Por José Eustáquio Diniz Alves.*
O Brasil está passando por um período de baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). A variação do PIB brasileiro de 2014 foi de apenas 0,1%. Isto quer dizer que houve queda da renda per capita de 0,7%. Mas a realidade do “Pibinho” pode ser muito pior em 2015, pois há previsões de queda que variam de 1% a 2% durante o corrente ano.
Ao longo do século XX, a maior taxa de crescimento quinquenal da economia brasileira ocorreu em 1971-75 e, a menor, no quinquênio 1981-85. Em ambos os períodos, o ex-ministro Delfim Neto esteve à frente da política econômica brasileira. Portanto, ele conseguiu bater os recordes de alta e de baixa.
Mas a presidenta Dilma Rousseff poderia entrar para o livro dos recordes deixando para trás todos os números negativos e obtendo as menores taxas de crescimento do país, desde o início do século XX. Bastaria a economia brasileira não crescer em 2015 para que o recorde fosse quebrado na antiga série do PIB. Mas, em março de 2015, o IBGE divulgou uma nova série, fruto de longo período de reavaliação da metodologia de cálculo das Contas Nacionais. Desta forma, tudo indica que o quinquênio 2011-15 não será tão ruim quanto a antiga série indicava, mas será equivalente ao quinquênio 1981-85.
O economista da UFRJ, Reinaldo Gonçalves (2010) já havia chamado a atenção para o baixo crescimento ocorrido durante o governo Lula. Segundo trabalho disponível no site do IE/UFRJ, Gonçalves mostra que a taxa média de crescimento real do PIB brasileiro foi de 4,5% no período 1890-2009. Ele apresenta as taxas de crescimento por ordem cronológica dos mandatos presidenciais, começando com Deodoro da Fonseca (1890-91) e terminando com Lula (2003-2010). No conjunto de 29 mandatos, o governo Lula (2003-10) teve a 9ª taxa mais baixa de crescimento econômico da história republicana. Abaixo da média histórica desde a Proclamação da República.
Considerando as taxas de crescimento econômico nos mandatos presidências, os dois piores mandatários – ambos com governos curtos – foram Floriano Peixoto (11/1889 a 11/1891) e Fernando Collor de Mello (03/1990 a 09/1992), que apresentaram taxas negativas de variação do PIB. Em terceiro e quarto lugar – já com taxas positivas de crescimento do PIB – apareciam Venceslau Brás (11/1914 a 11/1918) e Fernando Henrique Cardoso (01/1999-12/2002), respectivamente com taxas médias de crescimento do PIB de 2,1% e 2,3% ao ano.
Contudo, nos últimos 24 anos, o governo Dilma só teve melhor desempenho do que o governo Collor. Considerando o quinquênio, constata-se que o desempenho econômico dos primeiros cinco anos do governo Dilma Rousseff (mesmo com a nova série de dados do PIB) coloca a gestão como o terceiro pior mandato presidencial da história republicana e um dos piores quinquênio dos últimos 115 anos. A nova série elevou o percentual do crescimento do PIB no primeiro governo Dilma, mas deve acentuar uma possível queda no segundo governo. Como foi prometido durante a campanha eleitoral de 2014 que o segundo governo seria melhor do que o primeiro, teremos que aguardar para avaliar o período 2015-2018.
Nos primeiros 80 anos do século XX, a economia brasileira cresceu mais do que a média da economia global. Desta forma, o Brasil atingiu sua maior taxa de participação no PIB mundial em 1980, quando 4,3% da produção mundial ocorria nas fronteiras nacionais, medido em poder de paridade de compra (ppp), segundo dados do FMI. Com a crise econômica da “década perdida” e o desastre do governo Collor de Mello a participação brasileira no PIB mundial caiu para 3,24% em 1992. Após a estabilização do Plano Real a participação brasileira na economia internacional aumentou ligeiramente para 3,36% em 1996. Mas em seguida a participação continuou caindo até 2,93% em 2006. Houve outra ligeira recuperação entre 2006 e 2010 (quando chegou a 3,1%) e voltou a cair depois de 2011, chegando ao mínimo histórico de 2,8% em 2015. As projeções do FMI apontam uma participação de 2,7% em 2019.
