Redação
Arte de capa: Tali Feld Gleiser
As “trumpadas” do governo estadunidense, com a pretensão de atingir, praticamente, todos os países do mundo, geraram, geram e gerarão diversas reações. Aspectos geopolíticos, econômicos, estratégicos, morais e éticos, mas também regionais, e que estão presentes em todas as organizações e foros mundiais em todos os continentes, foram colocados em alerta perante a pirotecnia cotidiano do novo mandato do empresário Donald Trump.
O retorno a práticas ultrapassadas, a decadência imperialista frente ao um mundo que vai desenhando seu destino multipolar, e o circo grosseiro no qual desfilam o presidente e seu entorno tem desacomodado o que restava em pé de um planeta tomada por todo tipo de conflitos locais, regionais e continentais.
Com esse marco se torna necessário aprofundar os conhecimentos e reflexões no mesmo em que decorre o “terremoto trumpista”. Com esse cometido, o jornalista Raul Fitipaldi, para o Portal Desacato, teve um extenso diálogo com José Henrique Artigas de Godoy*, Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP).
A seguir o diálogo:
Neoconservadorismo xenófobo
Raul Fitipaldi – A onda de tarifaços do governo de D. Trump veio precedida de um ataque aos imigrantes que moram nos Estados Unidos. Qual é o ponto de encontro político, econômico e social desta nova investida imperial?
José H. Artigas de Godoy: Esse ataque já havia acontecido no primeiro governo Trump, e as políticas restritivas aos imigrantes não foram desmontadas por completo sob o governo de Joe Biden, apesar de seus discursos contrários às ações anti-imigração os republicanos. A força avassaladora de Trump na perseguição cruel e violenta aos imigrantes deixa muito clara a plataforma Internacional da nova extrema-direita, intolerante, hierárquica, francamente contrária ao pluralismo e ao multiculturalismo.
O nacionalismo cultural de viés homogenizador exprime um sentido intolerante e contrário à diversidade, à diferença, afirmando, em contrário, uma perspectiva xenofóbica. O nacionalismo neoconservador, tradicionalista e reacionário se demonstra no governo Trump na forma da xenofobia, que só pode produzir conflitos e a deslegitimação dos organismos multilaterais de negociação entre as nações. A aposta do pós-guerra no fomento do desenvolvimento humano e da paz por meio da orquestração de conflitos através de meios diplomáticos de negociação e de instituições multilaterais legitimadas para exercer papel de controle foi por terra.

A narrativa do nacionalismo cultural, da defesa das tradições e dos costumes estereotipados produz intolerância étnica, ódio e violência contra o outro, o estrangeiro, o diverso, contra os que insistem em viver de forma livre e diferente dos tradicionais padrões patriarcais entendidos de forma essencialista e excludente. Assim, o outro, o diferente, é taxado como responsável pela degeneração dos costumes e da moral, pois fugiriam aos padrões tradicionais dominantes e majoritários de religião, de cultura, de gênero, de sexo, de raça, de origem de nacionalidade, de classe, dando ensejo a toda sorte de intolerância e expressões de ódio e violência, contra muçulmanos, estrangeiros, feministas, ativistas negros, assim como contra o pensamento crítico, que foge aos padrões intelectuais e artísticos costumeiros, dando vazão às perseguições e violência jurídica e mesmo física contra artistas, cientistas, ativistas e intelectuais progressistas, sejam eles liberais ou socialistas.

O tradicionalismo étnico, cultural e espiritual de Trump parte do entendimento dos valores a partir de uma perspectiva rígida e homogeneizadora, em defesa intransigente e agressiva destes valores e costumes tradicionais, dando curso ao que Tocqueville, um conservador aristocrático, diria tratar-se de deturpação, degeneração da democracia liberal, originando uma tirania da maioria, avessa à preservação de direitos, liberdades e garantias das minorias. A deslegitimação dos valores culturais das minorias conduz ao ódio contra os entendidos como desviantes da moral e da hierarquia tradicional, negando os princípios do pluralismo e da diversidade, daí o ataque sistemático às populações LGBTQIA+ e aos grupos organizados da sociedade que lutam por equidade racial, social e de gênero.
