Na ocupação Nova Esperança, em Campo Magro (PR), a terra em que 1.200 famílias lutam pelo direito à moradia também é solo fértil para a produção de alimentos agroecológicos. Nesta segunda-feira (2), a comunidade consolidou uma horta comunitária de 15 mil metros quadrados, que vai garantir alimentação saudável e reforço na geração de renda aos moradores. A área está localizada a cerca de 10 quilômetros de Curitiba, capital do estado.
Uma a uma, mais de 20 mil mudas de hortaliças, além de sementes de amendoim, feijão, milho e abóbora cobriram a terra, já preparada nos dias anteriores. O trabalho foi possível a partir de um mutirão com participação de aproximadamente 150 moradores, entre adultos, jovens, idosos e crianças.
A orientação técnica do trabalho ficou por conta de agrônomos, camponeses, técnicos e estudantes de agroecologia integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Eles estão ligados à Escola Latino Americana (ELAA) e à Cooperativa Terra Livre, ambas localizadas no assentamento Contestado, na Lapa. Também foi de lá que vieram as mudas e o adubo utilizado no plantio. Já as sementes foram doadas pela Rede Sementes da Agroecologia – RESA, formada por “guardiões” de sementes crioulas.
Adriano Lima dos Santos, agrônomo e professor da Escola Latino Americana de Agroecologia (ELAA), relata a satisfação em fazer parte da transformação da terra: “São alimentos agroecológicos que vão alimentar a população da comunidade Nova Esperança neste período tão crítico em que as pessoas estão passando várias necessidades, e a pior delas é a fome”.
Além da contribuição com as famílias de Campo Magro, a ELAA tem realizado mutirões de plantio de alimentos para somar às doações realizadas pelo MST desde o início da pandemia. Os mutirões contam com a participação do coletivo Marmitas da Terra, organizado pelo MST para a produção de distribuição de marmitas a quem mais precisa neste período de pandemia.
Para Valdecir Ferreira, morador da ocupação e integrante da coordenação do Movimento Popular por Moradia (MPM), a criação da horta coletiva “é um passo gigantesco”, sinal do avanço da união entre o campo e a cidade e do fortalecimento da luta das famílias.
Ao lembrar o Dia de Finados, Ferreira frisou a simbologia do plantio: “Em vez da gente adotar uma postura de tristeza, estamos adotando uma postura de alegria, porque aqui nessa terra está renascendo a nossa esperança, o nosso sonho”.
A abertura da atividade foi marcada por homenagens à vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018, e ao agricultor e militante do MST-PR Ênio Pasqualin, morto no último dia 24 de outubro. “Isso aqui é prova de que nossa luta e a luta dos companheiros que se foi em vão e nunca será”, se referindo a Marielle e Ênio.
MANDALA
Além das dezenas de canteiros enfileirados, uma horta mandala também ganhou forma pelas mãos de haitianos que fazem parte da comunidade. A técnica de plantio circular e de maneira consorciada (combinando diferentes variedades de plantas) já é aplicada em outra pequena área da comunidade pelos imigrantes, que também farão os cuidados da mandala da horta comunitária. Cerca de 1.700 haitianos vivem na ocupação Nova Esperança, além de venezuelanos e cubanos.
Sandra Regina Colombeli está entre as muitas moradoras da comunidade que já têm o hábito de cultivar alimentos ao redor da casa, e agora se soma ao plantio comunitário. “Essa horta vai servir pra quando eu precisar vir colher pra comer e para todo o pessoal da comunidade que precisar. É uma grande satisfação fazer parte dessa horta junto com a vizinhança e o Movimento”. Ela, a filha e o neto vivem na ocupação há quatro meses: “Eu morava de aluguel. Vim pra cá e fui bem acolhida, me sinto bem aqui, tenho minha casinha”, relata.
AÇÕES EM TODO O PARANÁ
Famílias do MST, moradoras de assentamentos e acampamentos de todo o Paraná, também marcaram o Dia de Finados com plantio de árvores em homenagem a militantes do Movimento e familiares falecidos. A maioria das ações lembrou o assassinato de Ênio Pasqualin, ocorrido no último dia 24 de outubro.
O agricultor e integrante do Movimento morava no assentamento Ireno Alves dos Santos, em Rio Bonito do Iguaçu, e fez parte da luta pela reforma agrária desde 1996, especialmente em áreas públicas griladas. As ações ocorreram em Londrina, Planaltina do Paraná, Lapa, Cascavel, Laranjal, Quinta do Sol e Cruzeiro do Sul, em dezenas de comunidades.