Ou seja, a participação brasileira no PIB mundial caiu de 4,3% em 1980 para 2,8% em 2015. Houve uma perda de 1,5% do PIB mundial. Em termos de valores, o PIB mundial estava em US$ 113,1 trilhões de dólares (em ppp) e o PIB brasileiro em US$ 3,2 trilhões de dólares (em ppp) em 2015. Se o Brasil mantivesse os 4,3% do PIB mundial que tinha em 1980 teria um PIB de US$ 4,9 trilhões de dólares (em ppp) no ano de 2015. Ou seja, a diferença que ocorreu nestes 35 anos foi de US$ 1,7 trilhões de dólares (em ppp). A renda per capita brasileira que está calculada em torno de US$ 15 mil (em ppp) no ano 2015, poderia estar em US$ 23 mil, cerca de US$ 8 mil (em ppp) mais elevada do que a atual.
Isto mostra que mesmo o Brasil avançando em termos absolutos nos últimos 35 anos, houve um recuo em termos relativos. Isto é, o resto do mundo avançou mais que o Brasil desde o início da “década perdida”. Nos últimos 35 anos (por coincidência, o PT tem a mesma idade) o Brasil cresce a passos de tartaruga. E o pior, o Brasil se desindustrializou e reprimarizou sua economia, pois as atividades mineradoras e o agronegócio foram o destaque do crescimento nos últimos tempos, sendo também grandes responsáveis pela degradação ambiental.
O ano de 2014, além de não ter apresentado crescimento (PIB de 0,1% aa) teve déficit em transações correntes de insustentáveis US$ 91 bilhões (mais de 4% do PIB). Mesmo com a defasagem dos preços administrados a inflação atingiu o teto da meta estabelecido pelo Banco Central. Para um PIB de R$ 5,5 trilhões, houve o primeiro déficit primário (de R$ 32,5 bilhões) dos últimos 20 anos e um enorme déficit nominal de R$ 343,9 bilhões (mais de 6% do PIB). A dívida bruta interna chegou a 65,5% do PIB. Portanto, o país agravou os déficits gêmeos (interno e externo) e agora precisa fazer um ajuste fiscal e rearrumar a economia. O percentual da população ocupada vem caindo, pelo menos, desde 2012 e embora a taxa de desemprego estivesse baixa, o mercado de trabalho não apresentou dinamismo.
Todavia, se não é bom lembrar o desempenho econômico no ano de 2014, o ano de 2015 começou de maneira muito pior. Parece que a política macroeconômica perdeu o rumo, pois enquanto o ministério da fazenda joga a economia na recessão via ajuste fiscal, o Banco Central aumenta a taxa de juros. O resultado é que o déficit nominal do país chegou a 7,3% do PIB nos 12 meses encerrados em fevereiro. A inflação deve ultrapassar 8% e o PIB deve cair no mínimo 1% em 2015. É um caso clássico de estagflação. Como resultado o desemprego está aumentando e a renda do brasileiro está caindo. O aumento do desemprego e a redução da população ocupada pode significar o fim do bônus demográfico brasileiro.
Parece que o Brasil está entrando em uma situação definida como “tempestade perfeita”: crise hidrica, crise energética, crise na Petrobras, queda dos investimentos, aumento da inflação, elevação do desemprego, crise social, perda de credibilidade externa, fim do bônus demográfico, crise ambiental, aumento das emissões de GEE, crescimento da desigualdade, instabilidade política, governo sem apoio no Congresso, etc. Não vai ser fácil retomar o desenvolvimento e sair desse atoleiro.
Referencias:
GONÇALVES, Reinaldo. Evolução da renda no Brasil segundo o mandato presidencial: 1890-2009, RJ, IE, UFRJ, 2010http://www.ie.ufrj.br/hpp/intranet/pdfs/reinaldo_goncalves_crescimento_1890_2009.pdf
ALVES, JED. O fim do crescimento econômico e a década perdida 2.0, Ecodebate, RJ, 28/11/2014
http://www.ecodebate.com.br/2014/11/28/o-fim-do-crescimento-economico-e-a-decada-perdida-2-0-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: [email protected]
Fonte: Portal EcoDebate