Por Raul Longo.
Oceanógrafo, socialista e judeu, meu hóspede comenta como foi difícil sua formação ao longo da vida, pelo estigma da religião que confundem com etnia: – Judeu não é etnia. O antissemitismo aplicado aos judeus é uma estupidez enorme. Não existe o judeu-alemão, o judeu-polonês o judeu-russo. O que existe é o alemão de ascendência semita que professa o judaísmo, o italiano de ascendência semita que professa o judaísmo, o brasileiro de ascendência semita que professa o judaísmo. Assim como existem semitas cristãos e semitas mulçumanos. Pergunto se sofre muita discriminação. Confirma, mas revela: – Muito mais entre os judeus do que entre cristãos. No Brasil, cristãos e não judeus em geral não sabem reconhecer nomes de judeus. Mas judeus sem dúvida, claro que te reconhecem no primeiro declinar do nome de família. E com muito maior acuidade distinguem logo se você é um judeu rico ou pobre. Todo judeu pobre é discriminado. Questiono sua situação social: professor universitário não é exatamente um pobre: – A distinção é diferente. Não se julga a condição de vida, mas os meios pelos quais foi alcançada e é mantida. Eu poderia ter uma condição financeira ainda inferior e seria auxiliado se minhas convicções de obtenção de fortuna corresponde-se às dos judeus de famílias que se tornaram ricos ao longo da história. Não foi o caso de meus ancestrais e para que futuramente o nome de minha família venha a ser integrado sem discriminação entre os judeus, seria preciso que me tornasse rico através dos meios que consideram como indicadores de proficiência. Se ganhasse na loteria e por isso me tornasse milionário, talvez deixasse de ser tão discriminado, mas eu e meus filhos sempre seríamos olhados com desconfianças pelos demais judeus. Cogito pela possibilidade de se dar por não professar a religião: – Isso pode agravar ainda mais, mas não é o determinante. Rabinos pobres são igualmente discriminados. Reporto ao que disse antes e retomo a questão religião x etnia, considerando que, como ateu, deixou de ser judeu: – Não é tão simples. Assim como veladamente se imputa à Marx o “crime” de ser judeu para justificar a razão de seu ateísmo e estruturação sócio/política do comunismo, os judeus também imputam à Marx o “crime” de ser pobre para justificar seus ideais. E Marx é tão execrado entre judeus capitalistas quanto entre capitalistas não judeus. Menciono que no cristianismo e outras religiões coincidem princípios de igualdade e união entre os humanos, similares aos pretendidos por Karl Marx: – O judaísmo é tão hipócrita quanto qualquer outra religião. Como em todas, também no judaísmo há os que de fato se pautam pelos princípios básicos originais de Buda, Cristo ou Maomé. Mas as elites do sacerdócio os utilizam para conduzir, condicionar e induzir à maioria dos crentes a acreditar no que praticam ao inverso. Quero concluir que ao menos não seja tão discriminado entre cristãos: – Não é verdade. Apenas enquanto não distinguem minha ascendência e a confundem com a dos árabes. Somos todos semitas e as semelhanças físicas só se diluem quando os ancestrais de nossas famílias se miscigenaram com etnias dos povos europeus. Concluo que afirme maior identificação semita entre os povos árabes e que no Brasil o preconceito contra o islamismo seja menor do que contra o judaísmo: – Evidente. E não apenas no Brasil. Apesar de disseminado pela Igreja Católica a partir da expulsão dos mouros da Península Ibérica, três fatores inviabilizaram os mitos criados contra os muçulmanos. Primeiro porque poucos árabes se mantiveram na Europa e seus descendentes já eram fruto de 8 séculos de miscigenação, o que não ocorreu entre hebreus por determinações do próprio judaísmo para manutenção de uma identidade que hoje se busca através no sionismo, estreitamente identificado ao nazismo exatamente na concepção da pureza e superioridade racial. Esse fator que contribuiu para a evolução dos tantos mitos criados pela