As questões racial e de gênero também foram alvo privilegiado dos decretos de Trump, que proibiu a presença de palavras que rematam às plataformas de direitos humanos e equidade, dando conhecimento a um glossário de termos vetados, tal qual o Ministério da Verdade de Orwell a polícia de Fahrenheit 451 ou as fogueiras de livros proibidos pelo nazismo ou pela censura brasileira nos anos de chumbo. Livros sobre o feminismo, o racismo ou mesmo o holocausto foram retirados das prateleiras das bibliotecas públicas dos EUA por ordem do governo Trump, que recriou o Escritório da Fé, ligado à presidência e responsável por dar seguimento à guerra cultural e espiritual em defesa dos valores cristãos e contra o que denominam ser uma conspiração esquerdista globalista, o chamado “marxismo cultural”, fomentador de uma imaginária “cristofobia”.
Trump e seu mundo de guerra
O mundo sob Trump é um mundo de guerra, tensão, conflito. Desde a virada do século a perda de poder estratégico, militar e econômico dos Estados Unidos deixava claro o processo de reconfiguração multilateral do poder das grandes potências, tendo na China um polo fundamental de reordenamento da economia global, assim como, em menor grau, a Rússia e a Índia.
Se no século XX, todos os países da América Latina tiveram os Estados Unidos como principal parceiro comercial desde o início do século 21 a China aparece a frente das relações comerciais de praticamente todos os países da América Latina à exceção do Paraguai, da Colômbia e do México em função dos acordos bilaterais e dos interesses econômico estratégico militares dos Estados Unidos na região. Isso demonstra mais uma vez a necessidade de reconfiguração das forças americanas no continente e essa reconfiguração já se iniciou a no final do século passado com a recomposição da quarta frota do Atlântico ou com a ampliação das bases militares Americanas na América Latina é com uma reorientação da política de defesa e de inteligência dos EUA.
Não obstante, o protagonismo chinês superou em muito os esforços americanos de recompor relações econômicas privilegiadas com os EUA, o que, de forma semelhante, também ocorreu em relação aos países africanos e, principalmente, àqueles agrupados pela União Europeia.
A perda de hegemonia
A perda da hegemonia dos Estados Unidos em âmbito Internacional, perdendo a liderança global para a China na esfera econômica e para a Rússia na militar, e ainda sob um panorama de rápido fortalecimento da Índia e enfraquecimento de seus aliados europeus na OTAN vem dissolvendo, desde o final do século passado, o protagonismo estadunidense.
Com a perda relativa de poder dos europeus, especialmente com o colapso de Bretton Woods e da social-democracia e, em contraponto, com o avanço do neoliberalismo, e ainda com a derrocada do socialismo real e da cortina de ferro do Pacto de Varsóvia, se os EUA despontaram, a partir de Reagan, como potência hegemônica global, essa posição, um tanto ilusória, durou pouco. Não faltaram os profetas da inexoraliblidade da democracia liberal, da inevitabilidade do capitalismo e apregoadores do fim da história. Todos embebidos na falsa imagem de força incontrastada do ocidente, liberal, burguês, cristão e branco.
O ressentemiento americano
Desde a virada do século já se anunciava a tendência à derrocada do poder estadunidense. Hoje não resta dúvidas de que a reconfiguração do poder global recoloca pontências em conflito em um ambiente multipolar. A configuração do pós-guerra, bipolar, não faz mais qualquer sentido no mundo atual, a ameaça comunista só existe nas narrativas ficcionais e nas teorias conspiratórias de fanáticos modulados pelas redes sociais e submetidos a altas cargas de desinformação, expressão da dissonância cognitiva coletiva patrocinada pela nova cepa da extrema-direita global.
Trump é símbolo do ressentimento americano, da decadência da classe média nos EUA, da falência do american way of life. A perda de protagonismo dos Estados Unidos é o motor do MAGA de Trump, que procura recolocar seu país na posição de potência imperialista dominante. Para tanto, amplifica o discurso da intolerância, com tom nacionalista e reacionário, um nacionalismo econômico, mas também moral e étnico, em defesa de um neoconservadorismo tradicionalista, patriarcal, masculino e branco, ancorado em uma plataforma favorável a uma guerra cultural e espiritual, em defesa de supostos valores do ocidente judaico-cristão, construído miticamente por meio de uma narrativa homogeneizadora, hierárquica e moralista.
