Por Carlos Castilho.
Qual é o papel da imprensa na cobertura de uma campanha eleitoral? Esta pergunta está sendo feita com uma intrigante frequência na reta final da campanha eleitoral norte-americana, mas bem que poderia estar também na agenda da imprensa brasileira, às vésperas das eleições municipais de 7 de outubro.
O papel dos jornalistas numa campanha eleitoral começou a ser questionado como consequência indireta do aumento da participação de eleitores na veiculação de dados e fatos referentes a interesses e estratégias de candidatos envolvidos em disputas eleitorais.
Nos Estados Unidos, o tema entrou para a agenda pública depois que assessores do republicano Mitt Romney anunciaram que a estratégia do candidato opositor ao presidente Barack Obama não será influenciada pelos chamados fact checkers, jornalistas e blogueiros que conferem a veracidade das denúncias, promessas e declarações dos postulantes à Casa Branca nas eleições presidenciais de novembro.
O posicionamento dos republicanos abriu uma área de atrito com a imprensa e colocou os jornalistas numa posição difícil, já que seu papel na cobertura eleitoral foi confrontado pela equipe de Romney. O mal-estar foi geral e a melhor escapatória para o candidato e para os jornais foi o silêncio, depois de um ranger de dentes no início. Mas ficou no ar a pergunta sobre qual deve ser a função da imprensa: tentar separar o joio do trigo no tiroteio retórico entre os candidatos ou cobrir burocraticamente o que eles denunciam ou prometem?
Aqui no Brasil, o fact checking ainda é uma ação esporádica na imprensa e, quando ocorre, é pontual. Não há uma preocupação sistemática em checar os fatos, pois apontar contradições, equívocos ou meias verdades inevitavelmente acaba levando algum candidato a acusar o veículo responsável (jornal, radio, TV ou site) de cumplicidade com o oponente.
Como a relação da imprensa com os políticos é nebulosa, graças a compromissos passados, os jornais, rádios, TVs e sites raramente questionam abertamente as afirmações de candidatos em campanha. Sem assumir integralmente o seu compromisso com a veracidade dos fatos, a imprensa acaba vítima de uma dupla pressão: a dos eleitores, que deixam de levá-la a sério como ferramenta de tomada de decisões; e a dos blogs, que encontram espaço livre para questionamentos e que, na maioria das vezes, aumentam ainda mais a confusão informativa das pessoas.
O grande dilema da imprensa brasileira atualmente é romper com o seu passado de submissão aos interesses eleitorais dos grandes partidos e grupos de pressão. O cenário eleitoral do país mudou muito e as campanhas já não são mais um espelho fiel do caciquismo partidário. Se por um lado o eleitor se tornou mais crítico e desconfiado, por outro as candidaturas perderam consistência ideológica graças à predominância das estratégias de marketing.
Os princípios ideológicos e as identidades partidárias se dissolveram dentro da verdadeira obsessão com os marqueteiros políticos, personagens que, geralmente, colocam a remuneração e o prestígio como principais metas pessoais.
O marketing eleitoral tornou-se um negócio como qualquer outro, em que se vende um candidato como se vende sabão em pó. Assim, a imprensa não precisa submeter-se a esse jogo com a docilidade do passado. Tem mais espaço para afirmar seu compromisso com a veracidade e a fidedignidade, ainda mais levando em conta que ela precisa do público para recompor sua base de clientela, e que este mesmo público está carente de informação confiável.
Está criado um contexto favorável a uma afirmação do fact checking como contribuição da imprensa para a ampliação do capital político da população. Um dos fatores que colabora para a descrença dos eleitores em relação ao processo político é a omissão da imprensa como provedora de informações confiáveis num momento crítico para a tomada de decisões por parte dos cidadãos.
Fonte: http://www.observatoriodaimprensa.com.br