Por Douglas F. Kovaleski para Desacato. info.
Em boa parte do Brasil, em especial na região Sul, vivemos o aumento expressivo no número de casos novos de COVID-19, no número de casos ativos, na letalidade e na taxa de ocupação dos leitos de UTI. Florianópolis, segundo dados divulgados pela Prefeitura Municipal da capital catarinense, em 29/06/2020, estamos próximos do colapso da oferta de leitos, com 85,96% de taxa de ocupação.
Com marcada falta de transparência dos dados sobre a COVID-19 em Florianópolis, e pouca clareza na divulgação dos critérios que fundamentam as mudanças na classificação de risco, a cidade apresenta, neste momento, a classificação “alto risco”.
Apesar dos cuidados com relação ao isolamento social e restrição de uma série de atividades no início da pandemia tanto em Florianópolis, como no restante do estado, a epidemia se alastra. E esse avanço teve início com o relaxamento das medidas de isolamento social a partir da liberação pelo Governo do Estado do funcionamento de atividades em 01 de abril de 2020, após um período de significativo controle da epidemia. Diversas prefeituras também flexibilizaram atividades em plena fase de aumento do número de casos e óbitos em Santa Catarina.
Vários sanitaristas ficamos sem entender o que se passava, ou quais valores ou interesses estavam por trás destas decisões. Prevíamos dias difíceis e um comportamento da “curva” atípico no Brasil devido ao contexto político, social e econômico. As medidas de flexibilização do isolamento social são antagônicas com a proteção da saúde da população e pressionam de forma negativa o sistema de saúde, já fragilizado por conta da pandemia.
Mesmo que as prefeituras municipais tenham autonomia para decretar medidas de flexibilização do distanciamento social, o Governo do Estado cedeu à pressão da ignota burguesia catarinense e deu uma espécie de “sinal verde” para que prefeituras e a população catarinense baixassem a guarda com relação às medidas de prevenção ao contágio pelo novo Coronavírus.
A população tem pouca confiança nas instituições, na academia e nos governantes, além disso recebe orientações conflituosas das várias fontes, mídia, WhatsApp, facebook, pastor, família, etc. Como consequência, é baixo o empenho da população na adoção dessas medidas, por todo o estado.
Trabalhando sobre evidências científicas disponíveis até o momento podemos afirmar que: a) o avanço da pandemia só pode ser contido com medidas de distanciamento social; b) deve-se ampliar a testagem, acompanhamento, tratamento e isolamento de grupos de risco; c) os vários governantes, nas diferentes esferas precisam alinhar o discurso, diminuindo a confusão para a população, até por que um governante deve ter responsabilidade sanitária sobre sua população e conhecimento para ocupar o cargo público ao qual se propôs, não se pode brincar com vidas; d) os governos precisam divulgar a eficácia das medidas tomadas e dos riscos envolvidos em sua não adoção.
Essa tragédia foi anunciada inúmeras vezes pelos sanitaristas brasileiros, mas parece que vidas de brasileirxs não importam. O conhecimento científico não serve mais para direcionar as ações dos governantes de Santa Catarina, de cada município e do Brasil, por isso o povo catarinense vai perder muitas vidas. As decisões dos governantes brasileiros, de maneira generalizadora, seguem submissamente o modo de pensar da classe dominante, que é apressado, ansioso, desprovido de limites éticos, voltado para o lucro imediato e antidemocrático.
A crise do capitavírus desnuda como se dá a tomada de decisão da grande maioria dos governantes no Brasil atual: alguns grupos de empresários decidem, enquanto as instâncias “democráticas” obedecem aos interesses da burguesia, mesmo que em detrimento de vidas humanas.
A questão colocada não é saúde ou economia, mas é vida ou morte. Não podemos pensar em economia se nossas vidas ou de nossos compatriotas, filhos, pais, vizinhos, estão em risco. Em primeiro lugar a vida, depois veremos o que dá para fazer. Mas só se estivermos vivos.
A necessidade de distanciamento social é urgente. Os governos e cada cidadão são responsáveis pela vida de cada pessoa nesse momento. Fique em casa, use máscara, lave as mãos, proteja-se e proteja a comunidade.
Douglas Francisco Kovaleski é professor da Universidade Federal de Santa Catarina na área de Saúde Coletiva e militante dos movimentos sociais.
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