A cosmologia obscurantista
Ao proibir o uso em documentos oficiais de termos civilizatórios e de matriz moderna e iluminista, afeitos aos princípios de tolerância, pluralismo, multiculturalismo, multilateralismo, e resistir a plataformas de igualdade e defesa da razão e da ciência, Trump reafirma seu posicionamento anti-politicamente correto, seu universo de referência é relacionado a uma cosmologia obscurantista, antissecular, anti-laica, afeita a uma plataforma de reencantamento do mundo e da hierarquia social, cultural, sexual e étnica, um movimento claramente reacionário, buscando reconstruir valores supostamente deturpados pela quadratura liberal, socialista, social-democrata, modernista e globalista.
Busca-se destruir o edifício social, político, econômico e moral do presente, entendido como degenerado, e revivificar um mítico e imaginário tempo glorioso e heroico, recobrando um moral tradicionalista, ortodoxa, austera, intolerante, fundamentalista, um passado fictício, afeito às plataformas de disseminação industrial de desinformação, dedicadas a construir verdades alternativas, desprendidas da realidade factual, próprias da pós-verdade produzida em meio ao ecossistema informacional das redes socais.

Esse segundo governo Trump é plenamente alinhado aos interesses das grandes corporações oligárquicas e das Big Techs. Certamente serão os mais pobres aqueles atingidos pelas políticas excludentes de Trump e de sua equipe de engenheiros do caos. O governo Trump é contra os interesses do mundo civilizado e dos países periféricos, quer, ao contrário, reconstruir o imperialismo, agora sob outras bases.
Donald Trump é a representação máxima do agrupamento de todas estas forças reacionárias nos Estados Unidos. Não menos importante foi a associação com os “engenheiros do caos”, como qualifica Giuliano Da Empoli ao tratar das estruturas industriais de desinformação e produção de pós-verdade, a exemplo de Musk, Zukerberg e Besos, e ainda do ideólogo da extrema direita ocidental, Steve Bannon, que voltou a ter influência sobre o governo de Trump.
O tarifaço e a incapacidade da ONU
R.F. Presenciamos posições muito diversas e uma realidade volátil paira em todo o mundo. Quem resiste de verdade as tarifas de Trump e quem não?
J.H.A. É claro que o tarifaço vai impactar profundamente as relações internacionais globais. A China e os Estados Unidos são responsáveis hoje por mais de 40% de toda a movimentação econômica comercial do mundo, quer dizer, qualquer abalo na relação entre essas 2 potências acabar produzindo consequências globais.
Sob a hegemonia americana, a ONU vem sendo incapaz de agir como instrumento de controle às ofensivas militares patrocinadas pelas grandes potências e sem anuência da instância multilateral, tributando-lhe um papel antes simbólico que prático, denotando sua obsolescência face a seus objetivos originários de preservação da paz. Donald Trump deixa claro que o objetivo dos Estados Unidos é reconstruir-se como potência imperialista dominante independentemente e até à revelia dos órgãos multilaterais.
São explícitas suas críticas à ONU, à OMS, à OMC e mesmo à OTAN, que agora, sem financiamento americano, enfrenta uma crise que exigirá esforços imensos dos países europeus para preservarem sua segurança em um ambiente internacional de tensão e escalada da violência militar e do expansionismo, como o de Israel em Gaza, da Rússia na Ucrânia e como nas declaradas intenções de Trump de anexar a Groenlândia, o canal do Panamá e até mesmo o Canadá.
Neste contexto, a União Europeia mais uma vez vem demonstrando incapacidade de fazer face a uma perda sistemática de protagonismo político, econômico e estratégico-militar, o que já vem de muitos anos. A incapacidade de dar curso a uma solução na Ucrânia é apenas um pequeno demonstrativo da perda de poder relativo do ponto de vista estratégico dos países da União Europeia, enfraquecidos com a crise econômica, a inflação e o impacto da saída do Reino Unido do bloco econômico. A França é exemplo da fragilidade europeia, que apostou na globalização dos mercados e agora enfrenta o desafio urgente de garantir energia, suprimentos e matérias-primas para suas indústrias.
A crise ucraniana deixou à vista o alto grau de dependência dos países da União Europeia em relação à Rússia e à China, sob o impacto na oferta do petróleo, do gás e de produtos agrícolas oriundos do leste europeu. Não há saída de curto prazo para a Europa. O custo de manutenção dos investimentos militares da OTAN após a retirada de financiamentos dos Estados Unidos, seu principal patrocinador, acaba esvaziando a força da Organização militar e, por consequência, da própria União Europeia. A Europa como um todo saiu do centro do palco do poder mundial, que agora pende para as grandes potências do oriente, a China, a Índia e a Rússia.
