O insustentável peso do agora

Por Guigo Ribeiro, para Desacato.info.

Não quero cantar acompanhado das vozes em coro do agora. Assim como desejar a dança, a roda formada pelas mãos de falsos pudores, moral e retorno. Pra quê? Se de tanto pensar, a cabeça chega a doer. Doer em um instante que o concreto se rompe e nos joga para o poço triste do lugar comum. Talvez a ideia central fosse o cultivo de flores e pensando nestas empregamos (empregaram) tanto suor. Com todo o processo necessário. Sementes, amor, papos sobre como serão. E agora? O inverso. A consolidação de um espetáculo triste e ovacionado. A avenida em amarelo acompanhada de êxtase da quase competição esportiva. O carnaval pulado exaltando os senhores da tortura. Nem se faz possível apontar a gigantesca contradição frente às marcas deixadas nos exaltadores pelos exaltados quando pelo excesso, ou qualquer outra coisa, acharam por bem uma amostra grátis do método. O homem da dicção não trabalhada com seu sorriso despertado pelos gritos de “mito”. Assim como todas suas diretas colocações sobre como pensa e quer fazer seu poder. Assim como explicita sua marca, forma. Assim como as determinadas botas do abuso que ilustra. Sua forma de urubu (que me perdoe a ave e sua importância) talvez explique sua ânsia por comer gente. E seguindo este caminho – com tantas placas de “PARE” para fins de sanidade – a livre sequência de atuação do homem e suas acusações protocoladas por puro protocolo e silêncio sobre o voo de um tanto de acelerador de psique. Entre outros e outros e outros. Entre a naturalidade posta de sua ideia afim de resolução: MATAR. Ou o estrangeiro que usa de seu império e é pressuposto de proteção econômica de uma elite pautada em sua continuação da exploração. Ou a frágil e enigmática certeza em sua fala. Há diversas e nítidas amostras de suas opções, ideais. Há ainda o grupo que mistura numa mesa para a farta santa ceia bíblia e bala, tratando de forma preocupada os rumos das opções dos outros. Jesus pregando na cruz suas não concordâncias e apresentando o peso da mão no rosto de quem opta por ser o que se quer. Um representante de Jesus em confronto com as palavras de uma mulher que o acusava de estupro e o escândalo do silêncio envolvendo a pauta. Ela tida como louca e o servo de Cristo descansando a imagem. Silêncio! Esquecimento! Outro dia um moço dos sorrisos dos sábados à tarde ensaiava brincar de política. Estima-se que optou por um método intensivo de aprendizagem com demais políticos que brincam de política. Após discutir propostas e lucros, banhou-se nas próprias lágrimas ao constatar que não seria o Messias da nação. O jogo é jogado por anos em uma sequência de acentos e, especificamente neste momento, sem estratégia bem definida e causa, logo, sem um porque, estes acentos seguirão preservados.

Quem anuncia a chegada do ontem? Quando foi tão visível as marcas da instabilidade do que fora construído? Afinal, natural e certa alguma utopia junto ao nosso pão de cada dia. Fato discutível só pela abertura para tal. Quem sou eu e você neste todo? Neste mar de contradições? Junto com uma querida, me lembro de determinado dia jogarmos uma questão que tomou os ares e estourou sem resposta. A questão era bem simples e nasceu sobre a necessidade de algo não estar imerso à cegueira vigente e atuar, quem sabe num ato heroico, sobre todo este instante. Dentre tantos pesos, a certeza maior que me dá bom dia em todas manhãs é a certeza do explícito cinismo apresentado frente ao decidido. Não discutido, conversado. A premissa do Estado democrático é um sonho em que somos acordados em tantos instantes da noite, tarde, manhã e acordado entre cavalheiros rumando para o que almejam.

Repito: Não quero cantar acompanhado das vozes em coro do agora. Não quero adentrar o quarto da desilusão ao mesmo tempo em que descanso na cama. Não farei da notícia da fome o motivo para o “eu avisei”. Por certo, essa ponte não dá acesso, caminho, não permite chegada. De tantas formas e meios, qual não esbarrará na caneta do poder, assinando documentos que atestarão meu desencaixe frente ao que é instituído? Qual grande lugar de produção de notícias não está a postos para legitimar as decisões? Todos são juízes. Todos condenam. A notícia condena, espalha, desorganiza. Todos são juízes!

O agora está posto em nosso rosto e, se olhar sem muita atenção, verás o sorriso. Verás um mar de possibilidades e o quão estas são direcionadas especificamente para todos lados, no entanto, brutalmente desproporcionais. Conscientemente desproporcionais. A culpa no outrora funcionou bem e alguns muitos ainda insistem nesta conclusão. Todo dia, de forma rápida, há uma grande mudança no agora. Uma grande decisão. E o mais conflitivo: decisão tomada para e por alguns.

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Arte: Tali Feld Gleiser, com base no livro de Milan Kundera.

[avatar user=”Guilherme Ribeiro de Santana” size=”thumbnail” align=”left” /]Guigo Ribeiro é ator, músico e escritor.

1 COMENTÁRIO

  1. Parabéns. Ótima crítica ao cenário atual. De forma poética denunciado a patética situação das coisas.
    Inclusive a crítica ao braço curto exaltado do “eu avisei”.

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