O assassinato da jornalista palestina Shireen Abu Akleh trouxe à tona um debate tardio sobre os crimes seletivos e condenações de “Israel” contra quem expõe seus crimes e as constantes violações por parte do apartheid de supremacia judaica contra palestinos nos territórios ocupados e contra o movimento de solidariedade, entidades e ativistas que denunciam os crimes de guerra e contra a humanidade praticados pela ocupação.
Esse assassinato não foi um fato isolado e nem foi o único. É frequente o assassinato de jornalistas, cinegrafistas, fotógrafos e ativistas palestinos pelas forças de ocupação do apartheid israelense. São assassinatos que visam calar a verdade sobre os crimes contra a humanidade e as violações dos direitos humanos dos palestinos, cometidos diariamente pelos agentes do “Estado de Israel”. Segundo estudo do Comitê Árabe de Apoio a Jornalistas, só em 2021 foram registradas 625 violações contra jornalistas palestinos, que incluem assassinatos, ferimentos, prisões, espancamentos, confisco de câmeras e impedimentos de acesso às áreas de conflitos.
Em maio do ano passado, durante os 11 dias de ataques criminosos a Faixa de Gaza, aviões de guerra do apartheid israelense atacaram e destruíram instalações de 59 órgãos de imprensa, um jornalista foi morto e dezenas ficaram feridos, além disso, 25 foram presos pelas tropas de ocupação.
Em menos de um mês duas jornalistas foram intencionalmente assassinadas por soldados do apartheid. Uma semana depois de assassinarem a correspondente da rede Al Jazeera Shireen Abu Akleh com um tiro no rosto, soldados da ocupação assassinaram a jornalista Ghufran Harun Hamid Warasneh, de 31 anos, com um tiro no peito, quando ela se dirigia para o seu primeiro dia de trabalho em um novo emprego na área jornalística, na cidade palestina de Hebron, na Cisjordânia ocupada. A empresa para qual ela iria trabalhar se chama Dreams (sonhos, em inglês).
Além disso, Israel utiliza a acusação de antissemitismo como uma das estratégias para atacar e deslegitimar e condenar quem se opõe às políticas de apartheid e limpeza étnica adotadas contra o povo palestino. Essa alegação de antissemitismo geralmente se soma à acusação de vínculo com “grupos terroristas palestinos”.
O antissemitismo é usado desde a fundação do movimento sionista no final do século XIX, como motivação para justificar a existência do “Estado judeu” e como recurso contra quem, segundo eles, quer derrubar “a única democracia do Oriente Médio”. Essa manipulação é um dos fatores da perda de apoio de Israel por parte de judeus em todo o mundo, como ocorre nos EUA, e de movimentos da juventude judaica israelense, que se negam a prestar o serviço militar para não compactuar com as agressões sistemáticas das forças de ocupação contra palestinos.
Entidades que apoiam os crimes de “Israel” em todo o mundo são atacadas e processadas. As vítimas mais frequentes dessas entidades “israelitas” são o Movimento de Boicote, Desinvestimentos e Sanções (BDS) e a Anistia Internacional; políticos, escritores, movimentos antissionistas e até a Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados (UNRWA na sigla em inglês). Para os sionistas, qualquer movimento ou pessoa que defina Israel como um apartheid ou denuncie seus crimes de lesa-humanidade é considerado antissemita.
O lobby a favor de Israel instrumentaliza os órgãos de mídia, compra a lealdade de governos e políticos de diversos partidos nas casas legislativas. A partir dessa influência, Israel coopta igrejas evangélicas e põem-nas para trabalhar em seu favor. Adotam uma narrativa para criar uma cortina de fumaça sobre a usurpação da Palestina com apoio das potências do Ocidente desde 1948 e ampliado à partir de 1967, quando teve início a ocupação e a expansão dos assentamentos judaicos, como forma de consolidar o projeto colonial.
“Israel” tem atacado frontalmente o movimento palestino de direitos humanos, designando suas ONGs como “grupos terroristas”, com o objetivo de silenciar, restringir e interromper o trabalho prestado por elas. Essa designação é baseada numa lei draconiana de 1996, destinada a punir palestinos por atirar pedras, enfrentar a polícia, empunhar bandeira e entoar slogans em defesa dos direitos dos palestinos ou mesmo publicar e compartilhar postagens no Facebook e Instagram, duas plataformas inimigas da causa de libertação do povo palestino.
Os mais recentes inimigos mortais de “Israel” são a Anistia Internacional e a Human Rights Watch (HRW), organizações com credibilidade e respeito internacional que divulgaram relatórios que evidenciam o regime de apartheid, os crimes de guerra e as constantes violações do direito internacional e do direito internacional humanitário promovidos pelo “estado judeu”, fatos documentados ao longo de décadas com colaboração de várias instituições internacionais de direitos humanos.
Desde 1967, o regime de apartheid israelense já baniu mais de 400 organizações palestinas e internacionais, incluindo entidades humanitárias, a quem consideram “hostis” ou “ilegais”, inclusive entidades ligadas ao partido político Fatah, que governa a Autoridade Palestina e a OLP, com a qual “Israel” assinou os ineficazes Acordos de Oslo, em 1993.
“Israel” age como uma entidade que goza de impunidade e, para isso, conta com o apoio absoluto dos EUA e de vários países da União Europeia, que o protegem de punições e permite que continue cometendo os crimes hediondos, incluindo assassinatos, prisões, deslocamento, violação de lugares sagrados para cristãos e muçulmanos, como vimos durante o sagrado mês do Ramadã para os muçulmanos e a páscoa dos cristãos em Jerusalém, além do roubo de terras e recursos naturais, como as fontes de águas palestinas.
A comunidade internacional precisa avaliar seu envolvimento com o regime de apartheid israelense e adotar abordagens que evidenciem a defesa dos direitos humanos dos palestinos, responsabilizando e punindo o apartheid do “Estado judeu” pelas constantes violações, além de estabelecendo uma Comissão de Inquérito no âmbito da ONU para investigar a discriminação e a repressão sistemática de “Israel” contra palestinos e suas organizações humanitárias.
Sayid Marcos Tenório é historiador e especialista em Relações Internacionais. É vice-presidente do Instituto Brasil-Palestina (Ibraspal) e autor do livro Palestina: do mito da terra prometida à terra da resistência (Anita Garibaldi/Ibraspal, 2ª. Ed. 2022). E-mail: [email protected] – Twitter: @palestinahoje
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