O reality show de Trump
O mundo está em grande em grande medida perplexo, porque as medidas erráticas do governo Trump mostram uma grande impetuosidade, mas também a falta completa de institucionalidade na tomada de decisões com reflexos intensos para todo o mundo. As definições de tarifas sem quaisquer explicações técnicas minimamente coerentes ou transparentes no tangente aos procedimentos para o estabelecimento de alíquotas deixa transparecer impulsividade personalista e passional, contraditando um longuíssimo histórico do país na condução de suas políticas-econômicas exteriores, marcado pelo equilíbrio, pela racionalidade e moderação diplomática, tendendo a privilegiar o diálogo com parceiros comerciais e o multilateralismo.
A consequência das ações impulsivas de Trump produzem um cenário de irresponsabilidade, instabilidade e imprevisibilidade. Em um dia impõe tarifas altíssimas, no outro recua, em um terceiro, retoma o tarifaço e com ainda mais ímpeto agressivo, claramente convocando os parceiros, particularmente a China, à guerra comercial. O comportamento errático, radical e irrefletido de Trump não produzirá poucas consequências. Os EUA rumam para um relativo isolamento diplomático, para uma recessão e um aumento rápido do custo de vida e da inflação, o que exigirá um aumento dos juros e, consequentemente, uma ampliação do esforço de ajuste fiscal, isso em um contexto de queda de investimentos, venda de ações do tesouro e possível redução da arrecadação fiscal. O contexto parece indicar o caminho de um panorama de crise profunda nos EUA, contudo, é muito cedo para vaticinar as consequências de médio e longo prazos das políticas tarifárias de Trump, pois ainda não sabemos quando ou em que patamar se estabilizará a onda de elevação da tributação aos importados.
Mesmo que sua economia mantenha-se forte, em face da enorme participação dos EUA no comércio global, Trump está tratando a economia mundial como se fosse um reality show de televisão ou um jogo de truco, ameaçando, blefando e dobrando suas apostas. Esse padrão personalista de gestão, sem qualquer ponderação técnica, gera incerteza, instabilidade e imprevisibilidade nos mercados. Desde a crise de 1929 não se vê tamanha imprevisibilidade na economia estadunidense e suas consequências futuras são hoje incertas, embora seja mais que certo o fato de que o tempo da política e da diplomacia estabelecido no pós-Guerra chegou ao fim. Os mercados especulativos estão em polvorosa porque não há qualquer segurança sobre o futuro.
A cadeia produtiva industrial
A tarifação dos produtos chineses vai impactar toda a cadeia produtiva industrial dos Estados Unidos, vai gerar inflação como os americanos nunca viram na sua história. Os Estados Unidos já vivenciou nos últimos anos taxas de inflação muito acima dos mais elevados padrões históricos de sua economia. Agora, com o tarifaço, a inflação deve bater novos recordes. Trump está alimentando um isolamento dos Estados Unidos negando o multilateralismo. Vai produzir como consequência inexorável um aumento do custo de vida, o que vai impactar negativamente as famílias da classe média baixa do meio oeste americano, do cinturão da ferrugem, de onde Trump recolheu parte expressiva de seus votos. No curto prazo, esta política econômica vai produzir ainda mais desigualdade e pobreza nos Estados Unidos.

Não sabemos ainda até que ponto esses processos de tensão nas arenas econômica e política estratégica vão se dar, porque não estamos falando apenas da de um tarifaço, mas de uma reorientação completa dos Estados Unidos na órbita internacional e o questionamento aberto da legitimidade e relevância das organizações multilaterais. O papel que a OMC vai assumir agora pode ser decisivo para selar seu futuro, sua autoridade internacional será colocada em cheque. Veremos nos próximos momentos até que ponto as organizações multilaterais construídas após Bretton Woods, como a ONU e o GATT/OMC serão capazes de enfrentar os novos desafios internacionais impostos por uma ordem marcadamente influenciada por um antipluralismo imperialista, hierárquico, autoritário, violento, anti-humanista e antissocial.
R.F. Como qualifica o comportamento do Brasil frente às medidas dos Estados Unidos?
