Por Gladstone Leonel da Silva Júnior.
Em pleno século XIX, um dos lutadores para a libertação da América do julgo europeu àquela época, José Martí, refletia sobre a importância de surpreender os que insistem em impedir os processos de transformação necessários para uma grande pátria justa e livre. Dizia ele, profeticamente, “que a um plano obedece o nosso inimigo: enganar-nos, dispensar-nos, dividir-nos, afogar-nos. Por isso, nós obedecemos a outro plano: ensinar a nós mesmos com todo o vigor, apertar-nos, juntar-nos, desbaratá-los, finalmente fazer a nossa pátria livre. Plano contra plano”.
O sonho de Martí e Bolívar ainda está presente no ideário dos povos latino-americanos e, em pleno século XXI, começa a tornar-se uma realidade palpável. O exemplo vem da terra do próprio Bolívar, a Venezuela. O predestinado a ajudar no cumprimento dessa tarefa junto ao povo latino-americano chama-se Hugo Chávez.
O atual presidente, democraticamente eleito na Venezuela, exerce o segundo mandato e enfrenta uma oposição ferrenha não só em seu país, mas em todo o mundo. Por que motivo Hugo Chávez incomodaria tanto, se os cidadãos venezuelanos legitimamente insistem em elegê-lo como presidente? Qual o interesse das principais potências econômicas do mundo em um país mediano, no norte da América do Sul, dentre quase duzentos países no planeta?
Atualmente, um aspecto central para a análise do processo de transformação do país é o papel da PDVSA (Petróleos de Venezuela S.A.) para a sociedade. A Venezuela é um dos países com a maior reserva petrolífera do planeta. Após a entrada de Chávez na presidência, o Estado venezuelano modificou a gestão e o direcionamento dos faturamentos da empresa. Os royalties do petróleo passam a ser investidos desde a área da saúde à habitação em benefício do povo. Socializa-se, de fato, o capital adquirido no mercado internacional de petróleo, baixando consideravelmente a taxa da pobreza no país.
Hoje na Venezuela, falar de processo revolucionário e de socialismo é tratar de um tema que, segundo o povo venezuelano, estão acompanhando e vivenciando no dia-a-dia. Sobretudo, a partir da introdução das missões bolivarianas.
Quem ousaria contestar um humilde trabalhador venezuelano sobre o potencial transformador dos mercados socialistas? Local onde são vendidos alimentos a baixo preço e de qualidade, sem agrotóxicos. Ou seja, o abastecimento é proveniente de experiências de agroecologia promovidas pelo Estado e acessíveis ao povo pobre, não aos grandes hipermercados. Ressaltando que as áreas de plantio, muitas vezes, são provenientes de desapropriação. Dessa forma, a Venezuela combate ao mesmo tempo três elementos fomentadores da desigualdade social na América Latina: os latifúndios, o agronegócio e as redes monopolistas do setor de alimentos.
Na área habitacional, os setores ligados à especulação imobiliária são escanteados para que o direito à moradia de cada cidadão venezuelano seja garantido. A missão habitação ou “misión vivienda” tende a zerar, até 2018, o déficit habitacional na Venezuela. Todos terão direito a casa própria, além de infraestrutura de lazer e educacional nessas áreas.
Tudo isso, impulsionado pelos conselhos comunais. Ou seja, a forma de que o povo seja responsável pelas mudanças de sua realidade e decida o próprio destino. Os conselhos possuem poder político e exercem a gestão direta de políticas públicas. Não se caracterizam só como estrutura consultiva, mas deliberativa, ativando a governança comunitária nos variados setores organizados, como na saúde, na economia comunal, na habitação etc.
A Constituição venezuelana garante o “Poder Cidadão” como um de seus poderes instituídos. Os conselhos comunais são a efetivação dessa previsão constitucional, contrariando o imaginário personalista e concentrador de poder que os meios midiáticos tradicionais passam do presidente. A tendência é uma maior autonomia e maior peso político dos conselhos comunais diante dos poderes instituídos de prefeitos ou governadores, por exemplo. É, de fato, o empoderamento do povo, indo além da mera eleição, mas por meio do exercício de uma democracia participativa pulsante.
Mesmo assim, o governo Chávez ainda é taxado de ditatorial para alguns, antidemocrático para outros. Para o povo venezuelano, que reiteradamente enche as ruas com milhares de pessoas para acompanhar os comícios do presidente, que se sentem sujeitos de um processo transformador, por não aceitarem só a democracia representativa e nenhum retrocesso nos seus direitos conquistados, essa falsa imagem não se sustenta. O que incomoda os países conservadores mundo afora é o fato de a Venezuela mostrar que, politicamente, as coisas podem ser diferentes. Como diz o velho ditado, “uma ação vale mais que mil palavras”. Esse é o grande ensinamento do processo revolucionário bolivariano da Venezuela.
O resultado do simulacro eleitoral realizado dia 2 de setembro de 2012 é sintomático. Mesmo a mídia conservadora latino-americana falando em empate técnico entre os candidatos, o resultado é titubeante. Dos mais de 1,6 milhão de eleitores que participaram, por volta de 86% querem a manutenção de Chávez na presidência contra os 12% para o candidato de oposição.
Eleger Chávez significa manter a chama de uma América Latina viva, tenaz, guerreira e unida ao redor de toda sua riqueza de pluralidades. É voltar-se para nossa construção sócio-histórica e acreditar que temos muito mais semelhanças que divergências, que na América Latina pulsa um coração único que alimenta um só corpo. Hoje, esse coração cheio de vigor e esperança da “pátria grande” chama-se Venezuela!
Seguindo os caminhos de Bolívar: “O que tem sido feito não é mais que o prelúdio do que se pode fazer. Estejam preparados para o combate e contem com a vitória”.
Gladstone Leonel da Silva Júnior
Professor e doutorando em Direito pela Universidade de Brasília e militante da Consulta Popular-DF. Participou do Encontro Internacional de Jovens da Nossa América, na Venezuela, em agosto de 2012.
Imagem: Wilson Dias/ Agencia Brasil.