Por Daniela Arrais.
O machismo mora naquela piada sem graça que chega pelo WhatsApp e deixa o resto do grupo em silêncio, constrangido.
Também mora em diálogos esquisitos com um cara que você viu por cinco minutos e, na segunda oportunidade, dispara: “Quero constituir família com você”.
Essas frases não são apenas o começo de um texto, mas duas situações que vivi recentemente e que me deixaram profundamente incomodada.
Vou focar na primeira, que aconteceu durante um curso que eu fiz. Estávamos na fase de edição de um vídeo quando surgiu a necessidade de captar mais imagens de cobertura. No WhatsApp, um aluno sugeriu gravar no metrô da Luz, na hora do rush. Um outro respondeu: “Eu topo ser o operador da GoPro… Até porque as mãos ficam livres para bolinar as minas no cheião do metrô…”
Não dava pra acreditar. Eu realmente li aquilo ali? Esperei alguém falar qualquer coisa. Silêncio. Resolvi me pronunciar, horas depois. Falei que aquilo era uma ofensa a todas as mulheres.
Sugeri a leitura do texto “Feminismo para homens“, um curso rápido e citei o seguinte trecho: “Para os homens, não basta simplesmente não estuprar: é preciso não alimentar a cultura do estupro. A violência contra a mulher não acontece num vácuo: ela é possibilitada por todo um contexto de piadas machistas, de objetificação feminina, de controle do corpo da mulher. Quem cria esse contexto somos todos nós, os homens. Somos todos cúmplices”.
O cara pediu desculpas, os outros colegas começaram a falar que ele tinha vacilado. Achei bom, mas meu feeling dizia que a história não ia parar aí.
À noite, na aula, ele falou que gostava de briga e que adoraria passar a madrugada brigando comigo. Isso em um tom jocoso, insinuando uma briga na cama. Meu sangue ferveu.
Ele sentou ao meu lado, encostando, e disse que era pra provar que não queria brigar. Comecei a tremer – e a tentar disfarçar. Ele falou que não entrava em briga pra perder. Perguntei: “Você está me ameaçando?”. Ele disse que não e acrescentou que se fosse o caso eu não teria chance de me defender.
Ninguém falou nada. Pelos 40 minutos seguintes, engoli o choro enquanto tremia. Fiquei duplamente arrasada. Pela agressão sofrida e pela falta de solidariedade – e também de sororidade.
Quantas vezes a gente passa por situações assim? Até quando? Quem serve de plateia pra piadinha imbecil? E por que essa plateia se cala? Ninguém quer briga, né? Se for no Face, ok. Ao vivo, melhor entrar pra turma do deixa disso.
Essa não é a minha turma, e as muitas perguntas rondam minha cabeça desde então.
De ação concreta, reportei o incidente à escola. Se vai acontecer alguma coisa? Não sei. Só sei que tenho certeza de que em todas as futuras vezes que uma merda dessas acontecer eu vou responder, argumentar, brigar se for preciso.
Chega de silêncio diante dessa falta de pudor de certos caras que acham que podem falar qualquer coisa, basta dar um risinho que tá tudo resolvido.
Chega de silêncio diante do silêncio dos outros também. Na minha frente não.
Fonte: Brasil Post