupção: “Parte da propina voltaria ao PT em forma de doações contabilizadas à legenda e às campanhas eleitorais. Outra parte seria entregue em dinheiro ao tesoureiro do Partido. Uma terceira financiaria a agremiação, por meio de doações indiretas ocultas, especialmente por meio de publicidade”.

Independentemente do debate técnico que será travado nos tribunais sobre o que configuraria corrupção ou que seria mera doação eleitoral irregular, a descrição feita por Cláudio Melo dá contornos de propina ao dinheiro pago a políticos e suas campanhas – por dentro ou por fora. Caixa 1 ou caixa 2 seriam apenas a forma de receber: com nota ou sem nota.

Mais do que as informações que diretores da Odebrecht levaram para a Lava Jato, a delação escancara por que algumas das maiores empresas do País contribuíam para campanhas eleitorais e cria um obstáculo – difícil de transpor – para quem defende, ainda que com bons argumentos, a retomada das doações empresariais.

Fonte: Jota.

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