Por Priscilla Brito, Blogueiras Feministas.
A discussão sobre a necessidade de uma reforma do sistema político não é novidade no Congresso Nacional. Desde a Constituinte, tramitam por lá propostas diversas, que mudam desde pontos específicos até aspectos mais estruturais, que mudariam a forma como entendemos o nosso poder de incidir na política institucional. Nos últimos dias, ganhou força na Câmara o chamado distritão, que muda a lógica da eleição dos deputados e deputadas no âmbitos federal, estadual e municipal. Segundo alguns parlamentares, a proposta simplificaria a eleição, pois os deputados mais votados em cada estado seria os eleitos. Na prática, o distritão enfraquece os partidos e dificulta a eleição de mulheres, negros e outros grupos com pouca representatividade nesses espaços de poder.
Como é hoje
Hoje a eleição é proporcional, em que um candidato ou candidata depende não apenas dos votos que recebe, mas também dos votos do seu partido ou coligação – o quoficiente eleitoral. Esta última determina a distribuição das cadeiras no parlamento. Por isso, em alguns casos, mesmo que receba uma votação significativa, a pessoa pode não conseguir ser eleita. Por outro lado, quem não teve uma votação tão expressiva pode conseguir se eleger por causa do bom desempenho do partido como um todo ou por causa dos chamados “puxadores de voto”. Um caso famoso é o do deputado federal e humorista Tiririca, que ao receber 1,35 milhões de votos em São Paulo, levou para Câmara dois colegas do PR, dentre eles o capitão Augusto, que tentou fundar o Partido Militar Brasileiro (PMB), mas não conseguiu assinaturas suficiente.
Como é no distritão
No distritão, os estados ou prefeituras viram um distrito eleitoral e são eleitos os candidatos ou candidatas com mais votos e a votação do partido ou da coligação deixa de valer – diferente do chamado “distrital puro”, em que são criados pequenos distritos para a eleição e as pessoas elegem um candidato por distrito. No “distritão”, cada estado também tem um número pré-determinado de assentos na Câmara. São Paulo, por exemplo, seria um distrito com 70 cadeiras. Michel Temer já havia se posicionado a favor do sistema em 2015, quando ele foi rejeitado pelo Congresso. Para ele, os partidos se tornariam mais seletivos em relação à escolha dos candidatos, o que levaria à redução dos custos de campanha e do número de partidos.
Atualmente, o distritão existe em três países do mundo — Afeganistão, Kuait, Emirados Árabes Unidos e Vanuatu —, todos bem menores que o Brasil, o que dificulta comparações sobre seu funcionamento. No entanto, vale mencionar o caso do Japão, que chegou a adotar o modelo no pós-guerra, mas mudou no início dos anos 1990 para um modelo que inclui a proporcionalidade. O chamado caso “Recruit”, revelou que o problema da corrupção no país era estrutural e vinha das relações escusas entre empresários e poder público.
Qual o problema desse sistema?
Da forma como foi proposto, o distritão beneficia os parlamentares que já estão no poder, já conhecidos e com capacidade de receber recursos para a campanha, em detrimento de candidaturas ligadas a grupos sociais com baixa representação no parlamento atual, como mulheres, negras, lésbicas e transsexuais. Nossa sociedade tem inúmeras desigualdades e os espaços de poder refletem isso. Para aumentar sua representatividade, é preciso criar mecanismos que permitam que grupos que na verdade são a maioria da população, possam conseguir chegar ao poder e lutar por seus interesses.
Além disso, o modelo enfraquece os partidos, pois impulsiona a personalização das campanhas em detrimento do esforço coletivo. Estabelece, com isso, uma competição interna, já que os partidos podem dar preferência aos candidatos mais ricos ou com maior poder de arrecadação de recursos.
O sistema proporcional é considerado complexo e confuso para população por vários motivos. Dentre eles, o fato de termos uma grande quantidade de partidos sem o que torna difícil diferenciá-los entre si. No entanto, sendo os partidos importantes para o sistema democrático, é preciso tornar seus posicionamentos mais claros, para que a população possa acompanhá-los, e não institui um sistema que finge que eles não existem. A política não é feita individualmente no cotidiano dos espaços de poder, ela depende de articulações, coalizões e alianças, e as campanhas precisam de alguma maneira refletir isso.
Quais as chances dele ser aprovado?
Há uma disputa na Câmara se o distritão seria permanente ou uma transição para o sistema distrital misto – sistema em que o eleitorado vota duas vezes: em um representante de seu distrito e em um partido político, que apresentaria uma lista fechada. Metade das vagas seriam preenchidas pelos distritais, metade pelos candidatos e candidatas das listas. Para aprovar qualquer mudança, são necessários 308 votos entre os 513 deputados e 49 entre os 81 senadores.
Crédito da Imagem: Junho/2015. Deputadas pedem a aprovação da proposta que fixa cotas para eleição de mulheres no Legislativo. Foto de Pedro Ladeira/Folhapress.
[+] Dizemos: NÃO AO DISTRITÃO. Por Marielle Franco no #AgoraÉQueSãoElas
—
Fonte: Blogueiras Feministas.