Por Raul Fitipaldi, para Desacato.info
O domingo 8 de janeiro de 2023 poderá ser lembrado pelas futuras gerações como “o dia do ódio”. Ódio organizado, planejado e estimulado para que uma porção de brasileiros e brasileiras atentaram contra a democracia, contra os direitos, contra o patrimônio público e, em resumo, contra a paz e as instituições basilares da república.
Talvez não seja ainda o epílogo de uma história que começou lá atrás, bem atrás, quando se anistiou ditadores, assassinos, torturadores, delinquentes que destruíram o tecido social do país. Hoje assistimos uma versão contemporânea desses assanhamentos ditatoriais mas, o fim dessas ações é o mesmo: setores minoritários cívico-militares agredindo à democracia por causa dos valores que ela pode trazer consigo. O ato terrorista desse dia odioso tem como finalidade não declarada, destruir qualquer expressão de justiça e igualdade, por mais tímida que esta seja. Procuram impedir que o novo governo vitorioso nas urnas, possa aportar ao país um pedacinho de normalidade.
Não é e nunca foi a urna eletrônica o problema. Somos os pobres, os majoritários, os miseráveis, os excluídos, os trabalhadores e trabalhadoras, os negros, os indígenas, as mulheres, a população de diversas orientações sexuais, aqueles de fora das “quatro linhas” de um genocida que incorporou todos os arroubos fascistas e acrescentou novas modalidades com sua truculência e grosseria.
Esse covarde sintetiza na sua visão de mundo o ódio materializado ontem em Brasília. O ódio ao outro e a outra, o ódio à justiça, à liberdade, à paz. Sintetiza também o ódio a si próprio, esse desgosto de existir e de que existam os demais, um ódio à vida. Bolsonaro e sua trupe de vândalos e ladrões, além de delinquentes comuns, de terroristas, simbolizam o que há de mais espiritualmente miserável e destrutivo numa sociedade. E não haverá paz até que não sejam, ele e seus cúmplices principais, julgados e condenados pelo que fizeram, fazem e, se não forem detidos, ainda farão.
Bolsonaro é o chorume derradeiro (assim espero) do que foi arquitetado pelas oligarquias violentas do Brasil: a impunidade a qualquer custo, a colonização eterna, a exploração sem fim. Oligarquias que conseguiram que seus gendarmes nunca foram nem julgados nem condenados. Elites que contaram e ainda contam com um bom naco da mídia do seu lado, embora, por vergonha talvez, ou por conveniência, não abone os atos de ontem como abonou, sem falta, os golpes, as perseguições, as torturas, as desaparições e todo o dano que se alçou como crime nunca reparado contra o povo brasileiro. Também ostentam um pedaço, hoje um pouco envergonhado, do que circula nos corredores dos poderes judiciais, anomalia que busca se recolocar para dar seus pequenos golpes em benefício próprio e de seus clientes. Tanto na mídia como na poder judiciário sempre houve exceções, talvez hoje até sejam a maioria, a ver. Mas, em todo caso, o que vivemos ontem no Brasil tem ingredientes aportados por todos esses setores, oligarquia, poder judiciário e mídia.
Enquanto isso a caserna se digladia permanentemente no fragor de uma decisão sempre difícil. A quem servir? Capaz de agredir uma menina estudante que faz um grafite contra as injustiças, mas, incapaz de deter em tempo e forma delinquentes que, até em alguns casos, aprecia com recato e cumplicidade. Fato normal num ambiente que nunca, jamais, foi colocado no seu lugar pela democracia. Anistiado ad aeternum que se relaciona com a sociedade à qual deve servir como se fosse um poder moderador e superior a ela.
Ontem percebemos de forma crua e potente, como é necessário reconhecer os inimigos da soberania popular, julgar e condenar eles, para que não existam outros dias que, no futuro, venham a ser lembrados como dias do ódio. Ontem foi o maior, que nunca mais se repita. E que o chefe principal da gangue, primeiro do que ninguém, pague por seus atos.