Por José Álvaro de Lima Cardoso.
As negociações coletivas em Santa Catarina seguem um funcionamento muito semelhante ao nacional, ainda que com especificidades. Como em todo o país, os patrões aproveitam a crise e o ataque aos direitos sociais e trabalhistas, para rebaixar também os acordos e convenções coletivas. Uma parte dos quais, senão a maioria, obtidos após décadas de suor e lágrimas. Em Santa Catarina, no primeiro semestre deste ano, cerca de 12% das negociações coletivas não lograram ao menos repor a inflação. Por outro lado, o ganho real médio foi de 0,23%, praticamente um arredondamento de valores, que não representa nada em termos monetários, dados os baixos valores dos salários. Vale observar que estes resultados pífios estão sendo obtidos numa conjuntura onde a inflação oscila num intervalo entre 3% e 4%, típico do período de estagnação econômica no qual vive o Brasil.
As negociações coletivas, tanto no Brasil, quanto no estado, revelam que não há razões para nutrirmos otimismos nos diagnósticos. A negociação coletiva tem como pano de fundo fundamental, o cenário econômico. E o crescimento não deve retomar, o desemprego continuará nas alturas e, dessa forma, vai continuar difícil mobilizar a classe trabalhadora. Portanto, a tendência é de as negociações continuarem bastante áridas. Além disso, são grandes as possibilidades de advir, talvez no curto prazo, uma grande crise financeira internacional, mais grave que a de 2008, que levaria à dramáticas consequências no mundo todo. E o Brasil irá ser pego pela crise no contrapé, com o mais entreguista e o pior governo da história do país.
Em Santa Catarina, há uma década o último trimestre do ano é marcado pela campanha salarial que pode ser considerada a mais importante do estado, que é a de reajuste dos valores dos pisos salariais estaduais. Há vários anos esta negociação serve de referência para as negociações coletivas no estado, em função de sua abrangência e representatividade. A importância dessa negociação aumentou recentemente, em função do quadro de destruição de direitos no país, promovido pelo golpe de estado. Numa situação de destruição de direitos e de dificuldades crescentes na negociação coletiva, para os trabalhadores, a regulamentação do piso se tornou ainda mais estratégica.
Recordemos que, dos cinco estados da federação que têm pisos estaduais, Santa Catarina é o único onde há uma efetiva negociação envolvendo trabalhadores, patrões e, num momento posterior, o Executivo Estadual e a Assembleia Legislativa. Esta é uma experiência singular no país, em nenhum outro estado da federação isso ocorre. E a explicação para o fenômeno é, basicamente, muito simples: em Santa Catarina a conquista dos pisos estaduais decorreu de uma luta travada de baixo para cima, ou seja, a partir da organização sindical.
Neste ano iremos para a décima campanha dos pisos salariais, que foram implantados em 2010, decorrência de uma luta arrojada das entidades sindicais catarinenses, assessoradas pelo DIEESE, e com participação decisiva das centrais, em todos os momentos da campanha. Apesar dos pisos terem sido implantados apenas em janeiro de 2010, as ações haviam iniciado bem antes, em 2006, quando as centrais sindicais decidiram que a luta pelos pisos estaduais seria o eixo principal da luta salarial nos anos seguintes.
Apesar da importância da luta pelos pisos, não devemos dourar a pílula. A negociação dos pisos estaduais, no fundo, é uma negociação pelo direito do trabalhador e sua família, continuarem comendo no ano seguinte. Nada além disso. É importante considerar que as empresas vêm ajustando seus custos com mão de obra via redução do quadro de pessoal (quando necessário) e também através do rebaixamento salarial por meio da enorme rotatividade. Quando o desemprego é alto, como no momento, aumenta a diferença entre a média dos salários de demissão e de contratação.
Apesar das muitas e duras incertezas, uma firme convicção está presente tanto na negociação dos pisos catarinenses, quanto nas negociações em geral: os direitos não serão mantidos ou haverá qualquer melhoria nos salários, sem luta renhida dos trabalhadores. Esta é a única certeza que podemos ter. Se em momentos de crescimento já é difícil a melhoria de vida dos trabalhadores, o que dirá em tempos de “cólera”. As campanhas salariais, neste grave momento do Brasil, precisam ser uma combinação de dignidade, coragem e inteligência. As adversidades têm que ser enfrentadas com inteligência e bons argumentos, mas devem ser acompanhadas de coragem e dignidade.
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José Álvaro Cardoso é economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.
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