Igreja Católica contra os judeus, hoje é utilizado contra os árabes pela mídia internacional, manipulada pelos judeus. Mas é difícil personificar uma identidade árabe, pois mesmo religiosamente, ainda que todos maometanos, são bem mais diversificados. O segundo fato é que por mais que a Igreja tenha insistido no ódio dos mulçumanos aos infiéis, a verdade é que judeus e cristãos nunca foram tão respeitados em suas tradições religiosas como durante os séculos da ocupação moura que protegeram a ambos contra a violência e ganância de nobres e clérigos cristãos, permitindo completa liberdade religiosa. Por último, por toda a Península Ibérica ainda sobrevivem documentos arquitetônicos e literários documentando as contribuições cientificas, técnicas, artísticas e culturais numa Europa obscurantista e inculta onde qualquer evolução ou descoberta era compreendida como diabólica e condenada à morte. Concordo, lamentando a crença de que procedemos exclusivamente da cultura greco-romana e considerando que a maior parte dos saberes da civilização ocidental provêm da cultura árabe. Aproveito para perguntar sobre a contribuição dos semitas judeus à formação da cultura européia: – Além das finanças e ciências econômicas, estivemos presente em todas as demais das mais profundas evoluções alcançadas sobretudo nos séculos XIX e XX. Mas essas contribuições já vêm muito antes, viabilizando aos ocidentais conhecimentos desenvolvidos em conjunto, por semitas árabes e judeus. As cortes cristãs não tinham pessoal qualificado para isso. E se meses depois da expulsão dos últimos árabes, Colombo pôde chegar à América através da navegação desenvolvida através dos conhecimentos dos beduínos dos desertos e dos fenícios, todos árabes, foi porque os judeus ajudaram a organizar e levar a cabo empreendimento então tão temerário e detalhista quanto, hoje, uma excursão intergaláctica. Quero saber se lhe parece impossível derrubar o mito de que árabes e judeus estejam envolvidos numa milenar e eterna guerra fratricida: – Depois do fracasso de Napoleão e da falência do Império Britânico ficou claro que é preciso uma justificativa para os interesses de domínio mundial através do poder das armas. Os nazistas aventaram o mito da superioridade racial exatamente entre um povo de múltiplas origens. Alemães não são apenas germânicos, mas também bávaros, suevos, hunos, etc. Para alimentar esse mito de identidade racial, precisaram criar um contraponto. Não se cria o mito da superioridade masculina, se não houver um contraponto de inferioridade, por mais falso que seja. Todo mito precisa de seu inverso, por mais insólitos. O antagônico é tão essencial à mentira quanto sua repetição por mil vezes. Entendo que o antagonismo ao povo palestino trata-se de um planejamento com fins específicos e perdurará até a ocupação total da Palestina, e explica: – Nos anos 50/60 muitos judeus, mesmo antissionistas, se indignaram contra os árabes, pois nos era claro ser plenamente possível convivermos na Palestina sem prejuízo para nenhum dos lados e até com muitas contribuições àquele povo já tão massacrado pelo Império Britânico e também por alguns dos vizinhos árabes. Além de que, mesmo em maioria islâmicos, há palestinos judeus e muitos são semitas de origem judaica que no decorrer dos séculos assimilaram outras influências religiosas, mas preservaram diversos costumes que nos judeus se diluíram pelas influências adquiridas por onde se dispersaram. Hoje, na distância do tempo, podemos perceber as razões da reação árabe contra a criação do Estado de Israel. Não há como mentir que o modelo sionista é o nazismo. Adotou-se o mito de superioridade racial para unificação dos tantos povos que formaram a Alemanha, para dessa vez unificar a dispersão da cultura judaica. E, repetindo-se o método do modelo, o povo palestino tonou-se o mito antagônico. É só nos perguntarmos se o objetivo único e final de Hitler era apenas o de que o povo alemão se