O império ataca de novo

 Por Neil Clark.

O império ataca de novo e agora com neocolonialismo mais destrutivo e mais desonesto.

Neste mês há alguns aniversários significativos da luta contra o colonialismo do velho estilo. A questão é que este colonialismo não desapareceu depois de os países em desenvolvimento se terem tornado independentes das grandes potências europeias.

Aquele colonialismo foi substituído por uma nova versão que provou ser mais destrutiva e incomensuravelmente mais desonesta do que a que existia antes. Pelo menos o Império Britânico, que no seu máximo cobria quase um quarto da superfície terrestre do globo, dava-se a conhecer como um Império. Atualmente o mais sombrio Império Global do Capital-Financeiro Monopolista não o faz.

Países inteiros tais como Iugoslávia, Líbia e Iraque são destruídos por não se conformarem com as regras que o império impõe, enquanto os que continuam a desafiar as elites neoconservadoras/neoliberais, como a Venezuela, estão sob permanente assédio.

Adicionando o insulto à injúria esta nova onda de colonização, levada a cabo para beneficiar os mais ricos dos países mais ricos do mundo, é feita em nome da “democracia” e “garantia dos direitos humanos” com o apoio entusiástico de muitos autoproclamados “progressistas”. A hipocrisia do imperialismo atual é realmente de nos deixar sem respiração: critica severamente Maduro como sendo um “ditador”, mas saúda os governantes não eleitos da Arábia Saudita assim como lhes vende mortífero armamento pesado.

Maduro que institui a Assembleia Constituinte em conformidade com a Constituição é um vilão, os sauditas açoitam e prendem ativistas pró-democracia…mas são apenas negócios, como de costume.

Nos anos 40 e 50 do século passado, tudo parecia muito diferente. O colonialismo parecia estar em retirada. Há setenta e cinco anos, em 8 de agosto de 1942, Mahatma Gandhi iniciou o Movimento “Quit India” em Bombaím.

Há setenta anos em 14/15 de agosto de 1947, a Índia e o Paquistão tornaram-se independentes do Reino Unido. Há sessenta anos (31 de agosto de 1957) a Federação Malaia (agora Malásia) tornou-se também independente do Reino Unido.

Estas são datas importantes que certamente precisam ser celebradas, porém, a convicção dos progressistas de que a descolonização representaria uma genuína libertação dos países colonizados provou ser extraordinariamente otimista. A Índia e a Malásia podem ter progredido, mas para outras nações os “Ventos de Mudança” foram apenas ar quente. “Independência” significou somente obter os adornos exteriores da soberania nacional: uma bandeira, ser membro da ONU e uma equipa de futebol. O poder económico continuou residindo noutras partes, nos bancos e salas das administrações nas nações mais ricas.

No seu texto clássico de 1965 , “Neocolonialismo, o último estádio do imperialismo”, o grande Kwame Nkrumah, então Presidente do Gana e firme defensor do Pan-africanismo, explicou como o neocolonialismo tinha substituído o velho estilo colonialista. “No passado, era possível converter um país ao qual um regime neocolonial tinha sido imposto num território colonial – o Egito no século XIX é um exemplo. Este processo já não é atualmente realizável” – escreveu.

Para obter o dinheiro necessário a realizar funções sociais nas metrópoles só podia ser dada uma independência formal às colónias, isto significava que o controlo não fosse também entregue.

Os EUA usaram a sua posição como a nação credora número um depois da 2ª Guerra Mundial para acelerar este processo “formal” de descolonização, mas apenas para que eles se pudessem mover para os países anteriormente dominados pela Grã-Bretanha, França, Holanda. Nkrumah cita o exemplo do Vietname do Sul em que o “velho” poder colonial era a França, mas o poder neocolonial eram os EUA.

De facto, os EUA podem considerar-se os pioneiros do neocolonialismo. Enquanto o “velho estilo” imperial dominava o resto do mundo, os EUA usavam técnicas neocoloniais para assegurarem que os países da América Latina subordinavam as suas economias aos interesses dos grandes negócios dos EUA. A elite financeira e do grande capital dos EUA toma atualmente como alvo o governo de esquerda de Maduro na Venezuela para a “mudança de regime” tal como em 1913 o embaixador no México, Henry Lane Wilson conspirava com o general Huerta contra a orientação esquerda de Madero.