J.H.A. Nesse cenário é positivo para o Brasil estar bem posicionado nos BRICS, pois uma reconfiguração global do poder, da influência e da economia pode favorecer a ampliação dos negócios com a África e a Ásia em contraponto ao protecionismo tarifário estadunidense. Outro resultado praticamente inexorável desta política agressiva de Trump diz respeito à tendência de aceleração dos processos de substituição do dólar como moeda internacional der troca.
A especulação dos EUA gera instabilidade cambial na periferia, que pode preservar suas reservas internacionais e seu poder de compra de importados por meio de pagamentos em moedas nacionais de seus parceiros, como o Brasil já vem defendendo há algum tempo e vem suscitando este debate no Mercosul e no Banco dos BRICS. Agora é hora de a Rússia e a China, que já vêm comercializando com suas moedas próprias, acelerarem seus processos de reforma do mercado internacional de câmbio, o que pode ser uma grande oportunidade para o Brasil diminuir a dependência de reservas em dólar, tornando o câmbio do país suscetível aos arroubos especulativos e aos solavancos da economia dos EUA.
R.F. A guerra tarifária é apenas um aspecto de um novo poder global?
J.H.A. Estamos em face de uma hecatombe nas relações internacionais e também nas relações internas estabelecidas historicamente na sociedade estadunidense, baseada na democracia, a qual vem sendo forte e rapidamente corroída por Trump. Essa corrosão, contudo, é sustentada pelo apoio de uma base social ampla e que garantiu a esse líder reacionário não apenas uma votação acachapante, mas uma vitória integral nas últimas eleições presidenciais e parlamentares. Com ampla legitimidade política e eleitoral, com maioria na Câmara e no Senado, contando com uma maioria conservadora na Suprema Corte, Trump tem sob seu controle instrumentos suficientes para levar a cabo políticas anticivilizatórias e que reconfigurem por completo o panorama do poder global.
Não se vislumbra um horizonte de paz, a guerra tarifária é apenas a ponta mais aparente de um movimento de profunda mudança em curso no mundo contemporâneo e agora fortemente acelerado por Trump.
Sinal preocupante
R.F. Então, que futuro percebe nas relações multipolares a partir desta realidade?
J.H.A. Neste momento, quem disser que sabe o que acontecerá ou está mentindo ou está muito mal informado. Não há imagem de um futuro previsível no horizonte. Só se sabe que as potências, que já vinham em uma corrida armamentista velada desde o início do século, agora não têm mais motivos para não deixarem claras suas intenções perante outras potências, as chancelarias, neste ambiente, perdem espaço para as expressões militares de força. Como vaticinava Clausevitz, quando acaba a política, começa a guerra. A política parece estar em risco, as organizações multilaterais estão buscando o diálogo em um contexto de tensão crescente e cada vez maior fragilização das políticas de cooperação e paz.

Os cenários futuros não autorizam sugestões conducentes à cooperação, ao contrário. O clima de agressividade entre as potências globais não encontra paralelo desde a II Guerra, o que não é bom sinal. Ainda é cedo para saber se o líder reacionário vai atingir seus objetivos, não obstante, hoje ninguém duvida do fato de que o mundo que conhecemos até agora não será o mesmo depois do terremoto Trump.
José Henrique Artigas de Godoy é Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP) com mestrado em Ciência Política, aperfeiçoamento em Comunicação Social e graduação em Ciências Sociais pela mesma Universidade de São Paulo (USP). Atualmente é professor associado do Departamento de Ciências Sociais (DCS) e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política e Relações internacionais (PPGCPRI) do Centro de Ciências Humanas Letras e Artes da Universidade Federal da Paraíba (CCHLA-UFPB). Desenvolve trabalhos em áreas de fronteira, envolvendo as Ciências Sociais, a História e a Economia, abarcando temas como o Pensamento Social e Político Brasileiro, política econômica e políticas públicas. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Pensamento Social e Político Brasileiro (ARIADNE) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Coordenador da Área Temática de Pensamento Político Brasileiro da Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP) e Coordenador do Grupo de Trabalho de Teoria e Pensamento Político da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciências Sociais (ANPOCS).
Raul Fitipaldi, é jornalista e apresentador, cofundador do Portal Desacato e da Cooperativa Comunicacional Sul – @raulfitipaldi