Ocupações dos estudantes: Uma jornada de aprendizagem

Foto: Priscilla Britto, Desacato,info
Foto: Priscilla Britto, Desacato,info

Por Paulo Pinheiro Machado.

O Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFSC esteve, entre os dias 4 e 29 de novembro, sob ocupação estudantil. Estou no meio universitário como estudante e professor desde 1979 e nunca tinha visto um movimento como este. Já vi e participei de dezenas de greves, ocupações de RUs e Reitorias, mas nunca tinha visto algo parecido com o que aconteceu. Os estudantes estavam inspirados pelo movimento nacional de resistência às medidas de ataque que o governo federal implementou contra a educação e o país. O movimento começou muito forte, com uma assembleia de mais de 500 participantes que deliberou pela greve e ocupação com o bloqueio do prédio de aulas e de toda a parte administrativa que incluía salas de professores, secretarias, Laboratórios e Núcleos.

O clima era um pouco catártico, com fortes demonstrações de voluntarismo, desprendimento e idealismo, com grande capacidade de auto sacrifício e de compartilhamento, por quase 1 mês, de uma alimentação precária, sono difícil, turnos de revezamento, banhos frios e muitas rodas de debate, aulões e assembleias. Desde o primeiro dia os estudantes organizaram-se em diversas comissões, que tratavam dos mais diferentes aspectos como segurança, alimentação, limpeza, atividades culturais, etc. Uma reunião diária era momento para definições e pequenas deliberações, entre uma assembleia e outra. As estruturas tradicionais do movimento estudantil como os Centros Acadêmicos e o DCE não tinham autoridade sobre o movimento, que apresentou forte participação de estudantes de primeiros semestres dos 10 cursos de graduação que acontecem no CFH.

Nos primeiros dias muitos professores e técnicos, mesmo pessoas que apoiam o movimento dos estudantes, sentiram-se surpreendidos e, de certa forma, incomodados pela atitude radical dos estudantes. É fácil compreender esta reação automática de quem é barrado por tentar retomar sua rotina de trabalho. Os professores eram escoltados por estudantes até suas salas e só entravam nelas pontualmente, para pegar algum documento ou material. Muitos vieram procurar a Direção do Centro para pedir “medidas enérgicas” que garantissem o “direito de ir e vir”. Logo entenderam que não se tratava de buscar medidas de força, mas sim de procurar entender e apoiar o movimento dos estudantes que, em última instância, não era apenas “dos estudantes” já que eles estavam lutando pela educação como um todo. Eles lutaram por todos nós.

Durante o ano o país ficou assistindo bestializado um golpe político que rasgou a Constituição e anulou 54 milhões de votos e as pessoas ainda se perguntavam se era ou não legítima uma resistência a tudo que tem acontecido. Entregaram o pré-sal, desmontaram a LDB e agora desvinculam receitas da Educação e Saúde (em breve, detruição da previdência e desmonte da CLT). Dentro do prédio ocupado os estudantes foram construindo uma relação horizontal com os trabalhadores terceirizados da limpeza, segurança e portaria. Funcionários da limpeza mostravam aos estudantes como limpar corredores, salas e banheiros e eles mesmos assumiram a maior parte destas tarefas. O prédio também teve alguns benefícios, como torneiras e lâmpadas trocadas, cuidado com o patrimônio e até a pintura final das paredes para tirar os grafites. Francamente é discutível a eficácia deste movimento para barrar a PEC 241, mas ainda é muito cedo para avaliar os efeitos a médio e longo prazos desta jornada. Trata-se de uma nova cultura política, ainda não muito bem definida, que defende um protagonismo direto, uma atitude niveladora e um movimento que não procura o domínio de estruturas, mas sim uma profunda reflexão sobre nossa vida e nosso trabalho. Por muitos anos ouvi em assembleias pessoas dizendo que era necessário se inventar formas alternativas de luta, que nossas greves tradicionais estavam desgastadas e haviam caído no vazio. Bem, há algo de novo aparecendo. Bora lá aprender.

Fonte: Facebook.

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