Um dos elementos importantes na complexa conjuntura atual é o desconhecimento generalizado de história, típico da maioria de nós brasileiros. Um desconhecimento, entenda-se bem, que decorre em boa parte, de uma estratégia das classes dominantes para manter seu controle sobre os trabalhadores. A ignorância da história, por parte da maioria, facilita muito a dominação e manipulação política. A direita utiliza o desconhecimento histórico para disseminar mentiras e teses completamente absurdas. Por exemplo, tem surgido um debate nas redes sociais se o nazismo seria uma ideologia de esquerda ou de direita. Um dos argumentos para os que defendem que o nazismo é de esquerda, é que o partido de Hitler chamava-se Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães. A palavra “Socialista” no nome do partido, para alguns, seria a comprovação de que o partido seria socialista. Parece brincadeira, mas num contexto de amplo domínio da ignorância, muita gente acredita nessas coisas.
Por isso vale conhecer um pouco A “Batalha da Praça da Sé”, ou a “A Revoada dos Galinhas Verdes”, um dos desses momentos extremamente importantes, para a luta dos trabalhadores brasileiros. E que é olimpicamente ignorado pela maioria dos brasileiros. A dita batalha aconteceu no dia 7 de outubro de 1934. Os integralistas, que eram seguidores do fascismo italiano e do nazismo, convocaram uma manifestação com o objetivo de demonstração de forças para a Praça da Sé, no centro de São Paulo. Para a manifestação vieram integralistas também do Rio de Janeiro, e se calcula que os fascistas tenham reunido cerca de 8 mil pessoas no evento. Os registros mencionam que havia no dia, mais de 400 homens da organização fortemente armados no local combinado.
A partir de certa altura, os membros da organização começaram a marchar e entoar seus hinos fascistas, tentando impressionar e intimidar. No entanto, alguns gritos de “fora galinhas verdes” mostravam que nem todo mundo estava disposto a assistir pacificamente as manifestações nazifascistas. Setores da esquerda brasileira (Frente Única Antifascista, Partido Comunista Brasileiro) haviam se organizado para enfrentar e acabar com manifestação integralista na base da força. O entrevero começou com alguns pequenos enfrentamentos. Mas o número de militantes de ambos os lados, num ambiente de grande polarização política no qual o país, e o mundo viviam, indicava um enfrentamento de significativa monta.
A temperatura ia aumentando quando, de uma hora para outra, se ouviu uma rajada de metralhadora que atingiu Mario Pedrosa, jornalista e importante dirigente político. Mario foi retirado da linha de fogo por Fúlvio Abramo, outro jornalista e militante de grande destaque. Na confusão, é atingido mortalmente o jovem comunista Décio de Oliveira, enquanto fazia um discurso. A partir deste momento, inúmeros grupos de militantes de esquerda, que estavam espalhados na área entram na luta contra os integralistas. O embate foi duro, com o uso de armas de fogo dos dois lados. Segundo os dados, morreram no confronto, além de Décio de Oliveira, pelo menos seis guardas civis. Ante a determinação e a coragem dos trabalhadores, os integralistas fugiram que nem galinhas em revoada, daí o nome jocoso da batalha, “A Revoada dos Galinhas Verdes”.
Conta-se que apavorados, os integralistas, na fuga, iam tirando e jogando fora, de qualquer jeito, as camisas verdes, para não serem identificados pelos antifascistas. Segundo relato de gente que acompanhou o acontecimento, ao final do dia, tinham várias camisas verde espalhadas pela Praça da Sé. Não há um número preciso de quantos integralistas foram mortos ou feridos. Mas, segundo os historiadores, a Ação Integralista Brasileira (AIB), que havia sido fundada em 7 de outubro de 1932, pouco depois do conflito entre as tropas de Vargas e os paulistas, não conseguiu mais se erguer depois da “Revoada”. O humorista Barão de Itararé, diante do acontecido, ironizou: “Um integralista não corre, voa”. O episódio foi muito importante para enfraquecer o movimento integralista e, após a decretação do Estado Novo por Getúlio Vargas, a ABI foi fechada.
A experiência histórica internacional mostra que os movimentos fascistas, que costumam atacar pessoas mais frágeis que discordam de suas ideias ou são identificados como “inimigos” (pobres, negros, homossexuais), devem ser enfrentados com determinação, organização e coragem. Não adianta apelos morais para quem está dominado pelo fanatismo. É bobagem imaginar que a extrema direita será detida com apelos morais, chamados à razão ou com iniciativas legais. Como são, no início, em geral uma minoria pequena, costumam ser muito barulhentos e agressivos. Se não houver reação à altura, vão tomando conta. Os difíceis dias atuais são a comprovação desse fato.
Tudo indica que a extrema direita não irá ganhar as eleições porque, dentre outras razões, o seu candidato foi promovido a “espantalho” do processo e deverá chegar bastante desidratado no 2º turno (evidentemente esta é uma tendência. O cenário nebuloso dificulta qualquer análise mais categórica). Mas passada as eleições, a tendência é a extrema direita continuar aumentando sua agressividade, com a intenção de desencorajar e reprimir a organização dos trabalhadores contra a destruição de direitos e entrega das riquezas do país ao estrangeiro. Especialmente considerando o elevado risco de golpe militar no Brasil. Que a história nos ajude a definir estratégias eficientes.
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[avatar user=”Jose Alvaro Cardoso” size=”thumbnail” align=”left” link=”file” target=”_blank” /]José Álvaro Cardoso é economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.