Isto foi um padrão que se repetiu inúmeras vezes nos 100 anos seguintes. As técnicas de Washington aperfeiçoadas na América Latina apoiando golpes de Estado contra governos eleitos democraticamente que queriam ter controlo sobre as suas economias, financiando a oposição a estes governos e eliminando os líderes políticos que lutavam por genuína independência dos seus países. O que vimos evidenciado na Guatemala em 1954, Brasil em 1964, Chile em 1973, foi usado em todo o mundo.

“A promoção da democracia” foi sempre o código para os EUA darem suporte à subversão de governos que não se vergavam o suficiente, como diz Max Blumenthal (@MaxBlumenthal) August 1,2017.

A lista de governos derrubados direta ou indiretamente pelos EUA e seus aliados mais chegados, para alcançarem o controlo económico é demasiado longa para incluir num simples texto, mas aqui vão alguns exemplos.

1 – Indonésia 1965/66 

A sangrenta onda de assassínios em massa apoiada pelos EUA e perpetrada pelas forças militares que derrubaram Sukarno, o primeiro Presidente “pós-colonial”, e às suas ideias de independência, sendo substituído pelo ditador pró-ocidental General Suharto .

“A embaixada dos EUA em Jakarta forneceu a Suharto uma “zap-list” com os nomes dos membros dos Partido Comunista da Indonésia e riscou os nomes quando foram mortos ou capturados, escreve John Pilger que analisou o golpe em 2001 no filme “Os novos dominadores do mundo” ( The New Rulers of the World ).

O negócio foi que a Indonésia sob Suharto ofereceria o que Richard Nxon chamou “a maior provisão de recursos naturais, o maior prémio do sudoeste asiático.”

Em novembro de 1967 este maior prémio foi entregue numa memorável conferência de três dias patrocinada pela Time-Life Corporation em Genebra. Chefiada por David Rockefeller, todos os gigantes transnacionais estavam representados: as maiores companhias petrolíferas, General Motors, Imperial Chemical Industries, British American Tobacco, Siemens, US Steel e muitas outras. Na mesa sentavam-se os economistas de Suharto, treinados nos EUA que concordaram com a conquista do seu país, sector a sector, como escreveu Pilger .

O custo em vidas humanas da neocolonial “mudança de regime” foi enorme: entre 500 mil e 3 milhões de pessoas mortas . Em 2016 um painel de juízes internacionais manteve que os EUA (bem como o RU e a Austrália) tinham sido cúmplices do genocídio .

2 – Irã, 1953 

O derrube do nacionalista democraticamente eleito Mohammad Mossadegh e a sua substituição pelo aquiescente Xá foi outra operação conjunta dos EUA/RU. O “crime” de Mossadegh foi querer nacionalizar a indústria petrolífera do seu país e utilizar os rendimentos da mesma para lutar contra a pobreza e as doenças. Portanto os neocolonialistas decidiram que tinha de se ir embora.

Uma campanha de desestabilização – semelhante à que é promovida contra a Venezuela – foi posta em marcha. “Os objetivos da propaganda da CIA e do SIS consistiam em conduzir uma campanha crescentemente intensificada através da imprensa, panfletos e o clero de Teerão, concebida para enfraquecer o governo de Mossadeq de todas as formas possíveis” admitiu Donald N. Wilber, um dos principais elementos do chamado plano TPAJAX.

Em 3013, documentos desclassificados revelaram que: “O golpe militar para derrubar Mossadegh e a seu governo de Frente Nacional foi levado a cabo sob a direção da CIA, como um ato de política externa dos EUA, concebido e aprovado aos mais altos níveis do governo”.

Vale a pena relembrar tudo quando ouvimos políticos dos países neocolonialistas fingirem-se ultrajados com a não provada “interferência Russa” nos seus processos políticos.

Qual é o principal interesse dos EUA na Venezuela? Se a história reservada do Departamento de Estado dos EUA é um guia: petróleo.

3. Iugoslavia, 1999/2000 

“Balcanização” é um dos mais importantes instrumentos do neocolonialismo e pode ser encontrado onde quer que este seja praticado”, escreveu Kwame Nkrumah.

