O maior ataque recente à “democracia brasileira” não foi o “8/1”, nem as explosões na praça dos Três Poderes; mas o golpe de 2016

Não se trata de “passar pano” para bolsonaristas, mas contextualizar os acontecimentos recentes.

Foto: O Sul

Por Francisco Fernandes Ladeira.

No Brasil em que o fascismo saiu da coleira, a cada dia temos uma nova notícia de alguma ação inconsequente de um bolsonarista. A notícia da vez foram as explosões na praça dos Três Poderes, protagonizadas pelo chaveiro Francisco Wanderley Luiz, conhecido como “Tiu França”.

No campo bolsonarista – a partir das habituais fake news e realidade paralela – foi construída a narrativa de “ato de um lobo solitário”, insinuando que Tiu França cometeu suicídio, não tendo nenhum tipo de motivação ideológica. Os mais ousados falaram em “atentado de bandeira falsa”, articulado pelo STF com o PT.

Na grande mídia, o fato foi relacionado aos acontecimentos de 8 de janeiro de 2023 – quando bolsonaristas realizaram um quebra-quebra nos prédios dos Três Poderes –, noticiados na época como “maior atentado à democracia desde o fim da ditadura militar”.

De fato, o bolsonarismo não tem o menor apreço pela democracia, ou qualquer outro valor civilizatório. Além disso, como todo movimento de caráter fascistóide, deve ser combatido.

No entanto, a narrativa de maior atentado à democracia – atribuído ao 8 de janeiro e seus desdobramentos, como as recentes explosões em Brasília – esconde uma obviedade (que os discursos midiáticos, convenientemente, ocultam).

O maior atentado recente à democracia brasileira não foi protagonizado pelo bolsonarismo; foi o golpe de 2016, contra a presidenta Dilma Rousseff (e não vou nem entrar no debate sobre todos os limites da chamada “democracia burguesa”, como o que temos aqui no Brasil).

Não se trata de “passar pano” para bolsonaristas, mas contextualizar os acontecimentos recentes. O golpe de 2016 (bem como o antipetismo que o alimentou) permitiu que todo tipo de obscurantismo saísse do esgoto, desde que fosse para atacar o Partido dos Trabalhadores e seus principais nomes. Como diziam: “o importante era tirar o PT”. Ironicamente, grande mídia e judiciário (dois alvos preferenciais da raiva bolsonarista) tiveram papéis fundamentais nesse processo.

Portanto, sem o golpe contra Dilma Rousseff, muito provavelmente o bolsonarismo não teria a força atual, e malucos como os protagonistas do 8 de janeiro e o Tiu França limitariam seus devaneios à militância de internet; não seriam empoderados para chegar às vias de fato.

Brecht dizia que a cadela do fascismo está sempre no cio. No Brasil, ela foi retirada da coleira para morder o PT, não quis voltar, e agora morde quem a soltou. Lembrando uma declaração de Lula, feita em 2017, “plantaram Aécio e estão colhendo Bolsonaro, subproduto do ódio”.

Em suma, a mídia hegemônica chocou o ovo da serpente bolsonarista e agora nega a maternidade. Como aponta o dito popular: “filho feio não tem pai”.

Francisco Fernandes Ladeira é Doutor em Geografia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Licenciado em Geografia pela Universidade Presidente Antônio Carlos (Unipac). Especialista em Ciências Humanas: Brasil, Estado e Sociedade pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Mestre em Geografia pela Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ).

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