Por Patricia Faermann.
Não é só o Brasil que parou para acompanhar o julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) na manhã de hoje (24). Jornais do mundo inteiro anunciaram as expectativas que afetam o cenário do país latino-americano, em ano que o próximo a comandar a política e economia da nação brasilera é interesse e pauta global.
Não à toa que 54 dos 300 jornalistas credenciados para acompanhar o julgamento em Porto Alegre são correspondentes internacionais: quase um quinto do total. Artigo do The New York Times intitulado “Democracia brasileira empurrada para o abismo”, publicado pelo pesquisador Mark Weisbrot ainda ontem, dava o tom da importância.
“Esta semana, essa democracia pode ser mais corroída, quando um tribunal de apelação de três juízes irá decidir se a figura política mais popular do país, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores, será impedido de disputar as eleições presidenciais de 2018, ou ainda ser preso”, escreveu.
Na manhã de hoje, antes mesmo do início do julgamento, a manchete estampava os principais periódicos de todos os países.
“O Brasil está se preparando para uma decisão judicial histórica que poderia derrubar o líder mais popular da história brasileira moderna de uma eleição que ele está atualmente preparado para vencer – e pode se tornar devastador para o Partido de Trabalhadores que ele fundou”, introduziu da capital gaúcha o correspondente Dom Phillips, do jornal britânico The Guardian.
Na França, o Le Figaro mirou a responsabilidade dos desembargadores do TRF-4: “Três juízes de um Tribunal de Recurso do sul do Brasil têm diante deles certamente o julgamento mais difícil de sua carreira. (…) O que está em jogo: uma possível inadmissibilidade da figura emblemática da esquerda na eleição presidencial de outubro, que ele é o favorito. Este seria provavelmente um jogo final para o homem que dominou a política do Brasil nas últimas duas décadas.”
“Palácio ou Prisão para Lula”, apontou Von Borin Hermann, direto do Rio de Janeiro, para o alemão Süddeutsche Zeitung, no início da manhã. Mas a análise do diário foi um pouco além do comum, especulando, inclusive, se o ex-presidente com viagem marcada à Etiópia na próxima semana se tornaria o primeiro ex-chefe de Estado na América Latina a fugir de uma condenação.
Ao negar o próprio questionamento, os estereótipos marcaram a resposta do jornal alemão: “Há duas respostas a isso. Primeiro, Lula não é alguém qualquer, mas talvez o brasileiro mais famoso que não ganha dinheiro com o futebol. Assim, ele não poderia se esconder. Em segundo lugar, simplesmente não seria seu estilo. Lula, de 72 anos, já anunciou que sua campanha eleitoral presidencial continuará, não importa o que os juízes decidam na quarta-feira”.
Na página principal do outro jornal alemão Spiegel, um relato mais objetivo do que se via nas ruas de Porto Alegre na manhã de hoje, pela visão do repórter Jens Glüsing, na matéria “A Batalha de Porto Alegre”.
“Milhares de apoiantes de seu partido de trabalhadores esquerdistas vieram a Porto Alegre nos últimos dias para apoiar seu ídolo. Grupos de direita também marcharam, eles gostariam muito de ver Lula na prisão. A atmosfera está tão aquecida que conflitos violentos não podem ser descartados. Os jornais brasileiros já alertam sobre a ‘Batalha de Porto Alegre’.”
No The Washington Post, as norte-americanas Anna Jean Kaiser e Anthony Faiola viram no julgamento a mobilização nacional, contra e a favor de Lula, mas chegaram a comparar o caso de Lula com o do atual mandatário Michel Temer, que foi absolvido pela Câmara dos Deputados, e até mesmo com “abusos fiscais” que teriam gerado o impeachment de Dilma, em “uma nação exausta por escândalos políticos sem parar”.
O El País divulgou em sua versão europeia e da América Latina a transmissão ao vivo. “As acusações são sobre um apartamento em uma praia em São Paulo, de propriedade de uma empresa que fazia negócios com o governo Lula (2003-2010) e que, supostamente, havia dado ao político. Mas, para muitos, esse julgamento tem entendimentos políticos e procura julgar a honestidade e a personalidade de quem foi a referência da esquerda em toda a América Latina”, disse o jornal em sua introdução.
“Não há um plano B”, disse um parente de Lula ao diário francês Le Monde. “Aos 72 anos, Lula, que é indestrutível, cuja vida se funde com seu compromisso político, não está pronto para jogar a toalha, mas para desafiar a Justiça até o fim. O seu carisma e gênio político chegaram a tornar o tema de um sucessor algo problemático”, disse.