O líder socialista da República Federativa da Jugoslávia, Slobodan Milosevic foi demonizado em 1990 pelas elites ocidentais não porque quisesse partir o seu país em pedaços, mas porque queria que se mantivesse unido.

Tendo sobrevivido a 78 dias da campanha da NATO de bombardeamentos “humanitários” contra o seu país, em 1999, Slobo viu a operação de “mudança de regime” para o derrubar intensificar-se. Milhões de dólares choveram ilegalmente no seu país dos EUA para grupos da oposição e ativistas antigovernamentais, tais como a organização Otpor! Milosevic foi destituído por uma “Revolução Bulldozer” em outubro de 2000 e a secretária de Estado Madeline Albright, que quatro anos antes tinha dito que a morte de meio milhão de crianças iraquianas devido às sanções tinha sido um preço que valera a pena pagar, comemorou o feito.

George Kenney, em tempos responsável do Departamento de Estado, revelou a razão pela qual tudo tinha acontecido. “No período pós-Guerra Fria não havia lugar para que um grande país independente focado no socialismo resistisse à globalização”

Em 2012 o New York Times relatou como importantes membros da Administração dos EUA que tinham participado no desmantelamento da Jugoslávia tinham voltado aos Balcâs como empresários para apresentarem propostas para a privatização de ativos.

Por que é tão difícil para alguns compreenderam em 2017 o que era óbvio em 1982? Solidarity. pic.twitter.com/EuU9aVAnho – Club des Cordeliers (@cordeliers) July 31, 2017

Agora os neocolonialistas neoconservadores agentes das mudanças de regime moveram-se para a República Bolivariana da Venezuela. Como Milosevic e muitos outros antes dele que se puseram no caminho dos “Novos Senhores do Mundo”, o democraticamente eleito Nicolas Maduro é etiquetado como “ditador”.

Tal como no caso de Milosevic, os autoproclamados “progressistas” são a vanguarda da campanha das elites para demonizar a Venezuela e a sua liderança, exigindo que figuras públicas do Ocidente que têm expressado apoio ao Chavismo emitam denúncias.

Todos estes críticos de “esquerda” da Venezuela descartam a interferência dos EUA e descrevem os resultados da guerra económica como “fracasso do governo”. — Crypto Cuttlefish (@cuttlefish_btc) August 5, 2017

Nas violentas críticas ao governo da Venezuela que os media despejam actualmente não há qualquer menção à campanha externa que prossegue sem abrandar com vistas à desestabilização do país e à sabotagem da economia. Nem aos milhões de dólares que os EUA tem despejado nos cofres da oposição e de ativistas antigovernamentais. Imagine-se se o governo Venezuelano estivesse a financiar os que efetuam protestos antigovernamentais nos EUA. Mas quando os neocolonialistas o fazem noutros países, está bem.

Kwame Nkrumah qualificou o neocolonialismo como a pior forma de imperialismo e tinha razão. “Para aqueles que o praticam, significa poder sem responsabilidade e para os que o sofrem significa responsabilidade sem poder.”

E o que aconteceu a Nkrumah? – ouço-vos perguntar. Apenas alguns meses após a publicação deste livro o pai da moderna Gana foi deposto por um golpe de Estado. O “Conselho Nacional de Libertação” que o eliminou rapidamente reestruturou a economia do Gana , sob a supervisão do FMI e do Banco Mundial, em benefício do capital do ocidente.

Durante anos o ocidente negou o envolvimento, mas mais tarde John Stockwell, um agente da CIA na África revelou : “a estação da CIA no Gana desempenhou um papel principal no derrube de Kwame Nkrumah em 1966”.

A Venezuela tem imenso petróleo, um governo socialista e é um forte apoiante da Síria. Nem posso imaginar por que razão os neocons estão tão interessados numa “mudança de regime”… Neil Clark (@NeilClark66) August 4, 2017

Atualmente os neocolonialistas querem que apoiemos a sua cruzada “progressista” por “democracia” e “direitos humanos” na Venezuela tão rica em petróleo. Se Kwame Nkrumah ainda estivesse entre nós, ele estaria a incitar-nos a ver o quadro na sua totalidade.

Fonte: IELA.

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