acreditasse superior a todos os demais? Apenas exterminar os judeus e depois disso não promoveria novos genocídios? Se limitaria às fronteiras da Alemanha, anexando apenas a Eslováquia? Ou apenas a Polônia? Talvez somente a França? Muitos militares de alta patente do exército de Israel, que naquelas décadas de formação do Estado lutaram contra árabes entendendo-os incapazes de ceder um espaço de que não tiravam proveito, adquirido por um parente escorraçado e profundamente maltratado em outras terras. Hoje, esses mesmos militares compreendem e dão razão aqueles árabes, pois é inegável que os sionistas não pretendem apenas estabelecer europeus que ainda professavam a religião judaica. É muito claro que se tratou de um planejamento geoestratégico de ingleses e norte-americanos, para atender seus interesses na região de maior produção petrolífera do mundo. E para isso reproduziram o modelo nazista no Oriente Médio a troco do financiamento da recuperação da então combalida economia mundial. A II Guerra foi provocada exatamente pela fragilidade da economia mundial que ensejou aos nazistas a possibilidade de ressurgirem da derrota na guerra anterior como donos do mundo. Após a quebra financeira que tão profundamente afetou a economia norte-americana na década de 30 e dos enormes gastos com a maior guerra da história, como em tão curto espaço de tempo os Estados Unidos se torna a maior economia do planeta? Todos os países envolvidos, dos dois lados, enriqueceram. Com que milagre se deu a espetacular recuperação do devastado Japão e da própria Alemanha? Despojos de guerra não justificariam tão pronto crescimento dessas economias. Uma guerra daquela magnitude dependia de um efetivo financiamento tanto no seu transcorrer quanto após o conflito com o qual alguns grupos arrecadaram enormes quantias. Nenhum integrante desses grupos se transferiram para Israel, mas foram os que negociaram o território. Se apenas para alojar os sobreviventes de guerra e seus parentes e quem se interessasse em emigrar da Europa, se gastaria muito menos em ações que conscientizasse o povo palestino das vantagens da nova vizinhança. Assim como hoje a maioria do povo basco se indispõem com os separatistas do ETA, os próprios palestinos poderiam conter seus radicais e fundamentalistas religiosos. Mas o que se fez foi o inverso. O Estado de Israel perseguiu e persegue todo judeu que proponha o convívio pacífico. De ambos os lados já se matou muitos líderes pacifistas como Rabin. O assassinato de Itazak Rabin é a demonstração clara de que a paz é possível, mas a paz jamais seria possível no mundo sem a erradicação do nazismo. A morte de Rabin é a evidência de que quando erradicarem o sionismo, judeus e palestinos poderão conviver pacificamente, pois não haverá o antagônico para justificar fundamentalismos de ambos os lados. No entanto, para isso é preciso eliminar primeiro os mantenedores do sionismo e esses não são judeus ou de religião alguma, não estão preocupados com qualquer povo ou cultura. Como Hitler, esses somente se interessam em ampliar domínios além de quaisquer fronteiras e para isso apenas despendem esforços em criar mitos e antagonismos. E o povo de Israel é tão usado quanto o povo palestino, pois o dia em que árabes impedirem que continuem manipulando-os e se unirem… Ou a Turquia, onde crescem os fundamentalistas islâmicos, pender para o lado contrário ao dos manipuladores da Europa, os judeus sofrerão um segundo holocausto com a diferença de que dessa vez será justificado pelos sionistas. Tampouco os palestinos serão beneficiados por isso, mas aos judeus se lamentará tanto quanto hoje se lamenta os carrascos nazistas. Não foram exatamente estas as palavras do hóspede, mas foi tudo o que conclui de nossa conversa momentos antes de receber o link abaixo pelo meu correio eletrônico. Vejam só que coincidência:
A notícia que o resto do mundo não viu (?)
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